Nova base de dados irá auxiliar a identificar melhor como países emitem gases de efeito estufa e como cada política ambiental surte efeito na mitigação do aquecimento global e mudanças climáticas
Uma base de dados inovadora poderá qualificar a avaliação dos resultados das políticas climáticas adotadas por cada país e ajudar a atribuir responsabilidades históricas pelo aquecimento do planeta. O conjunto de dados, apresentado em uma pesquisa publicada no último dia 29/3 no periódico Scientific Data, mostra o quanto os países contribuíram percentualmente para a crise climática através de emissões dos três principais gases de efeito estufa, desde 1851 até 2021.
O estudo se baseou em levantamentos já publicados sobre as emissões (acumuladas no período descrito e anuais) de dióxido de carbono (CO2), metano (CH4) e óxido nitroso (N2O), entre eles o “orçamento de carbono” do Global Carbon Project (GCP) e a base Primap-hist. O time de cientistas, composto por diversos integrantes do GCP e liderado por Matthew Jones, do Tyndall Centre for Climate Change Research, no Reino Unido, usou esses dados para calcular a cota de cada país no aumento da temperatura da Terra.
De acordo com o Sexto Relatório de Avaliação (AR6) do IPCC, o Painel do Clima da ONU, o planeta atualmente está 1,1ºC mais quente do que antes da era industrial. Mas, isoladamente, o o aumento da concentração de CO2, CH4 e N2O na atmosfera já fez com que a temperatura média global da superfície do planeta aumentasse 1,4ºC. O saldo líquido é de 1,1ºC por conta dos chamados efeitos de compensação, como por exemplo, a ação de resfriamento operada por partículas de aerossol na atmosfera.
A ampla base de dados será atualizada anualmente e está disponível para acesso público em um repositório online. O ranking mostra não apenas as contribuições nacionais para a crise climática; ele também agrega dados por conjunto de países, como a União Europeia (27 países), a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE, que agrega 38 países) e o chamado “Basics” (composto por Brasil, Índia, China e África do Sul).
Os dados identificam, ainda, o montante de aquecimento causado por emissões de CO2 isoladamente e pelos três gases em conjunto, permitindo que se trace um perfil mais refinado da poluição climática. Outra novidade é diferenciação, no cálculo do aquecimento por emissões totais de CO2, do que é causado pela queima de combustíveis fósseis ou por mudanças no uso da terra.
Resultados
O ranking dos maiores responsáveis pelo aquecimento causado por emissões dos três gases em conjunto até 2021 é liderado pelos Estados Unidos (0,28ºC, correspondentes a 17,3% do aquecimento total calculado, sem considerar as compensações), seguido pela China (0,20ºC ou 12,3%), Rússia (0,10ºC ou 6,1%), Brasil (0,08ºC ou 4,9%) e Índia (0,08ºC ou 4,8%). O CO2 continua sendo o maior responsável pelo aquecimento, respondendo, sozinho, por 69,1% do aumento de temperatura causado pelos três gases somados, na média global.
No entanto, um olhar geral para as emissões de dióxido de carbono não dá conta de rastrear com precisão as contribuições e responsabilidades de cada país. Segundo os cientistas, esses dados mascaram diferenças significativas quanto ao papel dos combustíveis fósseis ou das mudanças no uso da terra nas emissões de cada país.
O maior exemplo é o Brasil, que tem a maior contribuição nacional dentre todos os países para o aquecimento resultante de emissões de CO2 causadas por mudanças no uso na terra. Com o desmatamento dominando o perfil de emissões do país, dos 0,5ºC de aquecimento gerados por emissões totais de CO2 no Brasil, 0,4ºC correspondem a emissões derivadas de mudanças no uso da terra. “Isso mostra como excluir as emissões causadas por mudanças no uso da terra pode induzir a que se subestime a contribuição de alguns países no aquecimento global”, diz o artigo.
Os cientistas destacam ainda a importância da inclusão dos outros dois gases no rastreamento de contribuições nacionais. Apesar da predominância do CO2, países com forte presença da agricultura emitem mais CH4 e N2O que os países predominantemente industriais. “Quando consideradas as emissões de CCH4 e N2O, a contribuição para o aquecimento de Índia, China e Brasil cresceu 110%, 56% e 55% respectivamente, na comparação com o aquecimento causado por CO2 isoladamente”, pontuam.
Segundo o autor principal da pesquisa, Matthew Jones, a base de dados pretende contribuir para o primeiro processo de avaliação das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs, na sigla em inglês, os compromissos de redução de emissões assumidos por cada país no Acordo de Paris). “Por concentrar-se nos três gases que a maioria dos países incluem em suas NDCs, essa base de dados pode fundamentar a política climática de maneira única. Ela deve se tornar um recurso vivo para rastrear continuamente as contribuições dos países para as mudanças climáticas e, mais importante, suas transformações”, declarou, ao site do Tyndall Centre for Climate Change Research.
Fonte: Observatório do Clima
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