Com relação à ZFM, permanece o problema fundamental da sua insegurança jurídica, também antigo e não equacionado, embora já haja proposta que tenta resolver a questão. Tal proposta foi apresentada às várias entidades de classe do Amazonas, mas ainda não foi apreciada.
Por Juarez Baldoino da Costa
A Zona Franca de Manaus pode acabar por várias razões, menos pelo decreto 10.979 e por sua expressão aritmética. Narrativas no caminho inverso anunciam, sem ainda divulgar seus fundamentos, as supostas consequências danosas da redução do IPI do decreto para a ZFM, variando conforme a visão e o lugar que ocupam os falantes.
Por lógica, até 24 de fevereiro de 2022, um dia antes do decreto, não havia interesse na importação ou fabricação fora da ZFM de vários artigos nela produzidos porque estes artigos teriam que pagar 100% da alíquota do IPI contra zero da ZFM, Imposto de Importação 8 vezes maior do que o da ZFM, ICMS duas vezes maior do que o da ZFM, PIS e COFINS 2,5 vezes maior do que da ZFM e IR sobre o lucro 4 vezes maior do que o da ZFM. A partir de 25/02/22, data do decreto, por lógica, este desinteresse continua.
É este conjunto de redução de tributos o motivo pelo qual as empresas resolvem por livre iniciativa produzirem em Manaus, e desde que os benefícios absorvam o custo de logística que é maior na ZFM. Este mesmo conjunto inviabiliza a produção ou a importação destes artigos fora da ZFM por não poderem concorrer com os seus preços. O preço de venda de produtos produzidos na ZFM comparado com os preços que seriam praticados para os mesmos produtos se produzidos fora dela, dependendo do produto, pode ser menor em torno de 20% a 40% em razão do conjunto de incentivos fiscais.
As alíquotas do IPI no Brasil que estavam na faixa de 8% a 35%, por exemplo, com a redução de 25% a partir de 25 de fevereiro, passam para a faixa de 6% a 26,25% de tributação. Por este motivo, os artigos fabricados fora da ZFM que eram vendidos por exemplo a R$ 108,00 (R$ 100,00 do fabricante mais 8% de IPI) deveriam ser vendidos agora por R$ 106,00 (R$ 100,00 do fabricante mais 6% do novo IPI). O fabricante ainda poderá até manter os mesmos R$ 108,00, já que o decreto não o proíbe, incorporando a redução do imposto ao seu lucro. Os importados seguem a mesma lógica. Os R$ 106,00 comparados aos R$ 108,00 proporcionam uma redução de 1,9%, insuficiente para superar a vantagem de 20% ou 40 % hoje existente. Esta redução é naturalmente maior para os produtos com alíquotas maiores de IPI.
Portanto, aritmeticamente, a partir de 25/02/2022 nenhum fabricante tem motivo para deixar a ZFM por este decreto.
O caso da fábrica da Heineken que anunciou em 04 de março/22 a saída da ZFM, certamente foi uma decisão anterior ao decreto, dado que o mesmo foi publicado na sexta-feira de carnaval já no início da noite, e as tratativas da empresa necessárias para efetivar a mudança teriam grande dificuldade em serem conduzidas durante o período carnavalesco. Além disto, investidores industriais não se precipitam em casos como o do decreto, e não o fazem em tão poucas horas, mesmo porque podem haver alterações no texto que não mais justificassem a saída da empresa.
Não parece razoável que a empresa tomaria decisões com base na fragilidade da situação. Para os insumos que as fábricas de fora da ZFM de Manaus compram de fabricantes da ZFM para produzirem seus produtos acabados, o crédito de IPI será reduzido nos mesmos percentuais equivalentes, o que ainda não viabilizaria a compra destes insumos de fábricas de fora da ZFM.
Os produtos da ZFM, por serem isentos de IPI, não terão qualquer alteração em seus preços. O Jornal do Commércio publicou dia 1º de março de 2022 à página A2, um texto deste autor com os números que pretenderam dar a dimensão numérica do assunto, considerando não somente o IPI mas também os demais fatores de custo. Os dados base estão à disposição de interessados.
Um eventual novo decreto que modifique a redução merecerá nova análise.
O fato relevante do decreto, além de que o próprio não produz nenhum problema para a ZFM, é que sua interpretação desencadeou uma rediscussão antiga e ainda não conclusiva sobre o futuro da economia do Amazonas, principalmente do interior, após várias tentativas de vários governos até então com resultados ainda pouco expressivos e naturalmente em velocidade inferior ao que seria desejável.
Com relação à ZFM, permanece o problema fundamental da sua insegurança jurídica, também antigo e não equacionado, embora já haja proposta que tenta resolver a questão. Tal proposta foi apresentada às várias entidades de classe do Amazonas, mas ainda não foi apreciada.
Estas questões são as mesmas de longa data e já eram vigentes em 24 de fevereiro, antes do decreto, e apesar de cruciais, não ocuparam a agenda política com a ênfase e a rapidez que se deseja; o decreto do dia seguinte inocentemente revelou que o grau de prioridade dado à estes temas diverge da agenda real em curso, relegando os interesses prioritários do estado a um segundo plano. Saíram da gaveta várias cartas e declarações repetitivas que até trataram de temas importantes e antigos, e que poderão, quiçá, terem aproveitamento objetivo, mas evitaram demonstrar numericamente as narrativas sobre o decreto.
Se o decreto for revertido ou excepcionalizar os produtos da ZFM, o assunto deve sair da pauta em breve, e a agenda normal deve ser retomada, morna como o mormaço amazônico.
O decreto foi bom: não atrapalha a ZFM e pode despertar a quem de direito e obrigação para buscar os resultados esperados pelo caboclo amazonense.
Despertar é acordar.
Acorda Amazonas!
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