Se colocarmos, monoliticamente, os objetivos da política econômica numa única trajetória de equilíbrio fiscal expansionista, poderemos ficar com a sensação de que, no meio do caminho, voltamos ao marco zero de nossa caminhada e, como disse Alice, “a gaveta da alegria já está cheia de ficar vazia”.
Paulo Roberto Haddad
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Uma política econômica bem concebida e melhor implementada não deve selecionar arbitrariamente os objetivos e as metas que deseja alcançar. Em um país com profundos problemas estruturais de desigualdades sociais e regionais, com elevados níveis de subemprego e desemprego, com um imenso grupo social na pobreza e na miséria, com hiatos marcantes no seu desenvolvimento científico e tecnológico, não pode pinçar quais problemas necessitam ser equacionados ao longo do mandato presidencial. Os objetivos e as metas da política econômica se impõem historicamente aos governantes.
É muito cômodo, se não fosse ilusório, partir do pressuposto que, ao concentrar os instrumentos econômicos e os mecanismos político-institucionais no equilíbrio fiscal, as soluções para os problemas estruturais estariam encaminhadas através das forças livres de mercado. O equilíbrio fiscal é tão somente um capítulo subordinado a uma longa narrativa do processo de Reforma do Estado brasileiro.
Em 1776, no segundo capítulo do Livro Quatro da “Riqueza das Nações”, Adam Smith plantava as sementes do liberalismo econômico com a ideia da “mão invisível”. Dizia que “ao perseguir o seu próprio interesse, o indivíduo muitas vezes promove o interesse da sociedade muito mais eficazmente do que se pretendesse promovê-lo…visa ao seu próprio ganho e, neste, como em muitos outros casos, é levado como que por mão invisível a promover um objetivo que não fazia parte de suas intenções”.
Desde a concepção desse liberalismo clássico ao liberalismo iluminado do século XXI, muita água passou por debaixo da ponte. Eventos portadores de mudanças ocorreram, houve uma renovação de ideias, o contexto das forças políticas se transformou.
Pense nas respostas às seguintes indagações. Quando um grupo de indivíduos organizados ou não, na busca de seu próprio interesse, explora predatoriamente a Amazônia com desmatamentos e garimpos ilegais, estaria involuntariamente promovendo o interesse das atuais e futuras gerações da sociedade? Quando um país entra em recessão ou estagnação econômica durante quase uma década, não fazem falta as ações programáticas de uma instituição complementar aos mercados para estruturar as expectativas de um novo ciclo de expansão econômica? Quando se sabe que os mecanismos espontâneos de mercado estão reproduzindo a pobreza ao longo do tempo, de tal forma que filho de pobre tende a ser pobre na loteria da vida, não se faz ausente um planejamento de longo prazo para erradicar a miséria social?
Desde o período depois da II Grande Guerra, as respostas da sociedade brasileira vinham sendo a formatação e a execução de políticas públicas de crescimento da renda e do emprego com distribuição, inclusive com conservação e preservação do meio ambiente. Políticas concebidas em um contexto de tensões e conflitos de interesses, mas que avançavam na mesma intensidade com a qual se consolidavam as práticas democráticas de diálogos e negociações entre diferentes grupos sociais.
Se colocarmos, monoliticamente, os objetivos da política econômica numa única trajetória de equilíbrio fiscal expansionista, poderemos ficar com a sensação de que, no meio do caminho, voltamos ao marco zero de nossa caminhada e, como disse Alice, “a gaveta da alegria já está cheia de ficar vazia”.
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