“O compromisso de Dr. Noronha com a Zona Franca de Manaus era uma extensão de seu compromisso com o futuro da Amazônia e de sua gente. Em sua ausência, a responsabilidade recai sobre todos que compartilham de sua visão, para que a floresta continue a ser um patrimônio natural e, sobretudo, um exemplo de como o desenvolvimento pode respeitar a natureza e promover o bem-estar social”.
Por Alfredo Lopes
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Coluna Follow-Up
A partida do jurista Raymundo Nonato Botelho Noronha deixa uma lacuna irreparável para o Amazonas e para a Amazônia. Em sua trajetória como defensor incansável da Zona Franca de Manaus (ZFM), Dr. Noronha consolidou-se como uma das maiores autoridades em Direito Tributário e legislação de desenvolvimento regional, dedicando décadas de sua vida ao estudo e à proteção de um modelo de desenvolvimento fundamental para a sustentabilidade da floresta e para o equilíbrio social e econômico da região.
Desde o início de sua carreira pública, Dr. Noronha esteve atento à complexidade da Amazônia e aos desafios impostos por políticas fiscais que, frequentemente, ameaçam a competitividade e a existência do Polo Industrial de Manaus. Seus posicionamentos firmes e sua análise crítica tornaram-se um alicerce da defesa jurídica da ZFM, um modelo constantemente atacado por aqueles que não compreendem a política fiscal como um pilar de desenvolvimento regional em áreas remotas. À frente da luta pela legitimidade dos incentivos fiscais, ele mostrou incansavelmente que a Zona Franca de Manaus não é apenas um espaço de produção, mas uma estratégia essencial para reduzir as desigualdades regionais do Brasil.
Um combatente da ZFM e da Justiça Fiscal
A experiência jurídica de Raymundo Noronha o levou a um entendimento profundo sobre as dinâmicas que moldam a política de incentivos fiscais no Brasil, permitindo-lhe rebater críticas infundadas e desmistificar as tentativas de desconstrução da ZFM. Ele conhecia bem os meandros e armadilhas que, sob a fachada de reformulação fiscal, ocultam interesses prejudiciais à Amazônia. Em 2022, os chamados “editais do fim do mundo” surgiram como uma sequência de decretos que visavam subverter os benefícios da ZFM. Como alguém que defendia não apenas a legalidade, mas também o espírito constitucional da Zona Franca, Noronha denunciou as brechas e burlas que atentavam contra a competitividade das empresas locais e contra os direitos assegurados pela Constituição.
No Decreto n. 11.182/2022, por exemplo, Dr. Noronha enxergou uma tentativa sutil de minar a competitividade da ZFM, com a retirada de 358 produtos do amparo fiscal. Esse tipo de estratégia, disfarçada de ajuste econômico, causou uma onda de indignação entre os empresários da região, um sentimento de frustração que ele compartilhou e vocalizou com vigor. Para ele, as medidas eram uma ameaça direta aos empregos e à economia local, assim como uma clara demonstração da desindustrialização forçada que se impõe sobre a Amazônia em benefício de interesses de outras regiões.
Defesa dos Direitos Constitucionais da ZFM
Raymundo Noronha foi um dos principais articuladores e idealizadores da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM), um marco no incentivo à ciência e à inovação, áreas que ele considerava essenciais para a transformação da Amazônia em um polo de conhecimento e desenvolvimento. Sua visão não se limitava à esfera legal; ele acreditava que a ciência e a educação são chaves para o fortalecimento da Amazônia e de seu povo.
Seus pareceres jurídicos eram respeitados por seu rigor técnico e pela clareza com que elucidavam as contradições e injustiças dirigidas contra a Zona Franca. Diante das sucessivas tentativas de desmonte do modelo de incentivos fiscais, Dr. Noronha demonstrou, com argumentos sólidos e profundos, que a ZFM representa a melhor política de desenvolvimento para uma região que, historicamente, sofreu com o abandono e a incompreensão por parte das autoridades centrais. Ele lembrava frequentemente que a ZFM, mesmo com todas as suas dificuldades, é uma das poucas estratégias de desenvolvimento realmente eficazes para a Amazônia, proporcionando emprego, renda e, acima de tudo, uma alternativa à exploração predatória dos recursos naturais.
Apelo à reciprocidade republicana
Para Noronha, a Zona Franca de Manaus simbolizava um compromisso entre a República e a Amazônia: o desenvolvimento econômico em troca da preservação da floresta. Sua crença na reciprocidade republicana era inabalável, e ele defendia que cada empresa que atuava no Polo Industrial de Manaus também tinha um compromisso com a proteção da Amazônia. A desconstrução progressiva desse pacto, que ele identificou nos editais de 2022 e em outras medidas arbitrárias, era para ele uma violação desse acordo, um golpe contra a esperança de que a floresta pudesse ser mantida em pé com dignidade e prosperidade para aqueles que nela habitam.
A homenagem a Raymundo Noronha vai além do reconhecimento de sua carreira jurídica. É uma lembrança de sua coragem e de sua convicção de que a Amazônia pode e deve ser desenvolvida de forma sustentável. Ele deixa um legado que não é apenas técnico, mas moral, uma inspiração para aqueles que continuam na luta pela justiça fiscal e pela proteção do modelo de desenvolvimento que ele tanto defendeu.
O compromisso de Dr. Noronha com a Zona Franca de Manaus era uma extensão de seu compromisso com o futuro da Amazônia e de sua gente. Em sua ausência, a responsabilidade recai sobre todos que compartilham de sua visão, para que a floresta continue a ser um patrimônio natural e, sobretudo, um exemplo de como o desenvolvimento pode respeitar a natureza e promover o bem-estar social.
Alfredo é filósofo, foi professor na Pontifícia Universidade Católica em São Paulo 1979 – 1996, é consultor do Centro da Indústria do Estado do Amazonas, ensaísta e co-fundador do portal Brasil Amazônia Agora
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