“Os escoceses e as demais nações presentes na Conferência das Partes em Glasgow, 2021, conheceram, através de Sérgio Vergueiro e Muni Lourenço, associado e presidente da FAEA, respectivamente, o que significa empreender na Amazônia. Em outras palavras, é preciso estudar, amar, se comprometer, trabalhar em mutirão, e manejar com sabedoria, tecnologia e responsabilidade os recursos naturais em favor do tecido social, dentro do conceito universal de sustentabilidade, visando a construção justa e equitativa da prosperidade geral”.
Por Nelson Azevedo
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O programa de desenvolvimento regional, denominado Zona Franca de Manaus, foi estruturado nos três alicerces clássicos da economia, cada um a seu tempo e com resultados substantivos. O setor de comércio e serviços e o polo industrial cumpriram e seguem cumprindo suas atribuições e contribuições para o desenvolvimento da região. O que dizer, porém, do setor primário, incluindo agricultura e agroindústria?
São tímidos os relatos de investimentos e apostas para seu pleno desabrochar, depois de quase seis décadas do programa ZFM e de existência da entidade que administra o setor, a FAEA, a Federação da Agricultura do Estado do Amazonas? Vamos aqui meditar sobre contradições, paradoxos e desequilíbrio de prioridades, para mostrar não apenas a importância desse setor, mas os avanços que, apesar de tantas adversidades, foram consignados e das conquistas e superações.
Faltou suporte ao Agro
São 69 anos da implantação da Federação, da Agricultura do Estado do Amazonas. Seu surgimento coincide com um movimento de ordenação institucional do estado brasileiro que buscou integrar-se aos postulados do programa Zona Franca de Manaus, implantado três anos depois, através do Decreto-Lei 288/1967. No projeto original estava contido o Distrito Agropecuário da Suframa, Superintendência da Zona Franca de Manaus.
Não tardaram a criar os organismos públicos do setor primário, no estado e no município. Sendo claros e justos, entretanto, faltou suporte ao Agro, pois raras vezes foram dadas ao setor as atenções, destaques e recursos financeiros para empinar uma atividade tão essencial e determinante como este segmento do setor produtivo, responsável pela nutrição de qualidade a preços justos e acessíveis, em quantidades adequadas às demandas sociais.
Sol, água, nutrientes e tecnologia
Vale supor que há uma concordância com essa distorção assim como ainda é tempo de integrar e deslanchar as potencialidades deste setor, obviamente conectadas com os demais. Não faz sentido, por exemplo, nossos 500 mil empregos diretos e indiretos serem alimentados por proteínas e carboidratos produzidos em regiões distantes de Manaus, isto é, uma alimentação quase toda vinda de fora quando temos potencialidades e diversidade de produção regional?.
É lenda dizer que o solo da Amazônia é desaconselhável ao cultivo. Muito pelo contrário, além de sol, água e terra rica em nutrientes, temos tecnologias robustas nas instituições de ensino e pesquisas atuantes na região. Falta vontade política e adesão dos atores locais. A fruticultura de Rio Preto da Eva e de Itacoatiara, a pesca artesanal e a piscicultura organizada em diversos municípios são prova disso
Borracha, malva e juta
Desde o II Ciclo da Borracha, encerrado com a ll Guerra Mundial, fomos obrigados a criar soluções alternativas ao fim da prosperidade gerada pelo extrativismo da seringueira. Foi o caso da cultura da juta e da malva, como fibras destinadas à manufatura têxtil. Entretanto, outras atividades agrícolas e agroindustriais estão igualmente presentes no cardápio de nossa sobrevivência e na perspectiva do desenvolvimento do interior.
Quando em 1956, foi inaugurada a refinaria de Manaus, isso resultou de um crédito a sua aliado da produção de 50 unidades industriais em Manaus e no interior de beneficiamento dos produtos naturais. Indústria e Comércio seria o mais robustos se os setores do agronegócio e da agroindústria tivessem crescido concomitantemente.
Reflorestamento inteligente
Na Conferência das Partes de 2021, ocorrida na Escócia, o Amazonas, através da FAEA, apresentou um projeto de domesticação da castanha-no-Brasil, iniciada, coincidentemente nos primórdios da entidade. Trata-se do projeto da Agropecuária Fazenda Aruanã, que fora iniciado nos anos 70 com finalidade pecuária no município de Itacoatiara.
Em pouco tempo, porém, este projeto, que padecia de suporte tecnológico, mostrou-se inviável, levando seus indutores, a família Vergueiro, a reflorestar a área com cultivo de castanheiras, pupunheiras, entre outras espécies regionais de alto valor comercial. Um reflorestamento inteligente. Naquela ocasião, existiam 8 serrarias para produção de lâminas de compensado para exportação no município. E essas empresas eram obrigadas a plantar dez árvores para cada unidade abatida com fins industriais. Como resultado, a área removida foi reflorestada e hoje conta com mais de 1,5 milhão de indivíduos plantados com tecnologia regional.
Que lições essa história propicia?
São muitas. A primeira delas é de que a floresta precisa ser objeto prévio de estudos para definir suas fragilidades e potencialidades. A isto se dá o nome de Zoneamento Econômico e Ecológico da Amazônia. No caso da Agropecuária Aruanã, desde o começo, estão presentes os institutos de ensino e pesquisa de toda Amazônia e alguns de São Paulo como a ESALQ-USP de Piracicaba e IAC de Campinas, referências de Ciências Agrárias do Sudeste do Brasil. Outra lição é a consideração do saber tradicional. Há muita ciência a ser identificada nas tradições agrícolas de nossos antepassados neste relacionamento entre Natureza e Cultura.
Os seringais da Amazônia, dizem os estudiosos, foram implantados pela cultura regional dos povos originários. Não se constituíram por geração espontânea como pensávamos. Ou seja, são tecnologias que ajudam as tribos indígenas a enfrentarem os desafios naturais de sobrevivência na mata. Para quem não sabe, o guaraná em pó é fruto da tecnologia milenar da etnia Sataré – Mawé, do baixo Amazonas, onde eles desidratavam o fruto para ter alimentação energética no período das enchentes quando a proteína é escassa na região. Exemplos desses saberes não nos faltam.
Estudar, amar e se comprometer com a Amazônia
Os escoceses e as nações, presentes na Conferência das Partes em Glasgow, 2021, conheceram, através de Sérgio Vergueiro e Muni Lourenço, associado e presidente da FAEA, respectivamente, o que significa empreender na Amazônia. Em outras palavras, é preciso estudar, amar, se comprometer, trabalhar em mutirão, e manejar com sabedoria e responsabilidade os recursos naturais em favor do tecido social, dentro do conceito universal de sustentabilidade, visando a construção justa e equitativa da prosperidade geral. Viva a
FAEA-69, vida longa a agricultura sustentável da Amazônia. Parabéns e louvor aos heróis que fazem a história de lutas da Agricultura no Estado do Amazonas.
Nelson é economista, empresário e presidente do sindicato da indústria Metalúrgica, Metalomecânica e de Materiais Elétricos de Manaus, conselheiro do CIEAM e vice-presidente da FIEAM.
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