No desafio da integração regional, as instituições e infraestruturas são muito mais importantes que a geografia.
Por Daniel Vargas
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Integrar a Amazônia ao Brasil e ao mundo é um grande desafio. Afinal, a Amazônia é “longe”: longe do principal centro econômico brasileiro em São Paulo, da sede política nacional em Brasília, dos grandes mercados mundiais. Assim nos acostumamos a enxergar o drama particular da região e do seu desenvolvimento. Será que a Amazônia é mesmo longe?
Se o ponto de referência é a Ásia, a Amazônia está mais perto da China ou da Índia que qualquer outra parte do Brasil. Se é os Estados Unidos, Manaus está a meia distância de Miami, saindo do Sudeste. Para a Europa, economizam-se dias de barco saindo de Itaqui, no Maranhão, em vez de Santos ou Paranaguá. A China vende na Amazônia produtos processados do outro lado do mundo, por vezes com matéria-prima local. Em breve, até o tambaqui vendido nos restaurantes locais poderá vir do Oriente. Enquanto isso, a indústria da região desfalece, a agricultura é “ameaça universal”, e o Auxílio Brasil se espalha como vírus.
O Canadá exporta ao Brasil potássio que transporta por 1,5 mil km de terras, antes de embarcar o insumo para o exterior — e é perto. Às voltas de Manaus e seus rios caudalosos, mina enorme de potássio, capaz de abastecer o Brasil, é inexplorada, e longe.
O que é distante ou perto? A BR-319, há décadas aguardando pavimentação para integrar Manaus ao Acre e, de lá, ao restante do Brasil, é distante. Hidrovias bem sinalizadas e ordenadas, com rampa de acesso, tecnologia básica de comunicação e governança, são muito perto.
Educação de qualidade pífia, incapaz de formar gente pra ler ou calcular, em pleno no século XXI, é muito longe. Um sistema integrado de comunicação, com rede de internet banda larga ágil e acessível, chegando ao interior, é um atalho para qualquer esquina do mundo.
Um regime de leis, claro, ordenado e realista, para proteger e ordenar o uso da terra na região, é um atalho para o progresso. O emaranhado normativo confuso, que atira a Amazônia no caos da ilegalidade, está a anos-luz da modernidade.
Na integração e no desenvolvimento regional, a distância que importa não é medida pela geografia, mas pela régua da infraestrutura física e institucional.
Manaus está no mesmo lugar desde o dia em que nasceu. Belém, até onde se saiba, nunca saiu do lugar, nem para se aproximar nem para se afastar de ninguém. E Boa Vista, Porto Velho ou Rio Branco, daqui a 100 anos, estarão exatamente na mesma posição.
Hoje, o que é verdadeiramente longe, não é a Amazônia. É a nossa capacidade de compreender a realidade dura da região mais pobre, mais surrupiada, mas também mais promissora do Brasil.
Daniel Vargas é Doutor e Mestre em Direito (LLM) pela Harvard Law School. Mestre e bacharel em Direito pela Universidade de Brasília. Foi subsecretário de ações estratégicas da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, onde também já atuou como assessor, chefe de gabinete, subsecretário de desenvolvimento sustentável, secretário executivo e Ministro Chefe (interino).
*Texto publicado originalmente no Estadão com republicação autorizada pelo autor
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