“O mercado de créditos de carbono pode se tornar um instrumento eficaz para preservar a floresta em pé e gerar benefícios econômicos, mas apenas se operado com seriedade e transparência. O foco deve estar em projetos genuínos e impactantes, que respeitem a Amazônia e promovam o bem-estar das comunidades que nela vivem.”
Por Nelson Azevedo
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Em 2024, o mundo vivencia o que parece ser o ano mais quente já registrado, ultrapassando pela primeira vez o limite crítico de 1,5°C de aquecimento global em relação à era pré-industrial. Esse limiar representa um ponto de inflexão para a estabilidade climática, um alerta para governos, empresas e a sociedade civil em relação à urgência de ações efetivas para mitigar os efeitos das mudanças climáticas. Nesse cenário, a regulamentação do mercado de créditos de carbono no Brasil, aprovada recentemente pelo Senado, surge como um instrumento relevante e urgente para contribuir com a redução das emissões e o cumprimento das metas climáticas assumidas pelo país. Entretanto, é muito importante ligar todos os radares e ativar precauções pois há riscos envolvidos.
Regulamentação, perspectivas e desafios
A regulamentação do mercado de carbono no Brasil visa estabelecer as bases legais e institucionais para que empresas e setores produtivos possam se engajar em um mercado estruturado de compensações de emissões. Trata-se de um passo importante para o Brasil, que possui potencial para se tornar um dos maiores protagonistas mundiais nesse segmento, devido à sua vasta cobertura florestal e biodiversidade, especialmente na Amazônia. No entanto, a implementação desse sistema depende de diversos fatores, como o estabelecimento de critérios rigorosos de certificação e verificação das emissões, a garantia de transparência nas transações e o envolvimento efetivo de comunidades locais, especialmente as populações tradicionais e indígenas que habitam a Amazônia.
Oportunidades e riscos para o Polo Industrial de Manaus
O Polo Industrial de Manaus, por sua localização estratégica e interação direta com a floresta amazônica, pode encontrar no mercado de créditos de carbono uma oportunidade para reforçar sua contribuição à sustentabilidade regional. Empresas situadas na Zona Franca de Manaus (ZFM) poderiam se beneficiar do desenvolvimento de projetos de compensação de emissões ou mesmo de redução direta de suas pegadas de carbono. Projetos como reflorestamento, preservação de áreas florestais e implementação de tecnologias de baixo carbono podem não apenas auxiliar no cumprimento de metas ambientais, mas também representar novas fontes de receita.
Greenwashing – maquiagem ambiental
Porém, essas oportunidades vêm acompanhadas de desafios e riscos consideráveis. O mercado de carbono é suscetível a práticas de “greenwashing” — quando empresas adotam estratégias de marketing ambiental sem que estas correspondam a uma efetiva redução de impacto. A participação no mercado de carbono exige das empresas uma postura de cautela e responsabilidade. Qualquer falha ou estratégia questionável poderia resultar em danos à reputação das empresas e até em consequências legais, especialmente no contexto de uma regulamentação recente e ainda sujeita a interpretações e ajustes.
Cautela, foco e rigor
Para que o Polo Industrial de Manaus possa se engajar de maneira efetiva e segura no mercado de carbono, recomenda-se cautela, foco e rigor na avaliação dos riscos e benefícios. Antes de embarcar em projetos de compensação de carbono, as empresas devem realizar uma análise criteriosa dos riscos e benefícios. É essencial garantir que qualquer investimento em créditos de carbono esteja alinhado com as metas ambientais da empresa e tenha respaldo técnico e científico.
Engajamento com Comunidades Locais
Projetos de carbono na Amazônia muitas vezes envolvem territórios habitados por comunidades indígenas e populações tradicionais. A inclusão desses atores é vital para a legitimidade e sustentabilidade dos projetos. A consulta prévia e o estabelecimento de parcerias que beneficiem essas populações são elementos essenciais para garantir que os projetos de carbono respeitem e fortaleçam os direitos dessas comunidades. Isso é um tema delicado onde é necessário redobrar atenção com o que dizem os detalhes da legislação.
Transparência e Verificação Independente
É fundamental que as empresas adotem práticas de transparência e busquem certificações de organismos reconhecidos para a validação dos créditos de carbono. A verificação independente assegura que os créditos comprados ou vendidos representam reduções reais de emissões, contribuindo para a credibilidade dos projetos e, efetivamente, resultem em contribuições objetivas de agregação de valor à emergência climática.
Uso de Tecnologias de Monitoramento
A utilização de tecnologias como sensores remotos e satélites permite monitorar e verificar com precisão as áreas de conservação e os projetos de reflorestamento. Esse controle tecnológico ajuda a evitar fraudes e garante que as áreas de preservação estejam sendo mantidas conforme prometido. Estes detalhes são recomendações de empresas e respectivos consultores que mergulharam na engrenagem das operações.
Planejamento Estratégico da Empresa
A inserção de iniciativas de carbono deve estar em sintonia com o planejamento estratégico das empresas do Polo Industrial de Manaus, garantindo que elas não se tornem apenas ações isoladas, mas parte de uma cultura organizacional voltada para a sustentabilidade. Em sua história de certificação pela metodologia ISO, as empresas aqui instaladas conhecem a liturgia rigorosa dessas operações.
Futuro do Mercado de Carbono na Amazônia
Durante décadas buscamos demonstrar que a geração de empregos e oportunidades do Polo Industrial de Manaus era nossa melhor contribuição para conservação da floresta. E de uma hora para outra essa equação passa a ser monetizada. Daí considerarmos que o PIM tem a chance de se consolidar como um ator relevante no mercado de créditos de carbono, contribuindo tanto para a mitigação climática quanto para o desenvolvimento sustentável da Amazônia.
Credibilidade da ZFM
Essa oportunidade, legalmente regulamentada, exige das empresas do polo um compromisso com boas práticas, responsabilidade social e alinhamento com as diretrizes de sustentabilidade. O mercado de carbono pode se tornar um instrumento eficaz para preservar a floresta em pé e gerar benefícios econômicos, mas apenas se operado com seriedade e transparência. O foco deve estar em projetos genuínos e impactantes, que respeitem a Amazônia e promovam o bem-estar das comunidades que nela vivem.
Nelson é economista, empresário e presidente do sindicato da indústria Metalúrgica, Metalomecânica e de Materiais Elétricos de Manaus, conselheiro do CIEAM e vice-presidente da FIEAM.
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