O Cerrado, um dos biomas mais importantes do Brasil, enfrenta uma crise ambiental silenciosa: o aumento alarmante de incêndios florestais. Segundo Letícia Gomes, doutora em Ecologia pela Universidade de Brasília e formada em Ciências Biológicas pela Universidade do Estado de Mato Grosso, o impacto desses incêndios no ecossistema é substancial e prejudicial, não apenas para a biodiversidade local, mas também para o clima global e a saúde pública.
A Pesquisa e seus objetivos
A pesquisa de Letícia, financiada pela CAPES, foca na modelagem de processos ambientais relacionados às queimadas no Cerrado, tanto em ecossistemas savânicos como em florestais. “Minha pesquisa busca compreender como o fogo afeta os processos terrestres, aquáticos e atmosféricos e como esses processos podem ser previstos para o futuro,” explica Letícia.
Resultados preliminares
Os resultados iniciais revelam uma realidade preocupante. Mesmo as savanas do Cerrado, que são mais adaptadas ao fogo, estão sendo impactadas devido ao aumento da frequência de incêndios antrópicos (provocados pelo homem). Letícia e sua equipe descobriram que, em média, as árvores levam até 12 anos para retornar ao seu tamanho original após uma queimada, mas cerca de metade das áreas de savanas no Cerrado queimam a cada quatro anos.
Isso impede o crescimento saudável da vegetação e facilita o estabelecimento de gramíneas, tornando o ambiente mais inflamável e vulnerável a incêndios recorrentes. Em termos de clima, esse ciclo de destruição faz com que apenas 63% do CO2 liberado por incêndios seja absorvido pela vegetação em crescimento, sem mencionar outros gases prejudiciais, como metano e óxido nitroso, que também são liberados.
“A fumaça gerada pelos incêndios altera a qualidade do ar, o que tem implicações diretas na saúde das pessoas. Além disso, os gases liberados contribuem para o efeito estufa,” afirma Letícia. As informações geradas por sua pesquisa foram incluídas no Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG), fornecendo dados cruciais para a formulação de políticas públicas.
Colaboração regional e futuro
O tema está sendo discutido no Grupo Técnico de Sanidade Vegetal no âmbito do Comitê de Sanidade Vegetal (Cosave), envolvendo diversos países sul-americanos, com o objetivo de implementar estratégias regionais para mitigar os impactos dos incêndios.
Letícia Gomes vê a necessidade de acelerar os esforços: “Estamos precisando ir mais longe, já que as análises de amostras coletadas em regiões próximas são de máxima urgência.”
O trabalho de Letícia Gomes e sua equipe lança uma luz sobre a complexa relação entre incêndios, ecossistemas e sociedade, e ressalta a urgência de políticas mais eficazes para a conservação do Cerrado e o bem-estar da população.
Segundo Letícia, sua pesquisa agora se destaca na produção de informações inéditas e valiosas para a elaboração de modelos climáticos de previsão do comportamento do fogo e seus impactos futuros. “Temos desenvolvido três modelos inovadores para prever quando e onde o fogo tem maior risco de acontecer no Cerrado. Estes modelos também mostram por onde o fogo pode se espalhar, considerando diferentes vegetações e variáveis climáticas,” disse Letícia.
Além desses modelos atuais, sua pesquisa já vislumbra as consequências para o futuro. “Estamos também modelando como será o regime de fogo no futuro caso sejam mantidas as atuais políticas públicas de prevenção e controle de incêndios,” acrescenta ela.
O papel da CAPES
Quando questionada sobre a importância da bolsa da CAPES na sua trajetória, Letícia foi enfática. “Uma pesquisa de qualidade requer tempo e dedicação. A bolsa CAPES me permitiu essa dedicação exclusiva. Sem esse apoio financeiro, especialmente em uma cidade como Brasília, com alto custo de vida, não teria sido possível realizar minha pesquisa em um dos programas de pós-graduação mais relevantes do Brasil,” declarou Letícia.
Com esse avanço na modelagem de previsão de incêndios, Letícia Gomes não apenas fortalece sua posição como uma das principais vozes em ecologia do fogo no Brasil, mas também contribui de forma significativa para a elaboração de políticas públicas eficazes.
“Ainda há muito o que ser pesquisado na área de ecologia do fogo, e eu espero poder contribuir ainda mais no avanço do conhecimento nos próximos anos,” finaliza Letícia, destacando que o seu trabalho é apenas o começo de um longo caminho a ser percorrido no estudo de como os incêndios afetam o bioma Cerrado e, por extensão, o clima e a vida no Brasil.
*Com informações GOV.BR
Comentários