Explorando o futuro de mudanças climáticas, fica a questão se governos e sociedades estão realmente preparados para enfrentar os desafios ambientais iminentes. Uma análise crítica sobre o compromisso com a sustentabilidade e previsões climáticas complexas.
Em uma era de rápidos avanços tecnológicos e desafios ambientais imponentes, se escancara a necessidade de que governos e sociedades adotem uma visão de longo prazo e mais condizentes com os tamanhos dos desafios. A fixação em resultados imediatos, motivada por ciclos eleitorais e relatórios financeiros trimestrais, tem impedido a preparação adequada para problemas sistêmicos e complexos que transcendem o curto prazo. Além de desgastar a confiança das pessoas com a democracia e sua real capacidade de representação popular.
No modelo de sociedade e de governo que o Ocidente escolheu, as decisões quase sempre priorizam o curto prazo, deixando de lado necessidades que não darão a classe política o prestígio imediato, ou o lucro desejado dos financiadores da campanha, comprometendo a prosperidade a longo prazo. Chamamos isso de Democracia. Ou pelo menos sua versão liberal e representativa é o “auge” e o “possível” que podemos almejar.
Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) estão atrasados, as mudanças climáticas e a perda de biodiversidade evidenciam as contradições de uma lógica política e econômica que não cabe mais com as necessidades da coletividade, pelo contrário: acelera a todos em direção a um precipício.
Mas nesse cenário angustiante alguns contam com cinto de segurança, air bags e paraquedas. Outros, no máximo com a roupa do corpo – dando continuidade a metáfora.
Enquanto a mudança necessária não acontece, se é que acontecerá, resta nos preparar e nos prevenir para a crise climática que estamos começando a enfrentar.
A previsão é uma ferramenta essencial que permite a antecipação e a preparação para futuros possíveis, fornecendo uma base sólida para a tomada de decisões estratégicas. No entanto, como destacado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) em seu último relatório “Navegando por Novos Horizontes”, a sociedade global ainda não domina essa prática. Para os autores, resiliência dos sistemas sociais e ecológicos tem sido subestimada. A leitura oposta que aponta um excesso de fé na resiliência dos biomas e da própria humanidade também é levantada por vários especialistas.
A pandemia de COVID-19, conflitos e desastres recentes destacaram a necessidade de preparação para o inesperado. E devemos fazer melhor da próxima vez.
Desigualdade no combate ao futuro de mudanças climáticas
Economistas ortodoxos provavelmente dirão – e continuarão dizendo mesmo quando estiverem no meio de um furacão, seca, enchente ou com calor extremo – sobre a necessidade inadiável da responsabilidade fiscal. E sua importância está clara. Nada contra o conceito em si. Contudo é de saltar aos olhos que a superespecialização dos técnicos os impede de ver que as sustentabilidades ambiental e climática são, com evidência crescente, mais urgentes do que a primeira. Em outras palavras, a escolha pelo seu menosprezo é muito mais fatal e destrutiva.
O Brasil dá um exemplo clássico, mas em países subdesenvolvidos a tendência geral para os investimentos públicos é que rumem ao zero, ou quase a isso, para a maiorias das grandes pastas.
Incluindo aquelas que possuem importância literalmente vital e que o setor privado jamais teria razão para investir, fora raras exceções. Como é o caso de inovações disruptivas que custam caro e possuem alto risco, que só os estados nacionais podem apostar, como a Internet, Energias Renováveis, Sequenciamento do Genoma Humano, algumas vacinas, Inteligência Artificial, 5G, etc…
O barato sai caro
Investimento em ciência e tecnologia custa caro. Mas não tão caro quando é suficiente para adaptação climática, prevenção de eventos extremos e mitigação da crise ambiental.
É preciso destacar portanto que nessa redução de orçamento mora mais um problema. Há também uma questão de geopolítica climática a qual os mecanismos de prevenção e adaptação ficam nas mãos de alguns grupos em detrimento de outros. De alguns países em detrimentos de outros. De algumas etnias em detrimento de outras.
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O negacionismo climático não pode ser desconsiderado, cientistas estadunidenses já estão se preparando para os possíveis impactos na ciência do país com uma possível volta de Donald Trump para o executivo, e os ambientalistas já lamentam a esperada política ambiental do republicano – ou a falta dela. Além disso, dados já mostram que a frutífera cooperação científica entre os EUA e a China sofreu um enorme abalo nos últimos anos, desde a eleição de Trump. Leia mais sobre isso na matéria clicando aqui.
A relação humana com o meio ambiente
A saúde do planeta e o bem-estar humano estão intrinsecamente ligados. A pressão humana sobre os recursos naturais resultou em impactos brutais – que ainda estamos correndo atrás de entender por completo. Menos de 25% das áreas terrestres permanecem intocadas pela atividade humana, e esse número pode cair para menos de 10% até 2050. A exploração de recursos de água doce e áreas marinhas para produção de alimentos aumentou consideravelmente, resultando na perda de 82% da biomassa de mamíferos selvagens desde a pré-história. Sem ações rápidas e eficazes, um milhão de espécies estão em risco de extinção.
Mas qual é o problema de termos tão poucas áreas intocadas?
É cada vez mais possível produzir e desenvolver, com ciência e tecnologia, de maneira que as más consequências dessa exploração insustentável sejam amenizadas ou até eliminadas. Mas se isso não for feito, estaremos, por exemplo:
- Perdendo espécies de fauna e flora, quase sempre todas importantes para a manutenção dos ecossistemas;
- Aumentando as emissões de gases de efeito estufa, que estão geralmente estocados nas plantas e no solo, respeitando seu ciclo natural e adaptativo do planeta;
- Impactando no Ciclo dos Nutrientes, que dá fertilidade ao solo: algo com que a agricultura não pode deixar de contar para sua produtividade;
- Aumentando as chances de crise hídrica e falta de água doce nos biomas, a cobertura vegetal do solo é uma condição fundamental para a infiltração da água da chuva no solo;
- Desestabilização de microclimas, já que as florestas, por exemplo, influenciam a formação de nuvens e a precipitação, além de regular a temperatura através da evapotranspiração
Esses seriam efeitos “primários”, por dizer assim. Tudo isso contribuiu para um presente e para um futuro de mudanças climáticas – já estabelecidas e em fase inicial. Os efeitos dessas mudanças em si, então “secundárias”, é motivo de muitos outros textos e conversas. Muita coisa ainda está por vir, e não para 50 ou 100 anos. Pra já.
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Os dados mais recentes do IPCC e do Relatório de Emissões de Lacuna apresentam um cenário sombrio de aceleração da crise climática: a trajetória atual aponta para um aumento de temperatura entre 2,1°C e 3,9°C até o final do século. Esse aquecimento exacerbará eventos climáticos extremos, intensificará o branqueamento de corais e aumentará o sofrimento humano em todo mundo – acompanhando a desigualdade social, os que mais tiveram responsabilidade pela crise climática são aqueles mais abastados e que mais poderão se proteger e contornar as amarguras, e vice-versa.
Uma das consequências mais conhecidas pelo senso comum é o do derretimento das calotas polares, e com isso o aumento do nível dos oceanos. Desde 1990 houve um aumento de 10cm no nível médio, mas desde 2013 a velocidade deste aumento dobrou. O Ártico está aquecendo quatro vezes mais rápido que o resto do planeta, e essa informação já deveria ser assustadora o suficiente. Contudo, outro efeito é que isso está causando o degelo de uma coisa chamada permafrost.
O que é o Permafrost?
Também conhecido como pergélissolo, o permafrost é uma camada de solo congelado que cobre cerca de 25% das terras do Hemisfério Norte, especialmente na Rússia, Canadá e Alasca. Teve sua formação, na maior parte, durante as Idades do Gelo e tem persistido através de períodos interglaciais, incluindo o Holoceno, que começou há cerca de 10.000 anos.
É composto por uma mistura de solo, rochas, sedimentos e gelo e durante sua formação, que remonta a períodos glaciais, ele contém aproximadamente 1,7 trilhão de toneladas de carbono, quase o dobro do dióxido de carbono presente na atmosfera e aprisionou grandes quantidades de matéria orgânica, como restos de plantas e animais. Com seu derretimento estamos também liberando grandes quantidades de metano, um potente gás de efeito estufa.
O perigo do degelo do Permafrost
Além disso, há muitos anos os cientistas alertam que o derretimento pode liberar microrganismos e vírus antigos desconhecidos pela ciência, alguns dos quais podem ser patogênicos e resistentes a antibióticos atuais. Isso representa uma ameaça assustadora à saúde humana e aos ecossistemas modernos, digna de filmes de ficção científica.
Mas isso não é apenas uma hipótese ou teoria. Já está acontecendo. Há alguns anos tivemos a revitalização de vírus e com eles o surgimento de um surto de antraz na Sibéria, causado pelo degelo rápido de esporos de Bacillus anthracis no permafrost, matando milhares de renas e afetando dezenas de pessoas.
A pergunta continua, estamos preparados para o futuro de mudanças climáticas?
Leia também sobre um outro perigo das mudanças climáticas:
FAQs
Como as mudanças climáticas afetam a biodiversidade?
As mudanças climáticas causam e influenciam para a perda de habitat, impacto nos ciclos biogeoquímicos, aumento de doenças, alterações nos ciclos reprodutivos e migração de espécies, levando à diminuição da biodiversidade.
Qual a importância do investimento em ciência e tecnologia para a sustentabilidade?
Investimentos em ciência e tecnologia são essenciais para desenvolver soluções inovadoras para mitigação e adaptação às mudanças climáticas. Além disso, tecnologias sustentáveis ajudam as empresas a reduzir custos, emissões e desperdícios.
Por que é crucial uma abordagem de longo prazo na política ambiental?
Uma abordagem de longo prazo permite a implementação de medidas e estratégias preventivas que reduzem o risco de danos ambientais irreversíveis e promovem a saúde do planeta para futuras gerações. Além de abrir a possibilidade de integração de políticas ambientais com outras áreas, como saúde, economia e urbanismo.
Como a geopolítica influencia a crise climática?
De muitas formas. A geopolítica pode afetar a cooperação internacional, influenciando negativamente as políticas e ações globais necessárias para combater as mudanças climáticas. Alterações nas relações geopolíticas podem trazer novas escolhas de matriz energética para uma mais poluente. Necessidade de novas obras de infraestrutura que não respeitem o meio ambiente, maior produção de determinadas commodities podem demandar aumento do desmatamento.
Quais são os riscos do degelo do permafrost?
O degelo do permafrost pode liberar uma quantidade imensa de gases de efeito estufa e patógenos antigos e desconhecidos, aumentando os riscos para a saúde humana e o clima global.
Como podemos melhorar a previsão de eventos climáticos extremos?
Melhorar a previsão envolve o uso de modelos climáticos avançados, coleta de dados precisos e investimento em pesquisa científica e tecnologia.
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