“Hoje, minha palavra é de gratidão — a Deus, aos meus pais, à minha família, aos servidores que caminharam comigo e ao povo do Amazonas, que me ensinou o verdadeiro sentido de servir”
Hoje, ao completar cinquenta anos de caminhada no serviço público, sinto o dever e o privilégio de agradecer.
Agradecer, antes de tudo, a Deus, pela força que nunca me faltou — nas horas de solidão, de dúvida ou de resistência. Foi Ele quem me ensinou a caminhar em silêncio quando o ruído era alto, e a continuar sorrindo mesmo quando o caminho era áspero.
Nasci cercada por livros e carimbos, filha de pais tabeliães. Com eles aprendi o valor da palavra empenhada e da responsabilidade. Mas também aprendi que nenhuma herança é maior que o esforço pessoal. Quando ouvi que não havia vaga para mim no Tribunal — afinal, diziam, eu não precisava —, foi a fé e o senso de propósito que me mostraram o caminho.
Escolhi começar de onde poucos queriam: como taquígrafa. E foi nesse ofício silencioso, que registra o som da palavra e o ritmo da verdade, que encontrei o sentido do controle público e da escuta. Estenografar era compreender com os ouvidos o que os olhos ainda não viam.
Vieram os estudos — Contabilidade, Direito, especializações na Fundação Getúlio Vargas — e, com eles, a certeza de que a competência é o verdadeiro passaporte da dignidade. Nunca busquei títulos; busquei estar preparada.
Com apenas vinte e três anos, já formada, fui nomeada secretária da administração do Tribunal. Modernizei equipamentos, criei identidade visual, substituí datilógrafos por computadores e ajudei a abrir caminho para as gestantes no serviço público. Tudo isso com as próprias mãos, em silêncio, porque o que importa não é o aplauso, mas o resultado.
Nunca pedi privilégios. Sempre bati ponto. Trabalhei com a mesma disciplina de quem está começando, mesmo depois de décadas. Fui chamada de exigente — e sou. Porque acredito que o servidor público deve ser exemplo de dedicação e amor ao dever.
Houve dias difíceis. Enfrentei o assédio, a incompreensão e até a falta de um banheiro feminino no andar dos conselheiros. Mas aprendi que resistir com serenidade é também uma forma de vencer. Perdoei quem me feriu e segui em frente.
Com o tempo, percebi que o verdadeiro poder nasce da escuta. Escutar é compreender a dor do outro. Foi dessa escuta que nasceu a Ouvidoria da Mulher, um espaço de acolhimento e voz dentro da instituição.
Olho para trás e vejo transformações profundas: a modernização dos cadastros, a digitalização de processos, o reconhecimento do mérito, a valorização dos servidores. Mas o maior legado, creio, foi ter semeado a convicção de que o controle público é um serviço à sociedade e um compromisso com a justiça social.
Trago no coração a imagem do Amazonas de contrastes — uma capital próspera e um interior ainda esquecido. É dessas contradições que brota o meu propósito: usar o controle e a gestão como instrumentos de equidade, inclusão e esperança.
E levo comigo a lembrança de pessoas que iluminaram o caminho, como Lyzandro Garcia Gomes, símbolo de integridade e serenidade. Em sua homenagem, dei seu nome à sala de tecnologia do Tribunal, o coração digital da nossa casa. Que sua memória continue a inspirar gerações de servidores comprometidos com a ética e a verdade.
Hoje, minha palavra é de gratidão — a Deus, aos meus pais, à minha família, aos servidores que caminharam comigo e ao povo do Amazonas, que me ensinou o verdadeiro sentido de servir.
O poder só faz sentido quando serve. E servir, para mim, sempre foi — e continuará sendo — um ato de fé.