Em um ano, mancha de poluição aumentou mais de 40% e água de boa qualidade foi reduzida de 124 para 60 quilômetros
O Tietê é o maior rio paulista, com cerca de 1,1 mil quilômetros de extensão, cortando o estado leste a oeste. Infelizmente, a poluição do rio, principalmente na região da capital, é outra característica que chama a atenção – e vem sendo monitorada desde os início dos anos 90, quando a mancha de poluição se estendia por cerca de 500 quilômetros, segundo dados da Fundação SOS Mata Atlântica.
No dia 22 de setembro, o Dia do Tietê, um novo relatório de monitoramento foi divulgado e os resultados ainda não trazem motivos para comemorar. De acordo com o estudo Observando o Tietê 2022, a mancha de poluição no trecho do rio Tietê monitorado por voluntários da Fundação SOS Mata Atlântica e equipe técnica da causa Água Limpa cresceu e se estende agora por 122 quilômetros – um aumento de mais de 40% em relação a 2021, quando atingiu 85 quilômetros.
A água de boa qualidade foi reduzida numa proporção ainda maior: de 124 quilômetros no ano passado para apenas 60 na atual medição. Os dados são do relatório, estudo que faz parte do projeto Observando os Rios – que tem como foco fortalecer a cidadania e a ciência cidadã – e que conta com o apoio da Ypê.
O rio Tietê é dividido em seis unidades de gerenciamento de recursos hídricos, também chamadas de bacias hidrográficas, que são monitoradas por 35 grupos voluntários da SOS Mata Atlântica, entre setembro de 2021 e agosto de 2022, ao longo de 576 quilômetros do rio principal, desde a nascente, em Salesópolis, até a jusante da eclusa do Reservatório de Barra Bonita.
Os dados foram obtidos com a média do Índice de Qualidade da Água (IQA) em 55 pontos de coleta distribuídos por 31 rios da bacia do Tietê. No geral, entre os 55 pontos monitorados em toda a bacia, a qualidade da água foi apontada como boa em sete (12,7%), regular em 34 (61,8%), ruim em 10 (18,2%) e péssima em quatro (7,3%). Não houve registro de água de ótima qualidade, fato que se repete desde 2010. O comparativo, dessa forma, mostra estabilidade entre os resultados deste ano e do anterior, com leve tendência de perda de qualidade.
Causas da poluição
Segundo Gustavo Veronesi, coordenador do programa Observando os Rios, da SOS Mata Atlântica, o grande motivo da perda de trechos com qualidade de água boa e da piora constatada, principalmente no interior do Estado, se deve à transferência de sedimentos contaminados acumulados no reservatório de Pirapora do Bom Jesus para o Médio Tietê.
Esses sedimentos com altas cargas de Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO) reúnem remanescentes de esgotos e também de fontes difusas de poluição, como lixo, defensivos agrícolas, fuligem de carros, entre outros.
“O uso mais intensivo da terra, com perda de matas ciliares, pode causar grandes impactos para a qualidade da água da bacia do Tietê. O maior revolvimento do solo para os plantios e o uso mais intenso de fertilizantes e agrotóxicos para as culturas agrícolas têm implicado em grande produção de sedimentos que atingem os rios e que carregam consigo nutrientes e poluentes, que formam algas e consomem o oxigênio dissolvido da água”, explica.
Outro fator é a expansão das cidades, que provocou o surgimento de novas grandes áreas urbanas na região do Tietê. Como contraponto, Gustavo reforça que na Região Metropolitana de São Paulo, mesmo que a qualidade da água ainda esteja abaixo do aceitável, houve nos últimos anos uma melhora em função das obras de saneamento promovidas pelo Governo do Estado.
“Os esforços para o incremento do saneamento na Grande São Paulo precisam ser expandidos para os demais municípios a fim de garantir a saúde da população e a qualidade da água ao longo de toda a bacia”, completa.
Investimento na despoluição do rio Tietê
No mesmo dia em que o relatório de monitoramento do Tietê foi divulgado, o Secretário de Infraestrutura e Meio Ambiente do Estado de São Paulo, Fernando Chucre, detalhou o programa estadual Renasce Tietê, com uma série de ações para recuperação do rio. O Renasce Tietê será iniciado em 2023 e ocorrerá concomitantemente ao trabalho de saneamento básico realizado pela SABESP.
Segundo o governo, o Renasce Tietê vai intensificar a revitalização do rio com um projeto que engloba a construção e reforma de dois núcleos de educação, cultura, lazer e esporte no município de Salesópolis, o rio Tietê nasce. No local, está uma área com mais de um milhão de metros quadrados de Mata Atlântica e cerca de 70 espécies de fauna paulista e está previsto o reflorestamento de 36 hectares de vegetação e matas ciliares degradas.
Outras ações previstas para o local são a capacitação em atividades produtivas com foco na mulher, além da ampliação do uso de novas tecnologias de controle para o monitoramento qualitativo e quantitativo das águas do rio e o desassoreamento dos pontos críticos na calha e nos principais afluentes.
Na região de Mogi das Cruzes, onde moram 455 mil pessoas, segundo o IBGE, serão implantados coletores no trecho de área urbana que encaminharão os efluentes para tratamento na ETE Suzano ou outros locais adequados. Além disso o Departamento de Águas e Energia Elétrica investiu R$ 2,9 milhões na contratação de um estudo, já em desenvolvimento, para apontar soluções que reduzam a carga poluidora da área urbana do município lançada no rio.
Saneamento Básico
As ações do Renasce Tietê vão acontecer paralelamente às ações de saneamento básico do Projeto Tietê, realizado pela Sabesp. Na cidade de Guarulhos, segunda maior do estado com 1,4 milhão de habitantes, o tratamento e a coleta de esgoto que, em 2019, era de cerca de 5% e deve chegar a 40% até o fim deste ano.
A Sabesp deve investir ainda cerca de R$16,6 bilhões em 6 anos nos municípios da Região Metropolitana de São Paulo para conectar 3,3 milhões de imóveis à rede. Segundo a companhia, com o Projeto Tietê, aproximadamente 12,4 milhões de paulistas passaram a ser atendidos com coleta e tratamento de esgoto. A cobertura com rede de coleta de esgoto na RMSP saltou de 70% da área urbanizada para 92% e o tratamento do esgoto foi ampliado de 24% para 85% do volume coletado.
“Para que o Tietê alcance a condição e seu potencial para contribuir com a segurança hídrica, as políticas públicas e metas do Governo do Estado precisam estar interligadas. O Plano da Bacia deve coordenar as metas de despoluição do rio Pinheiros, de saneamento, de concessão de outorgas, de gestão dos reservatórios e de políticas de combate às mudanças climáticas”, afirma Malu Ribeiro, diretora de Políticas Públicas da SOS Mata Atlântica.
Malu ressalta que, principalmente em tempos de emergência climática, um rio da dimensão do Tietê deve ser tratado como importante alternativa à segurança hídrica no estado de São Paulo.
Vale lembrar que, no dia 28 de julho de 2010, a Assembleia Geral das Nações Unidas declarou o acesso à água limpa e segura e o saneamento como direito humano essencial para a vida e condição para alcançar todos os outros direitos humanos, mas esta decisão ainda não está validada pela Constituição brasileira.
“É urgente reconhecer e incluir o acesso à água potável dentre os direitos fundamentais dos brasileiros e brasileiras, com a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC 06/2021). O texto já foi aprovado por unanimidade no Senado Federal, em 2021, e está na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados e precisa ser levado à votação em plenário”, finaliza Malu.
Fonte: CicloVivo
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