A nossa intenção não é se meter em outros biomas e em outros setores. Estamos apenas colaborando com amigos enquanto tentamos dominar o método para estimar a troca gasosa com plantas mais leves do que árvores.
Alfredo Lopes entrevista Niro Higuchi
Brasil Amazônia Agora: A questão climática e ambiental não pode reproduzir o modelo demagógico do nós contra eles. O momento exige bom senso e colaboracionismo. Qual é a contribuição das pesquisas do INPA para expandir a dinâmica e alternativas de neutralização do carbono??
Niro Higuchi: Infelizmente, no Brasil esse modelo demagógico do nós contra eles não será erradicado tão cedo, em todas as áreas e setores. No entanto, o mundo da pesquisa científica não pode embarcar nesse modelo. O avanço da ciência depende de dúvidas levantadas e dos contraditórios obtidos em campo e em laboratório. Em relação à mudança do clima da Idade Contemporânea, esse modelo nem sequer pode ser cogitado. As consequências dessa mudança, ainda que sejam cercadas de altas incertezas, vão atingir a todos, sem exceção.
O momento exige trabalho com foco e sem ideologias. O momento é fazer convergir as divergências científicas a um foco comum, que é o entendimento das nossas vulnerabilidades em relação à mudança do clima e se preparar para adaptações. No caso do laboratório de manejo florestal do INPA, nós consolidamos métodos para estimar os estoques (carbono e água) das árvores e as diferenças desses estoques com o passar do tempo. Estamos tentando estimar a capacidade de troca gasosa entre a floresta e a atmosfera para manter esses estoques.
BAA: Como se dá a troca de carbono com a atmosfera no universo de plantio e crescimento da lavoura?
Niro: A planta clorofilada produz o seu próprio alimento (carboidratos) por meio do processo de fotossíntese e respiração. A fotossíntese nada mais é do que a utilização (pela planta) da energia solar para transformar a água e o CO2 atmosférico em glicose (carboidrato) e liberando o oxigênio; a respiração promove a liberação da energia para a planta. A base da lavoura é a planta clorofilada (arroz, feijão, soja, café, milho, capim etc.). A melhor resposta para essa pergunta seria: para onde iria o CO2 atmosférico e a energia solar se não houvesse a planta clorofilada utilizada na lavoura?
BAA: Já sabemos a diferença entre os benefícios climáticos do reflorestamento em comparação com a agricultura extensiva?
Niro: Não o suficiente. Primeiro, nós temos que focar na capacidade de remoção de CO2 da atmosfera pelas plantas clorofiladas utilizadas no reflorestamento e na agricultura. Em geral, só falamos em emissões. Um inventário de emissões de gases de efeito estufa é composto de emissões e remoções. A comparação entre reflorestamento e agricultura não é pedagógica porque os produtos são diferentes, ainda que ambos sejam de primeira necessidade. Além disso, a prioridade é estimar a capacidade de troca gasosa entre a atmosfera e as plantas utilizadas no reflorestamento e agricultura.
BAA: Com quais espécies e quais os resultados preliminares de sua pesquisa sobre a dinâmica do carbono na agricultura?
Niro: Para consolidar o método para estimar a troca gasosa entre a biosfera e atmosfera, nós fomos trabalhar com a soja cultivada no Cerrado baiano, numa fazenda com 7,5 mil hectares plantados. Logo após a colheita da soja, são introduzidas plantas (milheto e braquiária) de cobertura apenas como medida de conservação do solo, sem aproveitamento comercial. A nossa conclusão com base na estimativa mínima provável foi que a safra de 2020-2021 (soja e milheto) da fazenda removeu 50.127 tC ou 183.800 tCO2eq.. Considerando a emissão per capita no Brasil igual a 10,41 tCO2eq. (segundo o Observatório do Clima), essa remoção representa a mitigação de emissões de 17.656 brasileiros. Estamos também trabalhando em uma plantação de café no cerrado mineiro. A nossa intenção não é se meter em outros biomas e em outros setores. Estamos apenas colaborando com amigos enquanto tentamos dominar o método para estimar a troca gasosa com plantas mais leves do que árvores.
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