Os projetos de geração de créditos de carbono estão cada vez mais alinhando a preservação ambiental com o impacto social
Por Naiara Bertão — Para Prática ESG, de Bujari (Acre)
Os projetos de geração de créditos de carbono estão alinhando a preservação ambiental com o impacto social. Em terras públicas com comunidades indígenas e quilombolas, os processos para conseguir o aval de certificadoras internacionais exigem ritos de engajamento e aprovação conjunta de ações – sem isso, nada de crédito. Mesmo em propriedades particulares, cobeneficiar as pessoas que vivem ao entorno é bem visto na praça.
“Não necessariamente conta mais créditos, mas os créditos gerados têm mais valor”, comenta Felipe Viana Lima, diretor comercial da Carbonext. “Quando há ações sociais, os créditos gerados são do tipo CCB [Clima, Comunidade e Biodiversidade], que são mais caros. São também preferidos pelo mercado, porque a ideia é que esses créditos conseguem gerar uma preservação de mais longo prazo”, completa.
Veja video: Mercado de carbono
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Considerando que para viabilizar uma geração de carbono é preciso ter uns bons milhares de hectares, e que só quem já tem dinheiro consegue viabilizar a ideia, cuidar dos que não têm a mesma oportunidade é vista como uma ação de responsabilidade social. Além disso, há uma lógica financeira por trás: engajar as comunidades é imprescindível para manter a floresta em pé e garantir os créditos de carbono.
“Parte das ações para diminuir a pressão do desmatamento em propriedades privadas é fortalecer o relacionamento com o entorno”, comenta Francy Nava, gerente de projetos REDD+ na Carbonext. Ela explica que durante o processo de prospecção e análise de viabilidade de um projeto, uma equipe vai a campo identificar os agentes do desmatamento (que pode incluir comunidades) e as fragilidades de quem vive no raio de 20 quilômetros. Quando o projeto se mostra viável, o time começa uma relação com os representantes e líderes locais para, então, fazer o diagnóstico socioeconômico daquele lugar.
“Após o diagnóstico é que começamos a desenhar como conseguiremos construir de forma participativa meios de fortalecer o conhecimento local, de levar saúde, educação e outras coisas, dependendo do que o diagnostico aponta; essa é característica do projeto que não é assistencialista”, explica Nava.
No HIWI REDD+, administrado pela Carbonext e que engloba quatro fazendas em Bujari (Acre), nos dois anos de desenvolvimento do plano de ação foram feitas visitas a moradores para explicar o que é geração de crédito de carbono e anotar as prioridades. Até agora, 158 pessoas já tiveram acesso à prevenção na saúde, 59 pessoas passaram por treinamentos e cinco comprovadamente tiveram aumento de renda. A renda, inclusive, é o calcanhar de Aquiles na maioria dos locais.
No Projeto de Assentamento Dom Moacir, uma das 18 comunidades contempladas pelo HIWI, visitada pela reportagem, a produção de verduras é pequena e os custos para manter o solo fértil e longe de pragas, só crescem. Além disso, na hora de vender a mercados da região, concorrem com atravessadores, que compram de diversos locais e garantem volumes maiores. A descrença com relação a promessas feitas por empresários e políticos no passado – e nunca cumpridas – confere um desafio extra ao time do HIWI.
Projetos que são bem sucedidos neste tipo de engajamento ainda são minoria. Como demoram mais tempo para ficarem de pé e são mais complexos, a oferta ainda é baixa, comparada ao potencial de demanda por créditos de carbono gerados com esse enfoque. “A busca por cobenefícios socioambientais é uma tendência entre empresas no mercado.
Há iniciativas que demonstram a crescente preocupação de empresas, brasileiras ou com forte atuação aqui, com aspectos sociais no desenvolvimento de projetos de carbono”, comenta Laura Albuquerque, gerente de consultoria da WayCarbon, ao citar o estudo Oportunidades para o Brasil em mercados de carbono em 2021.
Texto publicado originalmente em O VALOR
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