Em face das consequências do aquecimento global, é preciso se preparar para grandes rupturas ou colapsos sociais. O alerta foi realizado por uma carta pública assinada – até o momento – por mais de 250 cientistas e acadêmicos de 30 países.
Políticos, governadores, legisladores tem de considerar o risco crescente de graves rupturas, ou mesmo de colapso social, associados às mudanças climáticas e à degradação do meio ambiente, afirma o documento.
Assinam a carta cientistas e acadêmicos de inúmeras áreas temáticas relacionadas ao tema e de dezenas de centros de pesquisa e universidades. Outros pesquisadores poderão aderir à publicação até o final de 2020.
O Ciência e Clima apresenta abaixo uma versão da carta, traduzida na íntegra para o português.
É hora de planejar para o risco de colapso
Enquanto cientistas e acadêmicos de todo o mundo, nós solicitamos aos formuladores de políticas que passem a considerar o risco de ruptura e até mesmo de colapso de nossas sociedades. Após cinco anos falhando em cumprir o Acordo Climático de Paris, sem reduzir as emissões de carbono (1), estamos diante das consequências.
Os esforços voltados para reduzir as emissões humanas e elevar o sequestro de carbono continuam essenciais. Todavia, chegamos em um ponto no qual muitos pesquisadores, em diferentes campos do conhecimento, avaliam que o cenário de colapso social até o final do século se tornou factível (2a e 2b). Apesar de perspectivas distintas quanto à localização, extensão, tempo, permanência e causa das rupturas, a preocupação comum é a forma como as sociedades modernas exploram as pessoas e a natureza (3a e 3b).
“Chegamos em um ponto no qual muitos pesquisadores, em diferentes campos do conhecimento, avaliam que o cenário de colapso social até o final do século se tornou factível”
Carta pública de alerta sobre ruptura e colapso social
As comunidades e sociedades irão se preparar para o risco de rupturas e de colapso se os formuladores de políticas promoverem o debate sobre esses riscos. Só assim as comunidades e sociedades terão condições de reduzir sua probabilidade, velocidade, gravidade e possíveis danos às pessoas mais vulneráveis e à natureza.
As forças armadas de alguns países já incluíram cenários de ruptura e colapso em seu planejamento futuro (4a e 4b). Pesquisas mostram que muitas pessoas consideram a possibilidade de colapso social (5). Infelizmente, rupturas e colapsos se tornaram experiência ou marcaram a memória de comunidades do Sul Global (6). O assunto, contudo, ainda não encontra divulgação satisfatória na mídia e, em grande parte, está ausente da sociedade civil e da política.
Quando a mídia aborda o risco de colapso, geralmente inclui o ponto de vista de pessoas que condenam a discussão do tópico, muitas vezes baseadas em especulações – como, por exemplo, envolvendo campanhas estrangeiras de desinformação ou impactos na saúde mental e na motivação (7). Tais pontos de vista atrapalham uma discussão séria sobre o tema e prejudicam os milhares de ativistas e líderes comunitários que, frente à possibilidade de rupturas e colapsos futuros, encontram sua motivação para a luta pelo clima, pela ecologia e pela justiça social.
Pessoas que se preocupam com questões ambientais e humanitárias não devem ser desencorajadas a participar da discussão sobre os riscos de ruptura ou colapso social. Excluí-las pode fazer com que o tema seja conduzido por pessoas com menor comprometimento com esses valores.
Alguns entre nós acreditam que a transição para uma nova forma de sociedade é possível. A transição dependeria de ações orientadas para a redução de danos ao clima, à natureza e às pessoas, além do planejamento para eventos de grandes rupturas na vida cotidiana. Estamos unidos no esforço de evitar que o debate a respeito do colapso seja utilizado como obstáculo para a transformação da sociedade.
Sabemos como é emocionalmente desafiador reconhecer os danos que estão acontecendo e a ameaça crescente ao nosso modo de vida atual. Também conhecemos o grande senso de solidariedade que pode surgir frente a esses desafios (8). É hora de sentarmos para ter uma conversa difícil, a fim de reduzir a nosso cumplicidade com os danos que estão ocorrendo, e explorar a criatividade para tirarmos o melhor proveito de um futuro turbulento (9).
Fonte: Ciência e Clima
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