Por Ana Conceição, Valor — São Paulo, publicado em 17/09/2020
Num mundo em que a pauta ambiental ganha espaço entre a sociedade, governos, empresas e mercado financeiro, o mau uso e a destruição da Amazônia são um dos graves problemas estratégicos que o Brasil terá que resolver nos próximos anos, afirma Ricardo Abramovay, professor de Ciências Ambientais da USP e um dos maiores especialistas brasileiros no tema.
“Usamos uma parte importante no nosso território, que é a Amazônia, mas também o Cerrado e a Caatinga, sob a base da destruição ou de uma produção de riqueza muito precária”, afirmou Abramovay durante a Live do Valor desta quinta-feira. “Este é um dos mais graves problemas estratégicos que o Brasil tem que resolver nos próximos dez anos.”
Na Amazônia, o Brasil precisa ir além da ótica extrativista diante do potencial econômico da floresta. “Nosso desafio é fazer com que uma parte importante da Amazônia seja conservada, regenerada e seja fonte de riqueza de inovação, de aplicação de ciência e tecnologia. Há todo um campo de conhecimento a ser explorado”, diz.
Com 50% da mata em tese preservada por parques nacionais e reservas, o Brasil poderia ser um líder da chamada biodiplomacia, algo que já foi incorporado à agenda da União Europeia e deve ganhar força num eventual governo Joe Biden, candidato à presidência dos Estados Unidos que abraçou o chamado Green New Deal. Trata-se de uma série de propostas econômicas para ajudar a combater a mudança climática, entre outros pontos, como melhorias no sistema de saúde e educação.
A vitória de Biden pode dar força ao movimento de preservação aos chamados serviços ecossistêmicos, como produção de água, regulação do clima, preservação do solo. Estudos mostram que a destruição desses serviços providos pela natureza pode levar o lucro das 500 maiores corporações americanas a zero, diz Abramovay. Na agricultura, o caso é ainda mais grave. “Isso deixou de ser papo de ambientalista e está incorporado aos cálculos de bancos e seguradoras”.
É essencial que o Brasil acompanhe esse movimento, que também já movimenta China e Índia. “A palavra mais importante no mundo hoje é biodiversidade. Empresas e organizações estão cada vez mais atentos a isso”, afirma. Ele chama atenção para as iniciativas do setor privado brasileiro no sentido de preservar a floresta, como o recente anúncio de Bradesco, Itaú e Santander. Os bancos lançaram um plano integrado para contribuir com a conservação e desenvolvimento sustentável da floresta.
Para Abramovay, está surgindo uma frente de proteção à Amazônia. Sociedade, empresas, ONGs, o setor financeiro, a diplomacia internacional, afirma, estão formando um arco de forças que vai contra as políticas atuais do governo brasileiro, diz. “São políticas destrutivas, que dão aos dirigentes governamentais a liberdade de responder que a Amazônia não está sendo destruída. Quem pode levar a sério uma resposta dessas? Felizmente, temos gente séria na comunidade trabalhando no sentido contrário a isso.”
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