Em seu artigo semanal, o empresário e doutor em Engenharia dos Transportes, Augusto Rocha, professor da Ufam, aponta as consequências do atraso, uma visão improvisada deste item fundamental e decisivo para o êxito de qualquer negócio, a logística dos transportes. “A falta que a ciência dos transportes faz” é um alerta para a improvisação que não agrega e ao amadorismo que descreve nosso atraso.
Trata-se de um “presta atenção” para tanto desperdício e negligência das iniciativas circunscrita a quatro anos. O Ciclo da Borracha ruiu não foi porque os ingleses roubaram as sementes da seringueira – fosse por isso, os itens centrais de nossas commodities deveriam ser criminalizados. A genialidade inglesa foi construir em Glasgow, no Reino Unido, embarcações ajustadas a carga e passageiros na Amazônia. Com isso, eles alcançaram em tempo recorde agregar 60% de Valor a sua economia.
Eles vislumbraram a importância da logística dos transportes e a lucratividade implícita nos acertos desse departamento. Enquanto isso, os governantes nativos insistem em viajar para outros países para conhecer alternativas, sendo que elas estão a nossa frente, ao alcance das medidas corajosas.
Diz Augusto: “O que precisamos desesperadamente faz alguns anos é algo muito mais simples: tapar os buracos do Distrito Industrial. Nossa casa.”. Confira a reflexão.
A falta que a ciência dos transportes faz
Augusto César Barreto Rocha (*)
Ao longo dos últimos dias fiz revisão de material didático para a disciplina Planejamento dos Transportes que leciono na graduação de Engenharia Civil. Uma das novidades que inseri para este período foi um detalhamento maior da adoção de técnicas científicas na modernização de cidades, com um quadro comparativo entre países. Ao concluir a atualização, notei o quanto não aplicamos conhecimentos científicos na gestão das cidades brasileiras.
Por exemplo, Manaus parece que está na década de 1970 ou 1980, pois ainda se fala como “novidade” a implantação de BRT. Ou seja, quarenta anos depois desta solução ser desenvolvida, ainda há debate se uma faixa exclusiva para ônibus deve ou não ser implementada. Nos anos 1990 a simulação computacional virou regra para qualquer obra de infraestrutura. Hoje não se percebe o uso destas ferramentas de maneira mínima ou de modelos de pesquisa operacional, porque se eles fossem usados as formas de posicionar linhas e paradas de ônibus seria outra, a forma de projetar retornos ou faixas de rolamento seria completamente diferente. Nos anos 2000 a preocupação internacional era em torno da recuperação de áreas degradadas, buscando o melhor uso dos ativos públicos. Será que faremos isso em dez anos?
A urgência da logística inteligente e…
Para falar de algo mais moderno, desde 2017 há cidades buscando a regulagem do transporte de passageiros por drone e já há uma empresa produzindo este bólido com o propósito de vendê-lo como táxi de voo autônomo. Aqui, ainda enfrentamos dúvidas sobre como parar de passar a maior parte das linhas de ônibus pelo centro da cidade, uma prática dos anos 1980, quando o porte urbano era completamente diferente do atual. O transporte está presente no dia a dia de todos nós, porque sempre há a necessidade de deslocamentos diários. Uma descoberta que surge a cada três anos, nos últimos 15 anos, pelo menos, é o corredor Manta-Manaus para acesso ao Pacífico ou o corredor Lima-Manaus, com a alternativa Paita-Manaus (quando se fala que o porto de Lima está congestionado), como se precisássemos desesperadamente do acesso ao Pacífico. Como se isso fosse a solução para a nossa baixa competitividade.
…reconstruir a paisagem do Polo Industrial
O que precisamos desesperadamente faz alguns anos é algo muito mais simples: tapar os buracos do Distrito Industrial. Nossa casa. Por outro lado, para estabelecer uma rota entre Manta e Manaus, as cargas terão que atravessar todo o Equador e parte da Colômbia. Imagine só 4500 viagens de caminhões a cada navio atracado, atravessando duas alfândegas: do porto de Manta, do ingresso na Colômbia e para daí então chegar na fronteira brasileira, numa das áreas de maior tráfego de drogas do mundo. Percurso exótico para uma solução de logística industrial.
Novos paradigmas e o cotidiano
Entretanto, não é só isso. Superada esta fase, os 4500 contêineres, de um em um, serão colocados em pequenas balsas para o transporte até Manaus. É fácil entender a razão de este projeto ser abandonado a cada três anos. O que ainda tenho alguma dificuldade para entender é qual a razão de ele voltar para a pauta a cada três anos. Qual a razão? Também tenho dificuldade para entender por que tem tanto buraco no Distrito Industrial. Já li várias notas para imprensa contendo um longo detalhamento do que foi feito pela Suframa, já tive reuniões com Engenheiros e Secretários do Município e do Estado. Mesmo com a gentileza, didática e elegância dos textos e deles, tenho tido dificuldade para entender como podemos dizer que há defesa da indústria em nossa cidade e que ela é importante.
Setor produtivo
Conforme analisado por André Lara Rezende, no brilhante texto “Consenso e Contrassenso: déficit, dívida e previdência” (recomendo a leitura, são apenas 22 páginas) são necessários novos paradigmas para a análise dos problemas do cotidiano. Enquanto a eficiência no uso do recurso público não for considerada, será difícil obter progresso. Enquanto o apoio ao setor produtivo não for considerado, será difícil gerar imposto em quantidade expressiva para as necessidades de gastos. Precisamos sair dos discursos e análises rasas se queremos verdadeiramente sair da crise atual. Por ora, não parece ser o caso. Ainda bem que existe a morte e que as novas gerações vêm por aí. Tomara que a teoria da evolução da espécie continue se comprovando. Um excelente ano novo para todos, afinal dizem que no Brasil o ano só começa depois do Carnaval.”
*Augusto Barreto Rocha é doutor em Engenharia de Transportes (COPPE/UFRJ), professor da UFAM (Universidade Federal do Amazonas), diretor adjunto da FIEAM, Coordenador da Comissão de Logística do CIEAM.
Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. [email protected] |
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