Em Ofício enviado ao Procurador-Chefe da Procuradoria da República do Amazonas, Edmilson da Costa Barreiros Junior, o Tribunal de Contas da União, através do Ministro-Relator Marcos Benquerer Costa encaminha Relatório de Levantamento de Auditoria realizado no âmbito do tema “Desenvolvimento” com recorte da Região Norte, cujo objetivo específico foi obter uma visão ampla e abrangente da situação geográfica e econômico-social do Estado do Amazonas. Extremamente coerentes com todas as análises, discussões, denúncias sobre as ilegalidades que estão esvaziando o modelo ZFM, contidas nesta Coluna as anotações do TCU foram precedidas de um mapeamento dos desafios enfrentados pelo Amazonas, dentro de um workshop intitulado FiscNorte, que sistematizou dados coletados em entrevistas de questões abertas; benchmarking; revisão documental; revisão legal; ponto focal; análise swot; mapa de risco; diagrama de verificação de risco; coleta de dados financeiros; indicadores de desempenho; aplicação de questionário; cotejamento entre os planos federais e estaduais e destes como resultado das pesquisas/entrevistas com especialistas. Eis alguns resultados referentes ao Amazonas
Os embaraços e paradoxos do desenvolvimento
1. Acerca das características daquele estado, a coleta de dados mostrou que os indicadores econômicos e sociais ainda estão abaixo da média nacional, apesar dos diversos planos desenvolvidos para a integrar as regiões. A seguir, cumpre destacar alguns números e análises efetuadas; 2. O Amazonas é o maior estado do Brasil detém, de acordo com dados do Ministério do Meio Ambiente, 92,84% de sua cobertura florestal preservada, possui um dos mais baixos índices de densidade demográfica do pais (2,23 habitantes/km’) e uma distribuição populacional desigual pelo território, observando-se que a população da capital de Manaus, em 2010, correspondia a 85% da população metropolitana; 3. Os indicadores de desenvolvimento socioeconômico são inferiores à média nacional, valendo citar que a expectativa de vida ao nascer, em 2012 e 2014, foi aproximadamente 3,5 anos menor do que a da média nacional e a taxa de mortalidade infantil, o dobro da considerada aceitável pela Organização Mundial de Saúde (OMS); 4. Apenas 64,56% da população do Amazonas possui acesso adequado à rede de água e somente 26,7% dos domicílios têm coleta de esgoto; 5. O índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) em 1991, 2000 e 2010 indica que, ao longo de duas décadas, houve significativa melhoria do índice em algumas regiões ao sul e ao leste da região norte e na hinterland da Amazônia, mas alguns municípios ao oeste ainda se encontram em condição de baixo IDHM e parcela significativa da população vive abaixo da linha de pobreza; 6. O mapa da distribuição espacial do desmatamento acumulado na Amazônia em 2012 comparado ao mapa de IDHM indica que áreas de desmatamento coincidem com bons níveis de IDHM, induzindo-se que o modelo de desenvolvimento adotado no chamado “Arco do Fogo” pode estar trazendo melhores níveis de progresso social e humano, à custa de um passivo ambiental: 7. A taxa de desmatamento de 2015 foi, pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (lnpe), em Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite, estimada com um aumento de 16 em relação a 2014; 8. O Amazonas tem participação de 1,6 do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, ocupando a l S” posição no ranking nacional; 9. O percentual de recursos financeiros disponibilizados ao Estado do Amazonas (1,87%) guarda proporcionalidade com o percentual de habitantes em relação ao país (1,88%) ao longo dos exercícios de 2012 a 2014.
Principais desafios
Diante de todo esse contexto, a Secretaria de Controle Externo Secex/ AM mapeou os principais desafios a serem enfrentados pelo ente federado em questão, dando atenção à temática do desenvolvimento econômico e social nas dimensões: institucional, gestão ambienta, atividades produtivas, infraestrutura econômica, desenvolvimento social e tecnologia e inovação, sempre considerando indicadores oficiais de forma a legitimar as constatações e análises resultantes. Para cada um desses eixos, foram identificados os riscos ao desenvolvimento e, levando-se em consideração os trabalhos já realizados ou em andamento no âmbito deste Tribunal, foram definidas propostas de ações de controle:
1. Do ponto de vista institucional, do exame de respostas a ofícios enviados ao Ministério da Integração Nacional, ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG) e à Secretaria de Assuntos estratégicos. Foi identificada a falta de acompanhamento dos resultados dos planos voltados para o desenvolvimento regional, bem corro a ausência de interação entre eles. 2. Em trabalho de minha relatoria, apreciado por esta Corte de Contas há oito anos, nos autos do TC 019.720/2007-3, já havia sido apontado achado relativo à ausência de coordenação institucional em ações do Governo Federal para a Amazônia. Todavia, após o transcurso de todo esse tempo, ainda não se verificou progresso em relação a medidas que garantam a eficácia das políticas direcionadas para o desenvolvimento regional sustentável do Estado do Amazonas. 3. É essencial que diferentes áreas de atuação dos órgãos federais sejam compatibilizadas, com ações coordenadas, com melhor integração entre os diversos planos e órgãos, de forma a assegurar a otimização dos escassos recursos públicos e minorar a superposição de esforços. 4. Nesse sentido, seria interessante que um órgão assumisse efetivamente o papel de coordenador da governança territorial e que, dotado dos meios necessários para sua atuação, implementasse os diversos planos de caráter macrorregional e sub-regionais existentes. 5. Em relação à gestão ambiental, foram levantados dois pontos de risco: a ausência de conclusão do Zoneamento Ecológico-econômico (ZEE) e o saneamento básico inadequado. 6. O ZEE é um instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente cujo objetivo é viabilizar o desenvolvimento sustentável partindo do diagnóstico dos meios físicos, socioeconômico e jurídico-institucional e do estabelecimento de cenários exploratórios para a proposição de diretrizes legais e programáticas para cada unidade territorial. 7. A partir do diagnóstico a ser efetivado, será possível, por exemplo, identificar oportunidades de realização de atividades produtivas sustentáveis que agreguem valor aos produtos regionais com potencial exportação e, que, consequentemente, contribuirão para a geração de emprego e renda. Também será possível interiorizar o desenvolvimento pela identificação de novas áreas com potencial para a produção de energia, favorecendo sub-regiões por sistemas isolados. 8. No Amazonas, o processo de elaboração do ZEE iniciou-se em 1996, como primeiro prazo para conclusão definido em julho/2012, pela Lei Estadual 3.417/2009. Todavia, a Secex/AM alertou que, além de o estudo não ter sido finalizado, não há indícios de que isso ocorra dentro do prazo de cinco anos estabelecido pela Lei Federal 12.651/2012 (novo Código Florestal), visto que a maior parte do território do Amazonas está pendente de zoneamento. Há, assim, necessidade de que, tanto o Ministério do Meio Ambiente quanto o Governo do Estado do Amazonas, estabeleçam metas e prazos para viabilizar a conclusão do ZEE. 9. Quanto ao saneamento básico inadequado, apontado por especialistas como um dos principais desafios a serem superados, os dados mostram que, a despeito dos baixíssimos índices, os investimentos são escassos, não alcançando 1% do investimento total brasileiro na área. Ademais, das 41 obras para saneamento básico, contidas no Programa de Aceleração do Crescimento para o estado, em junho/2015, apenas duas estavam concluídas.
Riscos a serem superados
No eixo atividades produtivas, foram indicados como principais riscos a serem superados: 1. Regularização fundiária precária, que tem como um dos efeitos a dificuldade de habilitação de empreendedores rurais ao acesso ao crédito rural, por meio de instituição bancárias; 2. Diminuição da atratividade para as empresas se instalarem no Polo Industrial de Manaus (PIM), com efeitos danosos como: potencial declínio do dinamismo econômico da Zona Franca de Manaus (ZFM), queda da arrecadação do estado, redução de repasses de ICMS para os municípios do interior, desemprego e outros; 3. A indisponibilidade de recursos da Superintendência da Zona Franca de Manaus – Suframa para implementar projetos para o fomento do desenvolvimento regional, por meio de transferências voluntárias, tendo-se observado que, com a entrada em vigor do Decreto 4.950/2004, os recursos advindos do pagamento pelas empresas do Polo Industrial de Manaus (PIM) da Taxa de Serviços administrativos passaram a ser recolhidos aos cofres do Tesouro Nacional, havendo um contingenciamento pelo governo federal de parcela significativa dos valores arrecadados; 4. Deficiência da atuação da Suframa em fiscalizar o cumprimento dos condicionantes legais para obter os benefícios fiscais por parte das empresas instaladas na ZFM; 5. Quanto à infraestrutura econômica, a equipe de auditoria identificou dificuldade para o escoamento da produção e para o tráfego de pessoas no estado e para interiorização do desenvolvimento, decorrente de fraquezas como: logística de transporte deficiente, acesso rodoviário ao estado difícil, terminais hidroviários de má qualidade, oferta de energia elétrica irregular, baixo acesso à internet no interior do estado e infraestrutura de saneamento inadequada; 6. No campo de tecnologia e inovação, foi observado que as pesquisas científicas e tecnológicas estão desvinculadas das reais demandas do mercado, ou seja, poucas desenvolvem produtos de interesse regional. Há ainda dificuldade de formar e fixar profissionais com alto nível de qualificação e de contratar mão de obra qualificada, sendo necessário incentivar pesquisadores para se estabelecerem na região; 7. COl110 visto no relatório precedente, a Lei 8.387/1991 prevê a obtenção de vantagens fiscais pelas empresas atuantes na Zona Franca de Manaus no ramo da informática condicionada à aplicação de 5% do faturamento bruto das indústrias em atividades de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), deduzidos os tributos correspondentes às comercializações; 8. De acordo com o Decreto 6.008/2006 que regulamenta o benefício fiscal concedido às empresas que produzam bens de informática na ZFM que investirem em atividades de P&D na Amazônia – estabelece que parte do recurso deverá ser destinada a entidades públicas credenciadas pelo Comitê das Atividades de Pesquisa e Desenvolvimento na Amazônia (CAPDA) na Amazônia Ocidental. Todavia, dados obtidos do sítio do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação mostram que a aplicação efetiva dos valores arrecadados não tem atingido o percentual mínimo de cinquenta por cento dos mencionados recursos, de modo que o fundo setorial criado para financiar as pesquisas pode não estar atendendo a seus objetivos; 9. Além desses riscos, cita-se também o aumento de atividades ilegais como a biopirataria, contrabando, descaminho e tráfico de drogas e armas, decorrente, em grande parte, da falta de segurança em áreas de fronteira; 10. Diante de todo esse contexto, a Secex/AM formulou propostas de recomendação e, após relacionar fiscalizações realizadas ou em andamento no âmbito deste Tribunal, realizou propostas de auditorias. 11. O TCU enfatiza que a remoção dos obstáculos ao desenvolvimento da Amazônia depende do esforço de todos e da construção de um projeto político, articulado e coordenado pelo Estado, dentro de uma lógica de governança, estruturada por meio do planejamento, da gestão e controle de políticas públicas. E, para isso, é essencial o adequado diagnóstico dos obstáculos e problemas ao desenvolvimento juntamente com políticas públicas específicas para remover empecilhos e alavancar o desenvolvimento econômico e social. O Documento integral, disponível no Portal do CIEAM, é um Acórdão, segundo o qual, “tendo em vista que não foram detectadas irregularidades nestes autos que demandem o contraditório” o TCU acolhe, com alguns ajustes, a proposta da unidade técnica e se manifesta por que seja adotada a deliberação submetida à Procuradoria Geral da República.
Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. [email protected]
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