“Nós temos expertise e estoque natural para gerar riqueza, oportunidades e renovar a floresta, protegê-la da economia que destrói e ampliar seus serviços ambientais…”
Alfredo Lopes(*) e Mariano Cenamo(**)
Como olhar para a floresta de um novo jeito, mirando em um ciclo de prosperidade e desenvolvimento econômico sustentável para a Amazônia?
Certamente esse é o desafio central da Bioeconomia nos tempos atuais. Esse desafio passa pelo ineditismo da ousadia em fazer o que fizeram os países que promoveram a biomimética, ou seja, a imitação da vida que é precedida da observação científica e, posteriormente, da reprodução funcional do que a biodiversidade nos propicia. Grandes invenções vieram dessa observação. Os olhos de algumas espécies de borboletas da Amazônia conseguem absorver totalmente a luz visível. Seu órgão de visão é formado por várias filas de microesferas. Ao atravessá-las, a luz não é refratada. Imitando esse princípio, a Ciência desenvolveu uma resina plástica que permite às baterias de energia solar funcionarem à noite e dentro dos prédios. A lista de produtos fabris inspirados na observação da natureza é imensurável.
A economia de baixo retorno
A lista dos princípios ativos desperdiçados pela falta de ousadia e visão embaçada na direção da floresta é também imensurável. Em 53 anos do programa Zona Franca de Manaus não demos oportunidade para a Bioeconomia, o polo de Bioindústria – CBA – sequer existe juridicamente. Por isso não transitamos com intimidade nesse ambiente de negócios que envolve uma relação harmoniosa e profícua entre homem e natureza.
É preciso modernizar/superar o modelo predatório de ocupação da Amazônia, aqui adotado desde anos 70, e partir para a economia 4.0 da floresta.
A Amazônia tem um papel fundamental para o Brasil, mas parece não ser reconhecida para tanto. Com aproximadamente 5,2 milhões de quilômetros quadrados, já desmatamos 20% de sua cobertura original, ou cerca de 1,4 milhão de quilômetros quadrados. Estamos muito próximos de remover do mapa o equivalente à toda cobertura florestal do Estado do Amazonas: 1,5 milhão de quilômetros quadrados, o maior da Federação.
A maior parte das áreas desmatadas na Amazônia deram lugar a pastagens e áreas de baixa produtividade, quase sempre uma pecuária que gera pouca riqueza e padece de inovação tecnológica, com baixa intensidade de produção, baixa geração de renda e altíssimo grau de informalidade, gerando poucos impostos e de postos de trabalho.
Contra isso, num manifesto, que deve ser lançado oficialmente neste dia 07 de julho, 37 grandes empresas do Brasil demonstram preocupação com o desmatamento na Amazônia. E mais: defendem a adoção de mecanismos de crédito de carbono e pacotes de recuperação econômica pós-covid condicionadas a uma economia circular e de baixa emissão de carbono, segundo o portal Reset.
Ciência, tecnologia e economia
Por isso, apesar de deter 20% da biodiversidade da Terra e representar 60% do território brasileiro, essa Amazônia depredada gera menos de 8% do nosso PIB. Já geramos 45% no Cic da Borracha. Somos o retrato do atraso na gestão sustentável e inovadora deste Bioma que o mundo inteiro gostaria de chamar de seu.
Fica o desafio para todos nós que defendemos a valoração desse patrimônio, a precificação dos serviços ambientais que a floresta oferece. Os países desenvolvidos conhecem as dimensões e as cifras que aqui borbulham. Ou alguém duvida de que aqui está a chave da juventude com a dermocosmética de origem florestal? A quina, da qual surgiu a polêmica da cloroquina, é nativa da Amazônia. Os alimentos funcionais, a fitoterapia natural ou potencializada pela Ciência.
A batalha da vida
Precisamos de um exército de cientistas, pelotões de biólogos, esquadras de engenheiros florestais, químicos, nanobiotecnólogos.
Por que os ingleses buscaram a Malásia, melhorando geneticamente as sementes em Kew Gardens, para produzir seringueiras em escala com a qual derrubaram o maior potencial da bioeconomia da Amazônia?
Por que os suíços da Novartis saíram de Manaus em direção a Cingapura para produzir medicamentos para doenças tropicais?
Aqui é mais fácil proibir do que fomentar o empreendedorismo. E quebrar essa crença burocrática é nosso desafio. Precisamos urgentemente de uma nova geração de negócios e empreendedores com visão de longo prazo, na economia do futuro e não do passado.
Parceiros pela Amazônia
Foi nesse contexto que foi criada a Plataforma Parceiros pela Amazônia (PPA), um movimento que nasceu em Manaus, mobilizado pela Agência de Desenvolvimento dos Estados Unidos (Usaid) e pelo Centro da Indústria do Estado do Amazonas (Cieam) e protagonizado por empresas daqui, como Bemol, Whirpool, DD&L, Rede Amazônica e Grupo Nova Era, entre outras.
Coube ao Idesam, instituição amazonense e referência em inovação e sustentabilidade, convidar e mobilizar outras empresas e investidores na busca de soluções para o desenvolvimento regional.
O caminho escolhido foi o empreendedorismo e o investimento em startups da Amazônia.
Desde então já investimos cerca de R$ 6 milhões em 12 negócios promissores, que buscam gerar riqueza a partir da floresta. Recentemente o Idesam foi também escolhido pela Suframa para coordenar o Programa Prioritário de Bioeconomia (PPBio), com a missão de canalizar investimentos de P&D de empresas do PIM para projetos e empreendimentos inovadores que gerem soluções e negócios partir da bioeconomia.
Esse é o caminho oposto à economia que empobrece. É essa a nova economia, possível, inteligente e necessária para gerar riqueza na floresta principalmente para quem vive, trabalha e protege este tesouro natural.
Ambiente de bionegócios
Este é o ambiente da Bioeconomia que queremos. Negócios inovadores que podem desenvolver formas de gerar riquezas com diversos produtos que a região oferece: açaí, buriti, camu-camu, araçá-boi, patauá, madeira explorada de forma sustentável, pirarucu, castanha e até mesmo novos modelos de produção sustentável para a agricultura e pecuária.
Existe ainda muito espaço para inovar, com tecnologias industriais e bioprospecção com nanotecnologia e conservação de florestas, diversificando nossa economia e levando prosperidade para o interior da Amazônia. Vacinas, medicamentos, resinas industriais, novos usos sustentáveis da biologia molecular etc. Na direção de novas cadeias com foco permanente em inovação, fundamental para o mapeamento de novos modelos produtivos.
Mãos à obra!!
A Bioeconomia já estava ensaiando seus primeiros passos quando programas públicos e privados investiram na inovação para tornar o Brasil referência mundial de produtividade em culturas como a cana-de-açúcar, café, silvicultura de eucalipto, soja, laranja entre outras. O mesmo pacote de inovação precisa ser incentivado para a Amazônia.
Esse é o portfólio que vai inspirar e alavancar os investimentos na Bioeconomia da Amazônia, com produtos da floresta: óleos, vegetais, frutas, manejo florestal, cosméticos e fármacos, entre outros. Nós temos expertise e estoque natural para gerar riqueza, oportunidades e renovar a floresta, protegê-la da economia que destrói e ampliar seus serviços ambientais… Voltaremos!
(*) Alfredo Lopes é filósofo (PUC-SP), consultor do Centro da Indústria do Estado do Amazonas (Cieam) e editor-geral do portal www.brasilamazoniaagora.com.br
(**) Mariano Colini Cenamo é engenheiro florestal USP, cofundador e Diretor de Novos Negócios do Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (IDESAM), coordenador do Programa de Aceleração e Investimentos de Impacto da Plataforma Parceiros pela Amazônia (PPA).
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