Como diz o clichê, seria cômico se não fosse trágico. Na Folha, Marina Dias deu detalhes sobre uma reunião recente entre Ricardo Salles e representantes do governo dos EUA sobre um acordo entre os dois países para ajudar na proteção da Amazônia. Um detalhe chamou a atenção: um dos slides apresentados pelo ministro trazia a imagem de um cachorro sentado, abanando o rabo diante de uma máquina de frango assado, com o termo em inglês “expectativa de pagamento” na parte superior. Noves fora o ridículo da analogia (uma figura de linguagem que escapa completamente à realidade dos norte-americanos), a apresentação deixa clara a insistência de Salles com sua estratégia “pague-para-ver”, que condiciona qualquer esforço de redução do desmatamento à injeção de cerca de US$ 1 bilhão pela Casa Branca.
O Financial Times traduziu ao público anglófono a posição de Salles, que mais lembra uma extorsão, e ressaltou a frustração do governo norte-americano com a falta de avanço nas conversas. Um indício disso foi a declaração da porta-voz da Casa Branca, Jen Psaki, que confirmou para Raquel Krähenbühl (TV Globo) que Biden não espera por um acordo bilateral a tempo de ser anunciado durante a cúpula climática da próxima semana.
Enquanto isso, no outro lado do Atlântico, a União Europeia subiu o tom nas cobranças ao Brasil. Em um encontro virtual com Salles e o novo chanceler Carlos França, o comissário da UE para o meio ambiente, Virginijus Sinkevicius, reforçou que os países europeus esperam “mais ambição” da parte do governo brasileiro nas agendas de clima e biodiversidade. Sinkevicius também não economizou palavras para criticar o novo compromisso do Brasil para o Acordo de Paris: para ele, a NDC apresentada por Bolsonaro e Salles no final do ano passado “foi uma oportunidade perdida” que frustrou os parceiros europeus. Jamil Chade destacou no UOL as cobranças da UE ao Brasil. A Reuters também abordou o assunto.
Em tempo 1: Na Deutsche Welle, Alexander Busch questiona a pretensão de Salles de obter US$ 1 bilhão da comunidade internacional para combater o desmatamento na Amazônia. A cifra parece ser alta, mas ela “é uma bagatela diante do que a floresta e sua proteção poderiam valer”. Ao resumir esse esforço a uma simples “esmola”, o governo brasileiro mostra sua miopia completa no que diz respeito ao maior ativo ambiental do Brasil. “Ao pedir 1 bilhão de dólares, é como se o ministro do Meio Ambiente quisesse que o corpo de bombeiros lhe desse uma gorjeta para que este apagasse o fogo na própria casa dele. O governo tenta lucrar com o impedimento da própria catástrofe”, escreveu Busch.
Em tempo 2: A CNN informou que Bolsonaro enviou carta a Biden prometendo eliminar o desmatamento ilegal até 2030 e até conversar com “entidades do terceiro setor, indígenas e comunidades tradicionais”. Além de tocar a música que o presidente norte-americano quer ouvir, Bolsonaro toca o refrão de Salles, salientando “a necessidade de obter o adequado apoio da comunidade internacional, na escala, volume e velocidade compatíveis com a magnitude e a urgência dos desafios a serem enfrentados.” Resta saber se Biden dançará alegremente com Bolsonaro num baile de acordo climático entre os dois países ou se prevalecerão os fatos, dados e resultados.
Fonte: ClimaInfo
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