“Na parceria CIEAM-CETAM, há quase duas décadas, definíamos em conjunto o perfil da demanda educacional e cada empresa contratava as vagas de que precisava. Os cursos ocorriam na própria empresa e os trabalhadores, em pouco tempo, galgavam os degraus da qualificação. Ficaram legados e lições de extrema relevância que podem ser resumidos no slogan Obama: Sim, nós podemos!”
Por Alfredo Lopes e Maurício Loureiro
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Coluna Follow-Up
O Brasil se encontra num dilema vital: a associação entre baixos níveis de educação de um país e seus índices de atraso civilizatório é inequívoca. E ela se agrava com a permanência dos índices deploráveis de analfabetismo do país. Sem saber ler nem escrever, o cidadão equivale a um surdo, cego e mudo disfuncional, com restrição de alternativas para assegurar a própria sobrevivência.
Por isso, com indicadores de analfabetismo quatro vezes maior do que em 2018, a situação do país é dramática. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil tinha 14.194.397 pessoas que não sabiam ler, escrever ou realizar as operações básicas de matemática, em 2021. Com a pandemia, a regressão se elevou em todos os níveis, do ensino fundamental e médio. E o analfabetismo piorou.
Estados como Mato Grosso, Goiás, Mato Grosso do Sul e o Distrito Federal, mais aquinhoados que o Nordeste economicamente, apresentam taxas significativas e equivalentes ao tradicional analfabetismo desta região, historicamente empobrecida. Iniciativas como o programa Educação para Jovens e Adultos (EJA) e o projeto Alfabetização Cidadã da Universidade Católica de Brasília têm buscado combater o problema no Centro-Oeste. No entanto, é preciso maior investimento em políticas sociais e na valorização/acatamento dos direitos humanos para enfrentar o desafio.
No setor privado, num ranking mundial de 66 países mais produtivos, o Brasil ocupa a 57ª posição. É o que aponta o levantamento da World Population Review. Com as premissas educacionais que temos não poderia ser diferente. E por que estamos lá atrás até entre os vizinhos de Continente? Por que nossa carteira de exportações é, majoritariamente de commodities e nossa planilha de custos para pagamento da propriedade intelectual é elevadíssima. E o que tem a ver o analfabetismo com tudo isso? Simplesmente, tudo.
A rigor, o analfabetismo estrutural é muito maior e mais danoso do que possa parecer ou transparecer nas estatísticas. Basta olhar o desempenho dos alunos do Enem no quesito redação. Segundo o INEP, 95 mil alunos receberam nota zero na prova de redação, em 2021, um desempenho que impede o acesso dos referidos ao crédito do FIES ou disputa de vaga do Prouni, programa de vagas gratuitas na rede particular de faculdades.
Eis algumas razões da nota zero. Desobediência ao formato de dissertação (ou seja, o candidato não soube ler o enunciado); Folha em branco ou com menos de 7 linhas; Desenhos e sinais gráficos impróprios; Partes desconexas ou com assinatura. Ora, se um jovem não consegue decifrar um enunciado de nível médio, como vai decifrar uma instrução técnica num universo fabril?
A alfabetização na infância é um processo decisivo, pois é nessa fase que o neurodesenvolvimento está em pleno dinamização. Estimular adequadamente este processo, considerando a integralidade e individualidade da criança, envolve habilidades como linguagem oral, funções executivas, habilidades fonológicas, visuoespaciais e preliminares de linguagem escrita. É tão essencial que, sem ele, ou sendo feito de qualquer jeito, é impossível promover o desenvolvimento intelectual e científico das pessoas.
No caso da economia de contrapartida fiscal que move 85% dos negócios do Estado do Amazonas e região, como evoluir na diversificação, adensamento e regionalização do desenvolvimento se carecemos da qualificação técnica nos perfis da indústria instalada em Manaus. Como evoluir a Tecnologia da Informação e da Comunicação, ou mesmo a Bioeconomia, se não planejamos em sintonia fina academia e economia para caminharem entrelaçadas?
É imperativa a preparação do acesso ao conhecimento científico e que os estudantes compreendam, adequadamente, o ambiente cultural amazônico e suas oportunidades de interação com a evolução da tecnologia. Se as premissas dessa aprendizagem são frágeis, que tipo de qualificação será alcançado? Não basta se aproximar da tecnologia, é fundamental que saibam discernir seus paradoxos. Não sendo assim, sua contribuição produtiva para o crescimento da sociedade e seu desenvolvimento pessoal serão pífios. Por onde vamos começar?
No âmbito das entidades da Indústria, podemos destacar a obstinação do CIEAM e suas apostas na qualificação dos recursos humanos nestas quase cinco décadas de militância pela expansão da ZFM. Pacto pela Educação, na carona e adaptação da experiência vitoriosa do Ceará. A própria implantação da ABRH-AM, se configurou como entidade no ambiente CIEAM. Assim também o Encontro com Notáveis, mais de duas décadas levando explanação e debates sobre questões vitais para o desenvolvimento pessoal e profissional dos trabalhadores do Polo Industrial de Manaus, entre outras ações e parcerias na perspectiva de incrementar o compromisso institucional.
Analfabetismo corrói e a educação transforma – Parte 2
Em nossos debates na entidade, falamos muito em tecnologia e seus avanços surpreendentes de modernidade e celeridade. Entretanto, são tímidos os frutos colhidos nesta vertente de tecnologia. Acompanhamos na web, nas viagens ao exterior, ou relatos do mundo evoluído e temos clareza do quão pouco esses avanços se aplicam no Brasil. A resposta ao desenvolvimento, de nações com IDH elevado ou baixo índice de analfabetismo, tem nome: Educação qualificada com tecnologias embarcadas. Isso mesmo. No Brasil, patinamos, ou seja, abrimos mão das oportunidades que a Ciência e a Tecnologia oferecem. Chega a ser vergonhoso o jeito que tratamos o tema/problema da educação. A não valorização dos professores, o descaso com sua formação e sua manutenção financeira.
O envolvimento na aposta educacional supõe atitudes, fascínio pela mudança, paixão pelos resultados. Tomamos por empréstimo um movimento ousado e promissor que se identifica como Todos pela Educação. E é imperioso que seja assim. É temerário ou ingênuo achar que o poder público, isoladamente, pode assumir e equacionar a complexidade dessa causa. Só assim poderemos recuperar o tempo perdido. Temos talento para isso. Basta observar a performance tecnológica das crianças que, de 3 anos em diante, já operam com surpreendente aptidão os equipamentos da era digital: celulares, Ipads, controles de jogos eletrônicos .
É pra ontem a tarefa da empatia com profissionais do ensino/aprendizagem. Eles devem e precisam se qualificar para encarar com naturalidade a revolução tecnológica. Temos que antecipar cenários em que os estudantes, rapidamente, estarão em suas salas de aulas, consumindo o saber de um ChatGPT ou de um Bing Chat, entre outros ensaios de Inteligência Artificial, construindo com prontidão novas paisagens da verdadeira escola do futuro que já se implantou.
O descaso em construir essas oportunidade de evolução aos educadores e educandos, em especial, os das escolas públicas, colocarão em risco, num futuro breve, o conhecimento formal e a capacidade de cérebros e mentes, preparados para os desafios que se aproximam assustadoramente. E que predem passar por cima dos que não se preparam adequadamente. Essa demora está agravando o atraso.
No Amazonas, em linha com o movimento de implantação da ZFM, tivemos e temos boas experiencias, de formação técnicas além, é claro, das escolas técnicas já estabelecidas, hoje transformadas em instituições de ensinos superior.
Temos também, a registrar, no portfólio do CIEAM um bom exemplo de modelo técnico, que devemos conhecer para expandir mais ainda sua atuação. Vamos chamar de Sistema CETAM, Centro de Educação Tecnológica do Amazonas, com quem a entidade firmou fecunda parceria através de um visionário que dirigiu seus primórdios: trata-se do engenheiro Vicente Nogueira, que depois se tornou Secretario de Educação, por seu talento e carisma educacional. Com visão futurista, ele entendeu que Manaus se transformou numa cidade industrial e que era precisa qualificar profissionais com a diversificação que este perfil exige.
Essa perspectiva precisa ser repensada na relação da economia com a academia, ou agências de qualificação em sintonia. Na parceria com o CIEAM, e mediante um levantamento de demandas presentes ou previstas, buscamos ofertar aos jovens o aprendizado técnicos especializado em tecnologias avançadas. Hoje, os jovens seguem batendo em nossas portas, pedindo passagem para acessar novas patamares de realização pessoal e profissional. Na parceria CIEAM-CETAM, definíamos em conjunto o perfil da demanda operacional e cada empresa contratava as vagas de que precisava. Os cursos ocorriam na própria empresa e os trabalhadores, em pouco tempo, galgavam os degraus da qualificação. Ficaram legados e lições de extrema relevância que podem ser resumidos no slogan Obama: Sim, nós podemos!
Maurício Loureiro é conselheiro do Centro da Indústria do Estado do Amazonas e membro da Comissão da ESG
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