Uma pergunta desconcertante ficou parada no ar nesta última quarta-feira, na reunião ordinária dos associados do CIEAM, por ocasião do debate sobre a escassez crônica de servidores federais na fiscalização diária nos portos de Manaus, fonte de graves prejuízos às empresas que dependem do desembaraço de mercadorias: por que as empresas não denunciam abertamente o desinteresse federal na relação deste problema histórico? Fosse este o único descaso, teríamos motivo de fazer um festejo extraordinário para celebrar mais um ano do modelo Zona Franca de Manaus. Com toda certeza não é. Em quase meio século de existência, é preocupante o enfraquecimento crescente, imposto à ação institucional da Suframa, e por consequência a própria ZFM, em detrimento da defesa e encaminhamento das questões cruciais que envolvem a estrutura e o funcionamento do modelo de desenvolvimento aqui implantado.
Prorrogação do descaso
O poder de decisão da autarquia se reduz em vários níveis, oportunidades e definição de rumos. E é visível que se esvazia a capacidade e a autonomia do órgão no encaminhamento dos problemas enfrentados pelas empresas. A falta de fiscais, que obriga custos adicionais de armazenagem portuária, é um problema residual no conjunto dos embaraços que impedem a dinâmica produtiva, o adensamento do modelo, a regionalização de seus estabelecimentos produtivos e benefícios. O confisco de verbas para fazer funcionar a Suframa remete a outra questão mais instigante: por que não recorrer à justiça para brecar essa ilegalidade? É bem verdade que outros segmentos da esfera federal que atuam em Manaus padecem da mesma agonia e descaso. À luz da relevância institucional da Superintendência, porém, é eloquente refletir sobre o significado do frequente embargo e recentes vetos do GTPPB, o Grupo de Trabalho dos ministérios de Desenvolvimento, Indústria e Comércio e Ciência e Tecnologia. Temos sido omissos em repudiar ou acionar na justiça a não liberação de itens que já são produzidos em Manaus, sem incentivos, e que são importados historicamente no resto do país. É preocupante o silêncio obsequioso da Suframa a respeito. Trata-se de um desacato frontal à Constituição do país e de anuência a um dano que ganha jurisprudência descabida e com implicações imprevisíveis, portanto inquietantes e assustadoras.
Suframa: agência ou cartório?
Criada para gerenciar o modelo de desenvolvimento fundado na renúncia fiscal e consolidado como fonte generosa de exportação de recursos para a União, cabe perguntar a que se destina a autarquia senão assegurar a distribuição criteriosa de incentivos na promoção do desenvolvimento? E como justificar que temos assentido, nos últimos anos, com esta conduta e tratamento, que confirma o crescente esvaziamento de sua função promotora de investimentos/desenvolvimento e transformação num cartório de permissões burocráticas? Os recentes episódios, que confirmam o esvaziamento do CAPDA, o comitê que avalia e define a gestão e distribuição das verbas de Pesquisa & Desenvolvimento, confirmam o risco de concordância com o boicote explícito vital a um novo patamar de agregação de valor para o modelo ZFM. Estamos abrindo mão da competitividade e diversificação do setor produtivo local? A última reunião do CAPDA, em novembro último, última e única de 2014, repete e reprisa, ano a ano, a persistência do descaso, indicador dessa falta de visão estratégica e de ausência de priorização do interesse regional.
O divórcio entre discurso e conduta no oba-oba da prorrogação, se repete no paradoxo entre coleta e gestão dos recursos para P&D&I, Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação para a Amazônia. De camarote, até quando vamos engolir decisões equivocadas, obscuras, perdulárias entregues à incúria e descompromisso de resoluções de gabinetes, da centralização burocrática de Brasília, que se atribuem a habilidade de conhecer as reais necessidades da região, ou definir o que fazer com os recursos que, por Lei Maior, lhe pertencem? Voltaremos?
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Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM.
Editor responsável: Alfredo MR Lopes. [email protected]
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