Para além desse fundamental papel diante o cenário de mudanças climáticas, as agroflorestas também podem aumentar a produtividade agrícola
Eventos climáticos extremos estão se intensificando e ocorrendo com maior frequência, destacando a urgência em reduzir emissões de carbono e proteger os ecossistemas. Em resposta a esta situação, um estudo da revista Nature Climate Change revela o grande potencial das agroflorestas na luta contra o aquecimento global.
Os cientistas do estudo afirmam que as agroflorestas podem ser a contribuição mais significativa que a agricultura pode oferecer ao combate das mudanças climáticas. Seu impacto, em nível global, pode se igualar a práticas amplamente adotadas, como o reflorestamento.
Benefícios da agrossilvicultura
Também conhecidas como agrossilvicultura, essas áreas são caracterizadas pela integração intencional de árvores em terras agrícolas. Elas não apenas ajudam na mitigação das mudanças climáticas, mas também potencializam a produção agrícola, diversificam a renda, fortalecem a sustentabilidade e resiliência dos sistemas de produção alimentar, criam habitats para biodiversidade e protegem contra adversidades climáticas.
Em locais onde a agricultura é uma das principais causas de desmatamento, como no Brasil, a agrofloresta pode ser uma solução. Na Amazônia brasileira, por exemplo, sistemas agroflorestais têm sido introduzidos em pastagens degradadas de pequenas propriedades rurais.
Edenise Garcia, diretora de Ciências da TNC no Brasil, esclarece que a abordagem agroflorestal pode ser uma alternativa econômica sustentável e geradora de empregos. Ela destaca que “o ciclo de expansão das pastagens frequentemente inicia com desmatamentos menores, seguido pelo uso de fogo para limpeza e plantio de pastagens. Contudo, após alguns anos, isso leva à degradação e abandono da terra”. A agrofloresta pode interromper esse ciclo destrutivo.
O desafio do subaproveitamento das agroflorestas
Os sistemas agroflorestais, apesar de seu vasto potencial como soluções climáticas naturais, econômicas e prontamente acessíveis, ainda são subutilizados. Isso se deve majoritariamente à falta de clareza sobre quais práticas agroflorestais efetivamente contribuem para a mitigação de carbono, à incerteza relacionada ao seu potencial total de sequestro e à complexidade de monitorar o avanço dessas práticas.
A necessidade da ciência
Os pesquisadores ressaltam que, apesar das capacidades promissoras das agroflorestas, é imprescindível investigar a melhor maneira de incorporar essa solução natural em sistemas agrícolas globais.
Drew Terasaki Hart, ecologista computacional da TNC, enfatiza a existência de conhecimento e oportunidades para expandir a integração de árvores em plantações ao redor do mundo. Segundo ele, a ciência é fundamental para identificar áreas onde a agrofloresta tem um maior potencial tanto para mitigação climática quanto para apoiar a produção agrícola, sem esquecer os diversos outros benefícios, como a criação de habitats para espécies nativas.
Existem diversas formas de agroflorestas, abrangendo práticas agrícolas indígenas, tradicionais e contemporâneas. Desde os antigos agricultores romanos, que intercalavam suas plantações com oliveiras, até as comunidades da Amazônia que unem manejo florestal à produção de culturas tropicais valiosas, como o cacau e o café. Susan Cook-Patton, cientista sênior de restauração florestal da TNC, afirma que essa diversidade traz benefícios, mas também coloca desafios em mensurar a eficácia da mitigação climática que cada sistema pode oferecer.
Para atingir o máximo potencial climático, os envolvidos no estudo identificaram lacunas científicas que, atualmente, limitam a adoção de práticas agroflorestais em escala ampla.
Os pesquisadores concluíram que, apesar de utilizarmos estimativas de renomadas entidades como o IPCC, ainda há uma carência na compreensão exata de quanto carbono um sistema agroflorestal pode reter, e como essa retenção varia conforme a propriedade. Há também uma lacuna no reconhecimento de onde atualmente existem práticas de agrossilvicultura, com mapas muitas vezes ignorando sistemas ricos em carbono.
A adoção da agrofloresta não é uniforme globalmente. Embora alguns países africanos liderem em práticas agroflorestais, há um vasto potencial não explorado em outras áreas, especialmente no Norte Global. Para uma adoção mais ampla, incentivos adequados são essenciais.
Rémi Cardinael, do Cirad, observou um declínio nas árvores em terras agrícolas, sobretudo no hemisfério Norte. Ele defende a agrossilvicultura como uma estratégia mais eficaz para restaurar as florestas nessas regiões, comparando-a favoravelmente com projetos de reflorestamento em larga escala que podem ser mais suscetíveis a perturbações.
Para impulsionar a adoção da agrofloresta, os pesquisadores sugerem medidas voltadas para os agricultores, visando simultaneamente a mitigação das mudanças climáticas e o fortalecimento da resiliência e sustentabilidade dos sistemas alimentares globais.
Fred Stolle, do World Resources Institute, enfatiza a necessidade crescente de produzir mais alimentos, ao mesmo tempo que se reduz as emissões de carbono, face à demanda global por recursos. Ele vê a agrossilvicultura como uma estratégia crucial para atender a essas necessidades concomitantemente.
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