Doutor em Desenvolvimento Regional, servidor público, professor da UFAM, atualmente na Coordenação do Ministério Público Estadual e sua interface com a sociedade, José Alberto Costa Machado é uma referência acadêmica, institucional e cívica na defesa da economia do Amazonas e na interiorização do desenvolvimento. Com outros especialistas, integrou o Grupo de Trabalho que formulou as linhas de trabalho da Nova ZFM, expressas no Documento Desenvolvimento Sustentável da Amazônia: diversificação produtiva e promoção da Bioeconomia a partir da Zona França de Manaus. Nessa entrevista ele conta as premissas e estratégias do texto e ressalta a necessidade de mobilização da população, para debater, sugerir, consolidar e defender a instalação do novo formato da ZFM, o maior acerto fiscal da redução das desigualdades entre o Norte e o Sul do Brasil. Confira.
Alfredo Lopes
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1- Follow Up – Você integrou a equipe responsável pela proposta da Nova Zona Franca de Manaus. Quais são os avanços dessa proposta?
JOSÉ ALBERTO COSTA MACHADO – Essa proposta emergiu de ampla e profunda discussão efetivada no âmbito do “Grupo de Trabalho GT-Pós Pandemia”, uma iniciativa da entidades empresariais do Amazonas, que mobilizou a participação da sociedade civil, do poder público e de especialistas de diversas áreas de conhecimento. Coordenado pelo experiente empresário Marcilio Junqueira e construído sob a excelente e fundamentada perspectiva técnico-acadêmica de Márcio Holland, eminente pesquisador e professor da Fundação Getúlio Vargas, Augusto César Barreto Rocha e Rodemarck Castelo Branco, ambos professores universitários, empresários bem sucedidos e respeitados conhecedores dos desafios do Amazonas.
Penso que o principal avanço, provisoriamente chamado de Nova ZFM, se deu com a formulação de uma proposta, consensual e bem fundamentada, com rumos assertivos para sua efetivação. Sob o título de Desenvolvimento Sustentável da Amazônia: diversificação produtiva e promoção da Bioeconomia a partir da Zona França de Manaus, seu conteúdo trata do diagnóstico, dos desafios a serem enfrentados, das medidas para avançar, da diversificação produtiva, do papel da Bioeconomia, das fontes de financiamento, de uma nova governança para a ZFM, das oportunidades entrevistas no cenário nacional e internacional, etc. Diria que trata-se de uma verdadeiro “mapa do caminho” para um novo tempo.
2. Fup – Existe um volume aproximado de R$ 2 bilhões/ano, pagos pela indústria, destinados à diversificação e regionalização da economia. Como viabilizar a proposta de gestão no programa da nova ZFM?
JACM – Esse é um aspecto bem detalhado na proposta. De fato, a ZFM gera um volume extraordinário de recursos que podem e devem ser empregados em seu aperfeiçoamento. Sem referir-me à escala bilionária dos tributos estaduais, federais e municipais que são arrecadados como frutos das atividades econômicas engendradas pelo programa, há um conjunto de fundos que foram criados, teoricamente, para aperfeiçoar, diversificar e regionalizar a economia do estado. Trata-se do FTI (Fundo de Fomento ao Turismo, Infraestrutura, Serviços e Interiorização do Desenvolvimento do Amazonas), FMPES (Fundo de Fomento às Micro e Pequenas Empresas), fundo para o ensino superior em favor da UEA (Universidade Estadual do Amazonas). Juntos arrecadam valores que compõem as cifras mencionadas na pergunta. E ainda tem outros quase R$1,0 bilhão gerados pelas empresas fabricantes de bens de informática na forma de contrapartidas em P&D. Precisamos imprimir governança competente destes recursos, de acordo com o que dizem os respectivos expedientes legais. Não mais que isso. Basta seguir a Lei – aliás, muito bem sedimentada – e assegurar o funcionamento de cada Conselho gestor.
3. Fup – Falando de PPB, os Processos Produtivos Básicos, um manual de controle ilegal. As empresas esperam até 12 anos para ver seus projetos aprovados por Brasília. Como mudar essa excrescência jurídica e burocrática?
JACM – Quando foi proposto, no início da década de 90, o PPB fazia sentido e apresentava-se como alternativa moderna de ordenamento da atividade industrial. Porém, aos poucos, ele foi deixando de ser um instrumento de política industrial para aperfeiçoar a ZFM e se transformou em mecanismo de controle político para os avanços do programa. A mudança tem dois caminhos. O primeiro é a proposição de um novo instrumento para a gerir as condicionantes na instalação de investimentos na ZFM. Creio que os técnicos da Suframa têm estudos nesse sentido e uma das opções é utilizar o “valor adicionado” como critério para mensurar a adesão dos empreendimentos às premissas da concessão dos incentivos. O segundo caminho é uma atuação mais assertiva das entidades empresarias, para buscar a responsabilização legal dos agentes públicos responsáveis essa imoral procrastinação. Se tivessem que responder perante os tribunais, garanto como não tratariam com tanta desfaçatez esses verdadeiros embargos que fazem contra o desenvolvimento da ZFM.
4. Fup – Que mecanismos, utilizando as atribuições dos ministérios públicos estadual e federal, poderiam ser mobilizados para que os recursos de Micro e Pequenas Empresas e Turismo e Interiorização do Desenvolvimento, recolhidos pelas empresas da ZFM sejam aplicados de acordo com a lei?
JACM – Fundos e Contribuições da Indústria precisam ser aplicados conforme a Lei. É simples compreender, aceitar e cumprir esse mandamento fundamental. Penso que se as entidades empresariais ou outras da sociedade civil organizada fizerem essas demandas essas instituições públicas terão que agir. Acho que a sociedade precisa ter mais protagonismo, ser mais ativa na defesa da ZFM e dos mecanismos para fortalecê-la. Afinal, decorre da ZFM a base de sustentação da economia do Amazonas e grande parte da Amazônia e do Brasil. O assunto diz respeito à nossa sobrevivência, emprego e renda. Não se pode virar as costas para algo tão decisivo.
5. Fup – É uma obviedade dizer que a proposta da nova Zona Franca de Manaus precisa da chancela da sociedade. Como assegurar este envolvimento civil?
JACM – Divulgação, divulgação, divulgação. O compartilhamento da proposta com os grandes veículos de comunicação nacional e internacional, peças de marketing bem produzidas e com mais constância nas grandes redes de TV, a publicação de artigos em revistas científicas, o compartilhamento com deputados federais e senadores, com autoridades do executivo e do judiciário. O envio do documento para entidades de economistas, de empresários, de juristas, etc.
Por fim, mais fundamental, apresentar a proposta formalmente para as instâncias da República que têm algum papel nos rumos da ZFM, como a Presidência da República, o Conselho da Amazônia Legal, o Ministério da Economia. Mas não apenas apresentar e sim, também, requerer respostas, demonstrar a seriedade e a relevância deste programa de acertos na redução das desigualdades regionais.
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