Crise Climática e a chegada do El Niño: Batendo recordes de calor e alertas de especialistas – Um olhar sobre o novo normal do clima global, as ondas de calor inéditas, a diminuição do gelo na Antártida e o urgente chamado para ação face às alterações climáticas.
Nas últimas semanas, o mundo tem se voltado para a iminente chegada do El Niño, um fenômeno climático que modifica os padrões de chuvas e temperaturas globais. No Brasil, ele é conhecido por causar secas nas regiões Norte e Nordeste, e tempestades no Sul. As informações mais recentes, provenientes do Centro de Previsão Climática da Administração Oceânica e Atmosférica Nacional (NOAA) dos Estados Unidos, indicam claramente os sinais do El Niño. Contudo, a intensidade do fenômeno nos próximos meses continua a ser uma incógnita.
Impactos no Brasil
O El Niño, caracterizado pelo aquecimento acima da média das águas nas áreas leste e central do Pacífico Tropical, traz uma série de preocupações. “Em anos de El Niño, a escassez de chuvas no Norte e Nordeste coloca pressão sobre o abastecimento de água e deixa a Amazônia mais vulnerável a queimadas”, destaca o meteorologista Tércio Ambrizzi, do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP). O contraste é visível no Sul, onde a umidade e as chuvas excessivas podem prejudicar a atividade agrícola e causar inundações.
O fenômeno ainda apresenta desafios nas zonas de transição entre essas duas grandes tendências climáticas, como o Centro-Oeste e o Sudeste. “Essas regiões podem sofrer tanto com o excesso quanto com a falta de chuvas”, aponta Gilvan Sampaio, à frente da Coordenação Geral de Ciências da Terra do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Compreendendo o fenômeno e suas flutuações
Essas flutuações climáticas, conhecidas como El Niño Oscilação Sul (ENOS), alternam entre três estados: El Niño, La Niña e um estado neutro. Cada estado é determinado pela temperatura das águas superficiais do Pacífico Tropical, com El Niño ocorrendo quando as águas se mantêm por mais de cinco meses consecutivos ao menos 0,5 grau Celsius (°C) mais quentes que sua média histórica. Em contraste, La Niña ocorre quando as temperaturas são 0,5 °C mais frias por um período similar.
A dificuldade de previsão
De acordo com a meteorologista Michelle Reboita, da Universidade Federal de Itajubá (Unifei), de Minas Gerais, identificar um El Niño não é tão simples quanto observar uma única leitura de temperatura. A NOAA só emitiu alerta após perceber o aquecimento em junho e modelos climáticos indicarem que a temperatura não vai se reduzir nos próximos meses.
Ainda assim, a intensidade do El Niño é outra questão. Segundo dados de julho da NOAA, o aquecimento das águas do Pacífico Tropical estava em torno de 1 °C. Um El Niño é considerado fraco se o aumento da temperatura for entre 0,5 e 0,9 °C, moderado entre 1 e 1,5 °C e forte acima disso. Contudo, essa classificação é feita levando em conta a temperatura no auge do El Niño, no final do ano.
Implicações globais
A importância do El Niño vai além das mudanças climáticas. “As variações do El Niño podem ter repercussões significativas em atividades econômicas, como a agricultura e a geração de energia elétrica, além de impactar a vida das pessoas”, salienta a meteorologista Alice Grimm, da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
O mistério sobre o que causa a diminuição dos ventos alísios durante o El Niño, que permite o aquecimento das águas do Pacífico, ainda persiste. “Não está claro se é o oceano que influencia a atmosfera ou o contrário”, pondera Ambrizzi. Essa incerteza torna difícil a previsão precisa do fenômeno, que vem ocorrendo com maior frequência nos últimos anos.
A esperança na ciência
A frequência crescente do El Niño não pode ser definitivamente atribuída ao aquecimento global, diz Ambrizzi. A complexidade do fenômeno exige mais estudos para sua completa compreensão. No entanto, mesmo com todas as incertezas e desafios, o conhecimento sobre o El Niño é fundamental para a preparação e adaptação às suas implicações, seja no Brasil ou em qualquer lugar do mundo.
Calor crescente
Nos últimos anos, o aumento exponencial das emissões de gases de efeito estufa, principalmente CO2, tem sido o maior contribuinte para as tendências de aquecimento. As atividades humanas, desde a revolução industrial, têm acelerado este processo ao queimar combustíveis fósseis, como petróleo, carvão e gás natural, para produzir energia.
Uma das principais preocupações com o aquecimento global é a alteração nos padrões climáticos globais, o que pode levar a eventos extremos como secas, inundações, ondas de calor e tempestades mais intensas. Além disso, o aquecimento dos oceanos pode levar a uma maior acidificação das águas, o que prejudica a vida marinha e os ecossistemas que dela dependem.
Em meio a este cenário preocupante, o fenômeno El Niño ganha força. Normalmente, este fenômeno climático já tem a capacidade de aquecer o clima global, no entanto, com a crise climática atual, sua intensidade e frequência podem ser potencializadas.
A acentuada diminuição do gelo marinho na Antártida é outro sinal alarmante do aquecimento global. Historicamente, o gelo marinho tem servido como um “escudo” refletor, refletindo de volta ao espaço a luz solar que atinge a superfície do planeta. Com a redução deste escudo, mais calor é absorvido pelos oceanos, acelerando ainda mais o processo de aquecimento.
Segundo os pesquisadores, os recordes de temperatura que estamos testemunhando não têm precedentes em nossa história recente. Esta tendência de aquecimento acelerado pode levar a mudanças irreversíveis no nosso planeta, se medidas de mitigação não forem tomadas em breve.
A comunidade científica está em consenso: as alterações climáticas são reais, estão acontecendo agora e são causadas em grande parte por atividades humanas. A necessidade de uma ação coletiva global para reduzir as emissões de gases de efeito estufa nunca foi tão urgente. Estamos em uma corrida contra o tempo para evitar as piores consequências das mudanças climáticas, e cada passo que damos nesta direção conta.
Com informações da Revista FAPESP
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