O debate sobre a eficácia do transporte fluvial no Amazonas reacende a problemática das chamadas “hidrovias” e da urgente necessidade de infraestrutura e navegabilidade adequada. Confrontados com os desafios das mudanças climáticas, falta de portos adequados e custos exorbitantes ligados à navegação, será que as hidrovias são realmente uma solução confiável? Confira no novo artigo de Augusto Rocha
Por Augusto Cesar Barreto Rocha
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O rio como alternativa para o transporte das indústrias de Manaus é o argumento recorrente (e insuficiente) quando se discute a questão da BR-319, que liga Manaus a Porto Velho. Alguns chamam estes rios de “hidrovias”, para dar a sensação de que temos alternativa para as rodovias de/para Manaus. Acontece, que não temos hidrovias e os rios são vítimas do aquecimento global e dos regimes de cheias e vazantes, tendo gargalos que possuem problemas para a navegabilidade perene. Isso sem falar em outras questões, como a falta de portos no interior, sinalização ou competitividade.
Também dependemos de profissionais especiais, conhecidos como Práticos, que, por uma série de motivos, inserem pesados custos na operação de grandes embarcações nos rios da região. Em setembro, esperam-se, restrições expressivas de navegabilidade na foz do Madeira, com trecho crítico próximo a Ilha da Trindade. Este fato já vem sendo deliberado e foi alvo de evento organizado pela FIEAM, CIEAM e UFAM, poucos meses atrás.
Em reunião na semana passada, com diferentes entidades, a partir de convite da ABAC – Associação Brasileira dos Armadores de Cabotagem, em conjunto com a Capitania dos Portos, CIEAM, FIEAM e outras instituições, foi deliberada a natureza do problema e os efeitos na navegação. Estas deliberações constataram o inevitável: sofreremos novamente os efeitos da redução do calado e das condições de navegabilidade, exatamente onde era esperado.
O termo SOS na navegação é um pedido de socorro. É exatamente isso que precisamos: socorro. Porém, um socorro diferente do que já temos. Precisamos transformar a “hidrovia” do Solimões-Amazonas em uma hidrovia. Ou melhor, transformar nosso rio em hidrovia. Hoje não temos uma verdadeira hidrovia. Mesmo com a boa-vontade decorrente do encontro anterior tenham levado a algumas ações, da Antaq e do DNIT, tais medidas ainda não surtiram os efeitos necessários.
Precisamos de socorro porque dependemos dos rios para os grandes navios, simplesmente porque não temos alternativas nas rodovias. Aeroportos não resolverão o problema. Mais navios, poderão até ajudar e certamente ajudarão. Entretanto, a um custo ainda maior do que o pesado custo que temos com o transporte, por nossa carência secular de infraestrutura.
É possível realizar ações para sanar esta condição? Certamente, desde que se queira transformar o rio em hidrovia. Sequer temos clareza sobre quais obras são necessárias para resolver o problema e o DNIT se comprometeu a realizar estudos, bem como a ANTAQ já indicou que tem esta prioridade. Todavia, os próximos passos precisam sair do papel e ganhar as previsões orçamentárias do Estado brasileiro. A LOA será enviada ao Congresso em 31/08/2023 e é o instrumento institucional para operacionalizar o orçamento público para os projetos que nos permitirão sofrermos menos em 2024 – quem sabe assim começaremos a transformar nossos rios em hidrovias.
Precisamos ir além das reclamações ao vento e passar para as ações institucionais que construirão hidrovias na Amazônia, portos e retroportos necessários para o movimento equilibrado e respeitoso com todos. Precisamos de hidrovias que deem passagem aos ribeirinhos e aos navios de grande porte. Enquanto não reconhecermos a Amazônia em todas as dimensões, vendo-a como um sistema, sempre destruiremos algo. Este equilíbrio é o grande desafio: o convívio dos diferentes e construção da infraestrutura harmônica que possibilite uma transformação da triste realidade em que vivemos.
Augusto Rocha é Professor Associado da UFAM, com docência na graduação, Mestrado e Doutorado e é Coordenador da Comissão CIEAM de Logística e Sustentabilidade
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