Com uma frase para entrar nos anais da UNFCCC, o ministro do meio ambiente Joaquim Leite incorporou o espírito de seu antecessor em discurso na abertura do segmento ministerial da COP26 nesta 4ª feira (10/11). “Temos que reconhecer que, onde há muita floresta, há muita pobreza”, disse o ministro, sem se dar ao trabalho de explicar a lógica por trás desta afirmação descabida.
No fundo, a frase revela um raciocínio que está entranhado no governo Bolsonaro: o único jeito de gerar riqueza é a partir da destruição das florestas. É esse raciocínio que orienta a política ambiental do atual presidente desde antes de sua eleição, há três anos. A frase também desnuda outro argumento que está no coração da estratégia de greenwashing da gestão Bolsonaro na COP: a única maneira de o Brasil proteger a floresta é recebendo dinheiro do resto do mundo para tanto.
“Essa declaração revela que a mentalidade do governo é da década de 70 do século passado: desmatar, para eles, é sinônimo de desenvolver. Como é um governo que despreza a ciência, não conseguem aceitar que essa visão foi superada por tudo que a ciência tem mostrado”, disse o deputado Alessandro Molon (RJ) a Jamil Chade no UOL.
Ouvido por Rafael Garcia n’O Globo, André Guimarães (IPAM) classificou a fala como uma “confissão de culpa” do governo: “Essa é uma frase infeliz e desatualizada. O que acontece no Brasil é que a sociedade e o estado foram incapazes de criar as condições para poder valorizar as populações, regiões e pessoas que convivem com a floresta em pé”.
Leite não ficou apenas nas frases descabidas. Em seu discurso, o ministro foi direto nas cobranças por mais financiamento climático por parte das nações ricas, um dos pontos mais delicados da agenda de negociação em Glasgow. “A meta dos US$ 100 bilhões não foi cumprida, e este valor já não é mais suficiente para que o mundo construa uma nova economia verde com uma transição responsável”, disse.
“O cenário apresentado pelo ministro Joaquim Leite é uma fantasia. Sob Bolsonaro, todos os números de clima e meio ambiente do país retrocederam. O desmatamento e as emissões nacionais cresceram de forma consecutiva”, esclareceu Marcio Astrini, do Observatório do Clima, no Fakebook. “O mundo já não acredita em mais nada que seja dito por este governo. A agenda de clima apenas conta os dias para o fim do regime Bolsonaro”.
CNN Brasil e Valor destacaram as demandas financeiras do Brasil na COP26. Já a BBC Brasil repercutiu a recusa de Joaquim Leite em responder se o governo Bolsonaro vai ou não retirar apoio a projetos antiambientais de lei em tramitação atualmente no Congresso Nacional – como, por exemplo, os PLs da grilagem (510/2021), da mineração em Terras Indígenas (191/2020) e o do marco temporal para demarcações indígenas (490/2007).
Em tempo 1: O Brasil levou ontem seu segundo antiprêmio Fóssil do Dia nesta COP26, não só pelo triste discurso de Joaquim Leite, mas também por conta do brutal aumento nos subsídios aos combustíveis fósseis: entre 2019 e 2020, o volume de subsídios aos fósseis cresceu fantásticos 25%, chegando ao astronômico valor de US$ 22 bilhões, 10% a mais que o orçamento federal para a educação no mesmo ano, conforme mostrou um relatório recente do INESC.
Em tempo 2: Enquanto isso, no Brasil, o governo federal confirmou a indicação de mais um coronel da PM para o comando do ICMBio. O coronel da reserva da PM paulista, Paulo Marcos de Castro Simanovic, assume formalmente a presidência do instituto, o 4º na gestão Bolsonaro até agora (e o 3º coronel seguido). O ICMBio vive uma de suas crises mais graves, com estrangulamento orçamentário, redução e desmoralização de pessoal e interferência política por parte do ministério do meio ambiente. ((o)) eco e O Globo deram a notícia.
Fonte: ClimaInfo
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