Às vezes dá a impressão que o Congresso Nacional, ou determinados atores políticos, vivem num mundo de relações paralelas e desconectadas do cotidiano do cidadão, aquele, em nome do qual seu poder deveria ser exercido. O Brasil vive um cenário adverso, de insegurança e de encolhimento da economia, onde todos os esforços se impõem para resguardar empregos e isso se faz na manutenção dos investimentos, com criatividade e senso de oportunidade. Por isso, é extemporânea e disparatada a iniciativa do senador Paulo Rocha de apresentar nova Proposta de Emenda à Constituição que reduz para 40 horas a jornada semanal (PEC 89/15). Há ainda movimentação para um descanso de 10 minutos a cada 50 minutos trabalhados, travestindo e radicalizando a ideia do senador, com a ajuda do relógio, cuja contagem estancaria nos 50 minutos e, em vez de 8 horas por dia seriam 6.7 horas de trabalho, com 33,3 horas semanais e não as 40 horas, neste país campeão global de feriados e estratégicas emendas. Cabe lembrar que a competitividade da indústria do Brasil, açoitada por uma logística perversa e uma burocracia “infernal”, continua em penúltimo lugar no ranking global. Quando comparado a outros 14 países que são seus principais concorrentes, o país só fica à frente da Argentina na avaliação de oito fatores decisivos para as empresas conquistarem os mercados interno e externo. Desde 2012, o Brasil se mantém na mesma posição na lista que, além da Argentina, inclui Colômbia, México, Polônia, Turquia, Índia, Rússia, África do Sul, Chile, China, Espanha, Austrália, Coreia do Sul e Canadá. O professor de Relações do Trabalho da Universidade de São Paulo, José Pastore, assegura que estudos feitos e refeitos há quase três décadas, – quando a Constituição de 1988 reduziu a jornada de trabalho semanal de 48 para 44 horas – mostram: “diminuir a quantidade de horas trabalhadas não aumenta o número de postos de trabalho disponíveis, portanto, essa iniciativa não promove adição de empregos”. Pelo contrário, e isso deve ser destacado, vai funcionar a iniciativa do Governo, que permite que empresas com dificuldades financeiras temporárias reduzam a jornada de trabalho dos funcionários. Trata-se do Programa de Proteção ao Emprego (PPE), que propõe diminuir em até 30% as horas de trabalho, com redução proporcional do salário pago pelo empregador. Este Plano recebeu apoio de sindicatos e de industriais.
Um pouco de História
A redução da jornada de trabalho não é uma veleidade burguesa da modernidade. Ela é almejada desde as modalidades pré-capitalistas nos diversos modos de produção de riqueza. Já no século X a jornada no comércio e agricultura europeia se concentrava entre o nascer e o pôr do sol, sendo de aproximadamente nove horas e meia no inverno e 12 horas e meia no verão. E se no século XVIII passou a ser de 15, 17 e até 18 horas por dia, foi somente em 1847, na Inglaterra, por meio da Factory Act, que foi reduzida para dez horas diárias nas indústrias têxteis e nos moinhos. Já a jornada de trabalho de oito horas diárias foi inaugurada pelos Estados Unidos, em 1868, ainda que aplicável somente aos empregados do serviço público federal americano. No Brasil, o Decreto 1.313, de 17 de janeiro de 1891, tornou-se um marco ao fixar jornada de sete horas, prorrogável até nove horas, aos menores do sexo feminino entre 12 e 15 anos e aos menores do sexo masculino entre 12 e 14 anos. Esse decreto, ressalte-se, teve incidência somente no Distrito Federal. A jornada de trabalho foi regulada pela primeira vez no plano interno por meio de Decreto 21.186, de 22 de março de 1932, que fixou jornada diária de oito horas aos trabalhadores do comércio. A Constituição Federal de 1934 foi a primeira a prever limite para jornada, fixando-a em oito horas diárias e, consequentemente, 48 horas semanais. A Constituição Federal de 1988 reduziu a jornada de trabalho de 48 horas para 44 horas semanais. Em 1995, a jornada recuou para 40 horas semanais e aqui e ali propostas de mais redução voltam ao debate. O principal objetivo a ser alcançado com a redução da jornada de trabalho, à parte essa balela de novos postos de trabalho, é a proteção da saúde do trabalhador, lembrando que a saúde é um direito e uma garantia fundamental consagrados no artigo 6o, da Constituição Federal de 1988, e no artigo 2º, da Lei 8.080, de 19 de setembro de 1990. A redução da jornada de trabalho – os fatos já demonstraram – não gera emprego, não reduz o desemprego, mas suscita a intensificação do trabalho. No mais, ao se conjugarem políticas públicas consistentes e investimentos na formação e qualificação profissional, muito provavelmente se chegue a resultados promissores no que se refere a redução do desemprego e geração de novos postos de trabalho. E aí o debate vai ganhar outro patamar e nível.
E onde estão os brios?
De novo em pauta a escandalosa contradição dos buracos das vias do Polo Industrial de Manaus, onde a cada ano é gerada, aproximadamente, três vezes mais recursos do que aqueles representados, hipoteticamente, pela renúncia fiscal? Como proceder para abordar, numa narrativa provocante, que possa mexer com os brios dos responsáveis, constranger seus compromissos, sem a grosseria da acusação inconsequente? Nessa hora cai por terra a conversa das parcerias criativas e decisivas e das contribuições para os cofres públicos, na contrapartida dos benefícios fiscais recebidos. Depois de tantas investidas, acordos e promessas, movidas a bravatas, claques e pirotecnia, acredite se quiser, o modelo Zona Franca de Manaus não consegue equacionar o problema prosaico dos buracos de suas vias de acesso ao polo industrial. Na última abordagem à autoridade estadual nem vale a pena reproduzir as desculpas da interrupção. Dizer que o projeto de recuperação está atualizado e que a greve da Suframa comprometeu a transmissão de dados para recompor a proposta é demais. Independentemente do convenio, tanto prefeitura como estado tem obrigação, de no mínimo, promover uma operação tapa-buracos no sentido de garantir a trafegabilidade. Afina, onde está a tão badalada importância do Polo Industrial de Manaus?
Os buracos da contradição
É o caos instalado, onde União, Estado e Município atualizam Pôncio Pilatos ao lavar as mãos de suas responsabilidades. Sim, são todos integralmente responsáveis e é inaceitável as apelações e aberrações invocadas par dourar o descaso que alcança não apenas as vias de acesso para as grandes empresas, generosas contribuintes do erário, como também as comunidades que se foram agregando na área de influência das indústrias. Todos punidos pela insensatez de uma relação injusta onde o poder público, beneficiário maior do trabalho digno de quem o mantém, deveria responder com decência a empresas como a Honda, a maior empresa do Polo Industrial, veterana em contribuições e boas maneiras, tem o acesso a suas instalações, a partir da Avenida Buriti, esburacado pela omissão de quem não deveria assim proceder. Amanhã seguimos…
Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. [email protected]
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