G20 lança aliança global contra a fome e pobreza durante cúpula no Brasil
A presidência brasileira no G20 foi marcada por um anúncio de grande peso político e social: a criação da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza. A iniciativa foi apresentada na última segunda-feira (18/11) pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, durante a abertura da cúpula de líderes do grupo, realizada no Rio de Janeiro. A proposta, que visa combater a insegurança alimentar e reduzir as desigualdades, é uma das principais bandeiras da gestão brasileira à frente do G20.
O projeto, contudo, já nasce em meio a desafios significativos, como a necessidade de maior financiamento e a inclusão efetiva de pequenos agricultores no processo decisório.
Uma aliança de escopo global
Com 148 membros fundadores, a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza reúne 82 países, a União Africana, a União Europeia, 24 organizações internacionais, nove instituições financeiras internacionais e 31 organizações filantrópicas e não governamentais. Esse grupo expressivo marca um avanço em relação à adesão inicial, que contava com apenas 41 nações até poucos dias antes do anúncio.
O objetivo central da aliança é fomentar políticas públicas e ações conjuntas para mitigar os efeitos da pobreza e da insegurança alimentar, especialmente em regiões mais vulneráveis. O consenso em torno do tema foi um raro ponto de união entre os países do bloco, que têm enfrentado dificuldades para avançar em discussões polêmicas, como taxação dos superricos e financiamento climático.
Compromissos financeiros
Entre os apoios anunciados, destaca-se o compromisso do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). A instituição informou que disponibilizará US$ 25 bilhões em empréstimos a juros reduzidos para financiar programas da aliança. Além disso, o BID fará uma doação de US$ 200 milhões a países pobres para assistência técnica na implementação de programas voltados à redução da fome e da pobreza. Modelos de sucesso, como o Bolsa Família, serão usados como referência em outras nações.
Apesar da relevância desse aporte, especialistas apontam que os valores ainda são insuficientes para atender à magnitude dos desafios. “Embora o apoio do BID seja significativo, ele não cobre nem de perto o montante necessário para enfrentar a fome e a pobreza de maneira sustentável em escala global”, avaliam analistas do setor.
Críticas sobre inclusão e representatividade
A Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura (CONTAG), uma das principais entidades representativas dos agricultores familiares no Brasil, fez críticas contundentes à estrutura da aliança. Embora reconheça o potencial da iniciativa para destacar o papel crucial dos pequenos agricultores na segurança alimentar e no combate às mudanças climáticas, a CONTAG aponta a baixa representatividade do setor e a ausência de novos anúncios expressivos de financiamento como falhas graves.
“Apenas um dos 148 membros representa diretamente os agricultores familiares. Isso é preocupante, considerando que esses pequenos produtores desempenham um papel fundamental no enfrentamento da insegurança alimentar”, afirmou Alberto Broch, vice-presidente da CONTAG.
Broch destacou ainda que, em 2021, os pequenos agricultores receberam apenas 2% do financiamento público internacional para o clima, o equivalente a US$ 2 bilhões. Esse valor contrasta fortemente com os US$ 368 bilhões que esses agricultores investiram em adaptação com seus próprios recursos, frequentemente limitados.
Desafios para a Sustentabilidade
Além da falta de representatividade, a CONTAG e outras organizações ligadas ao setor apontam a necessidade de a aliança garantir recursos mais robustos e promover práticas agrícolas sustentáveis, como a agroecologia. Tais práticas são vistas como fundamentais para garantir a segurança alimentar em um contexto de mudanças climáticas e escassez de recursos naturais.
“O sucesso da aliança dependerá de sua capacidade de dialogar com as organizações de agricultores e de fornecer condições para que os pequenos produtores adotem práticas agrícolas diversas e amigas do meio ambiente. Isso é essencial não apenas para alimentar o mundo, mas também para combater os efeitos das mudanças climáticas”, acrescentou Broch.
A criação da aliança ocorre em um momento estratégico, com a COP30 se aproximando e os impactos das mudanças climáticas se intensificando. Especialistas apontam que, para ter um impacto significativo, a aliança precisará não apenas mobilizar mais recursos financeiros, mas também garantir que esses sejam direcionados para iniciativas inclusivas e sustentáveis.
A iniciativa tem o potencial de transformar a luta contra a fome em uma prioridade global, mas depende de um compromisso político mais forte e da inclusão de vozes de setores diretamente envolvidos na segurança alimentar, como os agricultores familiares. Sem isso, a aliança corre o risco de se tornar um esforço simbólico, com pouco impacto real sobre as populações mais vulneráveis.
Embora a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza represente um marco político no âmbito do G20, ela surge cercada por desafios. A necessidade de ampliar o financiamento, promover práticas agrícolas sustentáveis e incluir de forma significativa os pequenos agricultores no processo decisório são demandas urgentes. O sucesso da iniciativa dependerá de sua capacidade de superar essas barreiras e de criar uma abordagem verdadeiramente inclusiva e eficaz na luta contra a fome e a pobreza global.
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