À parte o esquerdismo epistemológico que ainda resiste nos bolsões acadêmicos da investigação tupiniquim, a História do Brasil padece de um estudo rigoroso da trajetória de Getúlio Vargas, na celebração dos 60 anos de seu suicídio. Portanto, Getúlio ainda vagueia – neste contexto de expectativa eleitoral vivido por um país que abomina a politica velha mas não sacode ao lixo os expedientes de sua manutenção – a bordo “Discurso do Rio Amazonas”, pronunciado em plena II Guerra Mundial, ao perceber o olhar estrangeiro em relação à Amazônia. O Acordo de Washington, celebrado, ainda em 1942, confirmou sua intuição. “O Amazonas, sob o impulso fecundo da nossa vontade e do nosso trabalho, deixará de ser, afinal, um simples capítulo da história da terra, e equiparado aos outros grandes rios, tornar-se-á um capítulo da história da civilização”. Por que este discurso não entoou pelos átrios da República desde então? São tímidas as ações públicas para a Amazônia diante da grandiosidade de suas riquezas e potencialidades. Getúlio ergueu-se, na sequencia, contra a constituição do Instituto Internacional da Hileia Amazônica, ao perceber a jogada de ocupação do bioma que ele representava. E criou o Inpa, o Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia, uma semeadura de consciência nacional em direção à floresta, sua instigante demanda de integração e aproveitamento racional. Getúlio queria integrar o Brasil a sua maior parte, a Amazônia. Que governante deu sequencia efetiva a este projeto?
O Acordo de Washington tinha por meta retomar a produção de borracha da Amazônia para abastecer os esforços de guerra. O Departamento de Estado e das Universidades norte-americanos, porém, queriam concessões efetivas para meter escancaradamente o bedelho por aqui, investigar o banco genético da floresta, sua biodiversidade e promover respectivos bionegócios. Uma pretensão que se renova com as recomendações do governo daquele para priorizar a biotecnologia e a produção de alimentos para a humanidade. Getúlio havia percebido que a Amazônia apareceria para o mundo como a esfinge da modernidade, um objeto de desejo na demanda da humanidade pela reconstrução dos estragos da guerra, alocação dos refugiados, entre outras suposições na estratégia de ocupação.
Hoje, a demanda por alimentos e água hoje tem projeção entre 35% e 40% até 2030. Isto reflete, sobretudo, os padrões de consumo e dietas de uma classe média em expansão, de acordo com o relatório Tendências Globais 2030, do Conselho Nacional de Segurança dos Estados Unidos. Só o Brasil não formula politicas para analisar e gerir a questão. Estima-se que na Amazônia exista 1/5 da água doce de superfície e dois dos maiores aquíferos subterrâneos estão na região: Alter-do-Chão e Içá-Solimões.
O mundo civilizado, por deslumbramento ou cobiça, olha para a Amazônia há mais de 500 anos. Uma mercadoria que fascina muito além de que seu valor de uso ou de troca sugere. É compreensível que seja assim a partir dos primeiros contatos, e da constatação que aqui existe e resiste um quinto dos princípios ativos da flora e da fauna planetária. Mais do que contribuir com a retirada de 20% do carbono da atmosfera, a Amazônia simboliza um santuário de onde emana um novo paradigma de sustentabilidade e interação entre a condição humana e os parâmetros ambientais. As utopias do planeta, diria Getúlio Vargas na linguagem de hoje, ensaiam por aqui alguns de seus capítulos na produção bioeditorial de um novo paradigma de alimentos, fármacos, cosméticos e energia limpa para o futuro para a Humanidade. Por isso, seu alerta e conduta, num país sem liderança nem rumo e num estado sem governança, permaneceão vivo entre nós.
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alfredo.lopes@uol.com.br
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