Oito organizações que atuam pelo desenvolvimento sustentável do Brasil somam esforços para estimular Soluções Baseadas na Natureza (SBN) como estratégia para mitigar os efeitos da mudança do clima nas cidades, enfrentar desafios urbanos e tornar as cidades mais resilientes.
O termo é relativamente recente e ainda pouco conhecido do grande público no país. Contudo, o conceito, estabelecido pela União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), é simples: promover intervenções inspiradas em ecossistemas saudáveis para enfrentar desafios urgentes da sociedade, especialmente nas grandes metrópoles. Escassez hídrica, enchentes, desaparecimento da biodiversidade, problemas de saúde e avanço do nível do mar são algumas das questões que podem ser enfrentadas considerando a natureza como parte da solução, gerando benefícios ambientais, sociais e econômicos.
A parceria das oito organizações gerou a Aliança Bioconexão Urbana, apresentada nesta quarta-feira, 12 de maio. Fazem parte da iniciativa a Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, o Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), a Rede Brasil do Pacto Global da ONU, o ICLEI (Governos Locais pela Sustentabilidade), a Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (BPBES), o WRI Brasil, o Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas (PBMC) e a The Nature Conservancy Brasil (TNC).
“A Aliança Bioconexão Urbana consolida a formalização da parceria entre atores estratégicos com atuação em SBN no Brasil para desenhar soluções compartilhadas que subsidiem a elaboração de políticas públicas, o planejamento urbano sustentável e aumentem o investimento nesta estratégia para tornar as cidades brasileiras mais resilientes aos impactos da mudança do clima”, explica o gerente de Economia da Biodiversidade da Fundação Grupo Boticário, André Ferretti.
A Aliança pretende disseminar o conceito de SBN para que a população entenda e valorize as áreas verdes urbanas e metropolitanas, além de contribuir para que o poder público e o setor privado estejam comprometidos com os investimentos necessários nesse tipo de estratégia.
Outro objetivo é incentivar que áreas naturais sejam protegidas por meio da implantação de soluções que usem a infraestrutura natural em áreas metropolitanas que incluem a área rural, considerando aspectos de adaptação à mudança do clima.
Entre as metas e compromissos a serem assumidos pela Aliança estão a criação de um grupo de trabalho de políticas públicas sobre SBN, ações de engajamento do setor privado e a construção de capacidades junto ao setor público.
“A articulação de diferentes atores para que haja entendimento sobre a importância da natureza na busca por soluções efetivas para problemas contemporâneos é um passo essencial para que a transformação das cidades ocorra”, afirma Sophia Picarelli, gerente regional de biodiversidade e desenvolvimento circular do ICLEI América do Sul.
Soluções Baseadas na Natureza na prática
Para a paisagista urbana Cecilia Herzog, membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN) e do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), os grandes problemas que as cidades enfrentam precisam de respostas novas e transdisciplinares, a partir de uma visão de futuro em harmonia com a natureza e seus processos ecológicos.
“Soluções Baseadas na Natureza são ferramentas que possibilitam que o poder público faça uma gestão transformadora. A utilização de infraestrutura natural deve fazer parte de uma estratégia para garantir cidades mais inteligentes e resilientes para o futuro.” Cecilia Herzog, Rede de Especialistas em Conservação da Natureza
A infraestrutura verde, uma das aplicações das SBN, vem sendo usada em diferentes regiões do mundo. Por meio da implantação, manutenção ou recuperação de áreas verdes em pontos estratégicos das cidades, por exemplo, cria-se um sistema natural capaz de absorver a água da chuva, filtrar sedimentos do solo e reduzir custos com saneamento e saúde pública.
Um estudo do WRI Brasil, publicado em 2018 em parceria com diversas entidades, mostrou que o aumento da cobertura florestal em 8% no Sistema Cantareira, na capital paulista, poderia reduzir em 36% a sedimentação.
“A infraestrutura natural melhora o desempenho financeiro das empresas de saneamento, reduzindo o custo de tratamento da água. Isso ocorre porque as áreas verdes impedem que mais sedimentos cheguem aos rios e, consequentemente, às estações de tratamento”, explica Rafael Feltran-Barbieri, economista sênior do WRI Brasil.
Para se ter uma ideia do impacto que isso pode gerar, a Estação de Tratamento de Água do Guandu, a maior do mundo, localizada no Rio de Janeiro, gasta 140 toneladas de sulfato de alumínio, 30 toneladas de cloreto férrico e mais 25 toneladas de cal diariamente para retirar impurezas da água que abastece a Região Metropolitana.
Infraestrutura verde
Programas que utilizam SBN já são implementados com sucesso em diversas partes do mundo. Um dos exemplos é o de Nova Iorque (EUA), que, em vez de obras tradicionais de engenharia pesada para enfrentar problemas com o abastecimento de água, apostou em uma parceria público-privada para conservar bacias hidrográficas. Hoje, a medida colhe resultados significativos, chegando a uma relação de US$ 7 economizados com o tratamento de água para cada US$ 1 investido em conservação.
Outros exemplos de infraestrutura verde são sistemas de produção sustentável de alimentos, que têm o potencial de ampliar a segurança alimentar da população e garantir a revitalização de bacias hidrográficas, e a adoção de parques lineares nas margens de rios, que evita enchentes e inundações, gerando mais segurança frente aos impactos de eventos climáticos extremos.
A criação de parques é outra opção que traz diversos benefícios também à saúde da população. Além de melhorar a qualidade do ar e amenizar as altas temperaturas nas metrópoles, estruturas verdes voltadas ao lazer estimulam atividades físicas e esportivas, contribuindo para melhorar a qualidade de vida e reduzir gastos com saúde pública.
Outro estudo, conduzido pela TNC, intitulado “Beyond the Source”, realizado em 4 mil médias e grandes cidades do mundo, mostrou como as Soluções Baseadas na Natureza são uma poderosa resposta para endereçar uma solução sistêmica e que pode aumentar a quantidade e a qualidade da água nessas localidades.
“As soluções baseadas na natureza, além de melhorarem a qualidade e aumentarem a quantidade da água, também podem ajudar a mitigar os efeitos das mudanças climáticas, preservar os ecossistemas fundamentais e criar comunidades mais saudáveis e resilientes”, diz Rodrigo Spuri, diretor de Conservação da TNC Brasil. “Proteger as bacias hidrográficas também pode conservar ou aumentar os recursos de água subterrânea, ao visar as zonas de recarga dos aquíferos e outras áreas sensíveis da paisagem”.
Fonte: CicloVivo
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