São incontáveis os benefícios espalhados pela Zona Franca de Manaus, o melhor resultado social e econômico de renúncia fiscal para redução das desigualdades regionais. De todos os benefícios espalhados na região, a UEA, Universidade do Estado do Amazonas, integralmente mantida pela indústria da ZFM, é, reconhecidamente, o maior legado. Escolhido pela comunidade, acadêmica, alunos, funcionários e professores, Cleinaldo Costa é o reitor da instituição e, numa entrevista à Follow-Up, conta as principais conquistas e os desafios que tem enfrentado. Confira.
FOLLOW-UP – As empresas instaladas no Polo Industrial de Manaus consideram o fato de patrocinarem a UEA como o maior legado da ZFM em seus 50 anos. Quais são as respostas que a UEA tem dado este presente?
CLEINALDO COSTA – Não tenho dúvida que a Universidade do Estado do Amazonas é o maior legado da ZFM nestes 50 anos. Já formamos, nos 15 anos de existência da UEA, mais de 43 mil egressos em cerca de 80 cursos de graduação. Além disso, contamos atualmente com 8 cursos próprios de mestrado e doutorado e estamos presentes nos 61 municípios do interior do Amazonas, sendo 17 deles com sede própria. Somos hoje a maior universidade multicampi do país. Temos uma responsabilidade muito grande por causa de tudo isso. De 2013 para cá, enviamos 162 professores para doutorado, metade deles atuam no interior do Amazonas. Quando esses professores foram fazer seu doutorado, tínhamos na UEA apenas 208 doutores. Considerando o cenário atual, vamos ter, em 2018, o dobro de doutores em comparação ao que se tinha em 2012. Em outros termos, teremos metade dos professores da UEA com doutorado. Esse é um caminho sem volta do ponto de vista acadêmico, tecnológico e social. Trata-se de um ganho imenso para o aparelho formador do estado do Amazonas e, naturalmente, para a estratégia de desenvolvimento do Estado. Em síntese, nos últimos 50 anos, penso que os investimentos feitos pelas empresas do Polo Industrial de Manaus na UEA foram o melhor e o mais importante investimento realizado e o maior legado que a ZFM pôde prover aos cidadãos amazonenses.
FUP – Olhando para o futuro, quais os projetos e programas da UEA na relação economia academia no adensamento, diversificação e interiorização do desenvolvimento?
CC – Em primeiro lugar, é preciso entender o que surge de demanda social no interior do estado do Amazonas que precisa ser respondida do ponto de vista do aparelho formador de recursos humanos. Precisamos conhecer e entender as demandas que vem dos municípios e mesorregiões do ponto de vista de carreiras e programas de formação de graduação. Dentro desse cenário, a UEA analisa a demanda que vem da comunidade, a demanda que vem dos gestores municipais e, naturalmente, a demanda e o ambiente socioeconômicos do município e do seu entorno. As vocações naturais dos municípios e dos munícipes também são levadas em consideração. Dentro desse cenário, implantamos cursos de graduação chamados cursos de oferta especial. Ao mesmo tempo, oferecemos a um grupo de aproximadamente 20 municípios um curso com o mesmo formato. Isso não satura o mercado e leva para essas comunidades exatamente a possibilidade de formação de carreiras que são efetivamente necessárias para o desenvolvimento daquele município ou região e, com isso, conseguimos alavancar a economia do Amazonas por meio da formação de recursos humanos adequados. Esse é o principal papel da UEA do ponto de vista de competitividade do ponto de vista de formar recursos humanos na região. Durante muito tempo, as universidades não prestaram atenção às demandas que vem do mercado e, no caso do Amazonas, às demandas o PIM apresenta. Até cerca de uma década atrás, era comum que as empresas trouxessem técnicos de outros estados brasileiros e até estrangeiros para a ocupação de cargos no próprio polo. Diante dessa situação a UEA posicionou-se, aproximando-se da indústria, entendo as necessidades da indústria do ponto de vista de recursos humanos e formar os profissionais que as indústrias necessitam. A partir daí, esse diálogo com a indústria mudou, estando ambas mais próximas uma da outra e contribuindo para diversas questões do ponto de vista estratégico, decisório e político. Outro cenário importante quanto ao adensamento de relação é entender as cadeias produtivas do estado e onde a universidade pode se inserir para formar quadros, capacitar pessoal para exercer esse papel de desenvolvimento das cadeias produtivas. A partir disso, a UEA consegue ofertar cursos de graduação e de pós-graduação para atender aos municípios, às demandas do mercado e indústrias e, ainda, alavancar a economia do estado. É muito importante ressaltar que as indústrias investem num modelo que é um aparelho formador que responde às demandas da formação de quadros para dinamizar a economia do estado. É uma via de mão dupla, entendendo as demandas e formando pessoas que tenham condições de serem inseridas nas cadeias produtivas.
FUP – Em abril deste ano, a UEA deu início às aulas do DINTER O Doutoramento Interinstitucional com a USP, em Administração. Além disso, nossa Universidade está firmando parceria com a FEA para instalar a FIPE Amazônia. Que cenários começam a ser desenhados com esta aproximação acadêmica?
CC – O programa de doutoramento em Administração na FEA/USP tem nota 7 na Capes, órgão que coordena a capacitação docente do Brasil e 7 é nota máxima. Do ponto de vista de entender a administração e economia, é a escola com maior prestígio na América Latina. Eles têm 70 anos de prestígio consolidado. Eles conseguem consolidar, desenhar modelos, entender, interpretar, executar pesquisas e oferecer serviços como nenhuma escola de economia e administração no Brasil e na América Latina. Eles têm o maior respaldo técnico e político. Por essa razão, e pela necessidade de aprofundar o conhecimento acadêmico para a área do PIM, entender sua dinâmica e legislação, aprofundar os conhecimentos quanto à sua dinâmica e logística e quanto às necessidades da indústria do ponto de vista de gestão, de Recursos Humanos, de matéria-prima, de cadeias produtivas, de avanço tecnológico, é preciso que tenhamos parceria com quem faz isso e muito bem. Este programa de doutorado interinstitucional com a FEA/USP é o programa de pós-graduação Stricto sensu mais estratégico para o Amazonas. Com ele, formaremos quadros de profissionais que irão pensar o futuro do ponto de vista econômico e administrativo para o Amazonas para os próximos 40 anos. Formar essa massa crítica para discutir a economia do Amazonas face ao PIM e aos seus 50 anos de renovação, face à sua legislação específica, face às necessidades de avanços tecnológicos. Isso tem um impacto enorme dentro da UEA, mas muito maior, do ponto de vista estratégico para o Amazonas. A partir de agora, passaremos a ter efetivo de pessoal e inteligência consolidados na área de alta administração que poderá interferir positivamente nos rumos da economia do Amazonas e do PIM. Vamos promover a gestão da Amazônia, suas potencialidades a serviço da prosperidade geral.
FUp – Assim como a ação federal na Amazônia é desarticulada, como denunciou o TCU Tribunal de Contas da União em acórdão com o MPF Ministério Público Federal do Amazonas, como superar e tornar fecunda essa desarticulação, que é cultural, entre os setores da Universidade e do poder público na relação com a sociedade? Qual o papel da academia neste desafio?
CC – A academia tem um papel de tornar esse entendimento um fato: a articulação cultural entre a universidade, o poder público e a sociedade. Aproximar o cenário cultural do estado como um todo, elaborar políticas de entendimento, de conhecimento, valorizando a cultura local e garantindo que ela não seja perdida e, naturalmente, devolver isso para a comunidade como um produto inteligível. A ideia é que a comunidade possa conhecer sua cultura, fortalecer-se com ela e usar essas ferramentas de autoconhecimento como estratégia de desenvolvimento. Não se trata de importar modelos ou entender como outros estados e países funcionam. Queremos entender a Amazônia, o amazônida e o nosso ambiente. Queremos entender o efeito colateral mais positivo que o PIM nos trouxe, considerando os cuidados com a floresta amazônica. Trabalhar nessas bases com vistas ao desenvolvimento local está no papel da universidade. Apontar caminhos que preservem a cultura, que reafirmem nossa cultura, mas que os coloquem antenados com o mundo sem prejudicar a floresta: este é o foco.
FUp – Novas matrizes econômicas tem sido o mote do Centro da Indústria do Estado do Amazonas ao propor maior aproximação com a UEA, a economia com a academia. Como avançar neste desafio de outras bases econômicas para a região?
CC – O PIM tem hoje um foco tecnológico em oferta de bens e de consumo durável. No entanto, precisamos compreender que outras matrizes econômicas também são importante para este estado. Uma dessas, no nosso ponto de vista, é o turismo. Uma proposta é o desenvolvimento sustentável do turismo no nosso estado. Outra proposta é a exploração de minérios de alto valor agregado, na nossa região, sem dano ao ambiente. Temos enormes jazidas, de diversos minérios importantes, e é preciso que se coloque essa matriz econômica na pauta. O desenvolvimento sustentável da pesca que não agrida o meio ambiente e produza proteína em quantidade e qualidade suficiente para a exportação e que se reverta num produto genuinamente amazonense de consumo mundial. Esse é outro desenho que queremos trabalhar nos próximos anos. Também consideramos a presença ainda incipiente de uma indústria naval na maior bacia hidrográfica do planeta. Somar essas cadeias produtivas todas, em um novo arranjo, inserir-nos dentro do planejamento estratégico que o Amazonas vem trabalhando como a UEA sendo o aparelho formador que preparará recursos humanos para o entendimento, para a formação e para o desenvolvimento dessas novas matrizes econômicas, estando em consonância com o PIM no sentido de assegurar a formação destes recursos humanos para que essas novas cadeias produtivas aconteçam em nosso estado e gerem riquezas, mais emprego e melhorem a qualidade de vida do cidadão amazonense: esse é o papel da UEA. Em síntese, ajudar a pensar, ajudar a desenvolver e tornar a realidade das novas cadeias produtivas um fato tangível para o nosso povo.
Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. [email protected]
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