Quando se retoma os prejuízos generalizados provocados pela legislação do PPB, é digno é justo utilizar este espaço para reconhecer e destacar na linha de frente desta trincheira o papel do jurista Raymundo Noronha, de longe, a maior autoridade em legislação do modelo Zona Franca de Manaus. Ele é o mais competente defensor da tribo quando se tratam das ilegalidades e distorções constitucionais deste modelo de acertos. Noronha costuma chamar o PPB de excrescência constitucional, pois se trata de uma legislação federal que acumula prejuízos incontáveis à Zona Franca de Manaus. Nesta semana, depois de 2 anos e meio de espera, a Essilor da Amazônia, empresa francesa instalada em Manaus, foi informada da Consulta Pública de seu PPB, o Processo Produtivo Básico para PRODUTOS ÓPTICOS-OFTÁLMICOS, a partir do qual poderá iniciar as linhas de produção autorizadas. Por isso Raymundo Nonato Botelho Noronha se tornou especialista em legislação e história das idas e vindas, distorções e imposições feitas à ZFM. Advogado, ele é um amazonense nascido em Porto Velho quando aquele território ainda pertencia ao Amazonas, que vem defendendo a Zona Franca de Manaus desde os anos 70. “Eles (os burocratas) nunca quiseram a evolução do modelo”. E cita a Portaria n. 308, de 11 de agosto de 1976 – quando o ciclo da ZFM comercial foi ampliado com o desembarque das primeiras indústrias em Manaus – o legislador federal descreveu no “manual de instruções”, que na ZFM, somente ocorreria a montagem simples de produtos industrializados, contando com insumos estrangeiros e com insumos nacionais. Derrubar esse embargo de gaveta do PPB, portanto, assegura Noronha, é resgatar a autonomia da Suframa e decretar sua insurreição institucional.
Tecnologia da insubordinação
Em seus brados históricos, espalhados pela mídia no registro dos repórteres mais atentos, Noronha costuma ser bombástico: “Foi o Amazonas quem primeiro produziu o telefone móvel (celular) no Brasil, assim como o primeiro microcomputador em linha industrial. Ao equiparar as nossas vantagens com o resto do País, tiraram a competitividade dos produtos de informática que viessem a ser fabricados na Zona Franca”. Por outro lado, grandes causas judiciais que contrariavam o modelo, com sua instrução, fundamentação e apoio, foram vencidas. É o caso da Adin 2348/2000 em que o STF não deixou que o Governo modificasse as alíquotas do PIS/Pasep e Cofins. Como represália, o então presidente Fernando Henrique Cardoso, baixou o IPI de produtos fabricados fora da ZFM para 2%. A questão era liberar insumos estrangeiros e cobrar índices de nacionalização de componentes. Pronto! Não se cogitava qualquer atividade de pesquisa e desenvolvimento ou inovação, incorporação de tecnologias compatíveis com o estado da arte e da técnica, no polo industrial local. Ilustra isso a instrução de que: “a mão-de-obra direta empregada no processo de produção engloba tão-somente a mão-de-obra até o nível supervisor”, segundo a tal Portaria. Pelo visto, o abandono e o boicote na evolução do modelo só fez crescer desde então. Eis aí a fonte e a orientação do desestímulo à instalação, pelas empresas, na Zona Franca de Manaus, de laboratórios e centros de pesquisa, bem assim como recrutamento em outras regiões do País de técnicos qualificados. Na prática, isso representava um veto – que ainda subsiste – ao desenvolvimento local de tecnologia de produtos e de processo de produção e até mesmo à absorção ou emulação de tecnologia adquirida de fontes externas.
Boicote velado ou explícito
Por que o PPB da Novamed, uma empresa que veio produzir medicamentos a partir da farmacopeia amazônica, promissora e natural, demorou 5 anos? Por que a indústria de cosméticos não decola a despeito das coleções e inventários da biodiversidade atestarem há mais de seis décadas que aqui reside a indústria da juventude? Bertha Becker dizia, num de seus últimos alertas contra a intocabilidade da floresta, que as indústrias da beleza nem precisavam pensar em exportar, pois o mercado interno viabilizaria qualquer produção. Por que a pilhagem em cima da presença da Fucapi, Fundação Centro de Pesquisa, Análise e Inovação Tecnológica, na sustentação do modelo e teimosia em lhe conferir densidade tecnológica e agregação de valor? Fundada em 1982, como instituição de direito privado, a partir das pressões e presença das entidades de classe da indústria, CIEAM e FIEAM, a Fucapi é reconhecida como o embrião do avanço tecnológico na Amazônia, na qualidade de principal instituição tecnológica da região, por sua atuação voltada para o apoio técnico às empresas instaladas em Manaus, com laboratórios de última geração e inventividade. E se às empresas foi imposta e estimulada a modelagem de montar partes e peças, a Fucapi, e todas as iniciativas que sua presença estimulou, sinaliza esforços efetivos dos atores locais empenhados em desenvolver – com parcos recursos disponíveis entre os volumes confiscados – as novas saídas da inovação. A Fucapi, vítima de um boicote perverso que contou com a omissão parlamentar regional, é a instituição que criou a primeira escola técnica em informática do país, e tem pioneirismo de cursos de especialização em nível de graduação e pós-graduação em Eletrônica Digital, Engenharia de Produção, Automação Industrial, Qualidade e Produtividade, Desenvolvimento de Recursos Humanos, Marketing, e Design Industrial e regional com serviços de busca e registro de marcas, patentes, desenho industrial e software, entre tantos avanços que Isa Assef e seu time de guerreiros e guerreiras apaixonadas conseguiram consolidar e que a opinião pública precisa conhecer, proteger e apoiar.
Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. [email protected]
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