Cercados de atividades ilegais, do desmatamento criminoso, queimada autorizada, garimpo ilegal em terra indígena, lavagem de dinheiro, formação ilimitada de quadrilhas.. fomos transformados pela cumplicidade da fiscalização ausente em terra de todo mundo, de qualquer tipo de gente ou de ninguém. Somos destino e promessa segura de aventureiros em fazer dinheiro sujo de sangue, suor e lágrimas.
Por Alfredo Lopes
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Coluna Follow-up
A inteligência humana percebeu – com o advento da era digital – que tudo está em movimento, ou seja, Heráclito, o filósofo pré -socrático que viveu em 400aC, tinha razão ao afirmar que ninguém se banha no mesmo rio duas vezes. E que isso se aplica, também, ao cotidiano. O que ontem era labareda hoje é montoeira de cinzas. Nunca foi tão difícil ser profeta mais ainda meter-se a imaginar o futuro, um árido exercício.
Especular sobre o perfil da economia do Amazonas nos próximos cinquenta anos, quando se encerram as compensações fiscais do programa Zona Franca de Manaus, é um exercício futurista de particular importância. Pois quem deu este prazo tão largo para a Amazônia Ocidental – ou seja, o Congresso Nacional do Brasil – tinha plena certeza de que o Brasil não dará trela para sua floresta nas próximas décadas.
A bola foi colocada em nossas mãos, e já deveria estar rolando para ganhar esta peleja de tão nossa… E esta é uma tarefa que se impõe, pois se trata de expandir – à luz do que pretendemos – a base econômica que responde por 85% da atividade produtiva no Amazonas, e que movimenta atividades significativas na Amazônia, e atende às demandas nacionais de um cardápio diversificado de produtos fabricados em Manaus, com preços acessíveis e gabarito fiscal de classe mundial.
Futurologia é o que nos sobrará fazer se não formos capazes de formular um efetivo, viável e representativo planejamento estratégico com os diversos atores locais, com a colaboração eventual de especialistas de outras praças ou países que possam clarear o debate, adensar os estudos e mapear vocações de negócios economicamente viáveis e rigorosamente sustentáveis.
Planejar supõe identificar onde estamos, o que somos e com que – e com quem – podemos contar para desenhar o que pretendemos, com as métricas e resultados do que realizar e aonde pretendemos chegar. De antemão, já sabemos que não dá para achar saídas se não formos capazes de extrapolar os limites da egolatria umbilical que acomete alguns dirigentes. Exemplos não nos fogem à lembrança. Iremos a lugar algum, porém, é também, se não formos capazes de avaliar, conhecer e aprender a se referenciar numa visão de totalidade, territorialidade e prioridades da atividade econômica local que não pode ser dissociada das demandas do tecido social. Ou seja, além de gerar riquezas as empresas precisam acompanhar a destinação dos recursos passados ao poder público, facilmente contabilizáveis a partir das notas fiscais.
Alguns pilares deste planejamento estão corroídos de saída e um deles se chama insegurança jurídica. É urgente manter ligados os equipamentos de primeiros socorros e de contingenciamento de riscos e danos que a quebra deste pilar representa. É insensato invocar o aparato de correção dessa insegurança jurídica somente depois que a violência foi deflagrada. Impõe-se a utilização diuturna de radares de comunicação e observatórios de observação das rupturas do aparato constitucional que amparam a dinâmica produtiva do Polo Industrial de Manaus. Mobilizar parlamentares, para que eles se aliem aos magistrados que são mais atentos ao nosso direito – baseado na Lei Maior – pode ser temerário pois incluem interpretações subjetivas ou leituras distintas do estatuto legal ou da ingerência política de praxe.
Outro pilar a ser conquistado é que a Suframa trabalhe, necessariamente, com as tábuas da Lei de estabilidade jurisdicional. Vê-se com bons olhos, transparência e coerência o trabalho desenvolvido pela atual equipe, foco, movimento e avanços. Entretanto, seu raio de ação e autonomia não ultrapassam os limites do formalismo teleguiado de interesses inconfessos da esfera federal. Suas ações vão numa direção que consideramos satisfatória mas Brasília costuma atuar em sentido diametralmente contrário. Um jeito de resolver o impasse é conferir autonomia financeira e administrativa ao Conselho de Administração da Suframa, e ter sua equipe escolhida pelo critério técnico não pelo viés político deste ou daquele mandato federal.
O viés político está condicionado ao voluntarismo de quem tem a caneta, a cadeira e a chave do cofre à disposição . E esta é uma das causas penosas da insegurança jurídica que tantos prejuízos causam ao programa Zona Franca de Manaus, suas dificuldades de atrair investimentos e adensar, diversificar e interiorizar sua malha fabril. Não podemos ficar à mercê de um ministério que anuncia em alto e bom som que, se as cartas políticas forem as mesmas deste mandato, a primeira ação a ser feita em 2023 é acabar de vez com o IPI, ou seja, subtrair as bases que dão suporte às empresas instaladas na ZFM.
Com autonomia financeira da Suframa, o Amazonas não estaria isolado do resto do país e praticamente paralisado pelas buraqueiras de sua conexão rodoviária com o Norte do Continente. As rodovias BR-319 e a BR -174 são o retrato do descaso com este estado. Há trinta anos estas conexões atrasam/complicam/encarecem nossa logística e as oportunidades que protelamos. A cada governo novas promessas são feitas, e bem rapidamente percebemos que, independente das colorações das bandeiras, o país segue de costas e de costas para nós. No plano local, a indústria nunca recolheu tantos recursos e a população poucas vezes foi tão preterida. Estradas e respectivos vicinais dos estados são atestado de absoluta negligência pública.
Ou será que ainda precisamos ficar Esperando Godot, na ilustração icônica de Samuel Beckett, e seu teatro do absurdo, que trata da esperança de quem se senta para se apegar ao relógio e aguardar a chegada de alguém, de uma resposta, uma providência! Uma perda da capacidade de indignação contra aquele que deveria chegar, quem sabe, amanhã.
O que diz a Carta Magna a respeito das providências que competem ao ente público – já repetimos infinitas vezes neste espaço – ao conceder compensação fiscal para quem se dispõe a investir em regiões remotas? Os resultados financeiros desta contrapartida fiscal devem ser aplicados na região beneficiada. Até hoje, ninguém consegue entender por que não se pode recorrer aos tribunais para ver consignada essa premissa da isenção?
Cercados de atividades ilegais, do desmatamento criminoso, queimada autorizada, garimpo ilegal em terra indígena, lavagem de dinheiro, formação ilimitada de quadrilhas. Fomos transformados pela cumplicidade da fiscalização ausente em terra de todo mundo, de qualquer tipo de gente ou de ninguém. Somos destino e promessa segura de aventureiros em fazer dinheiro sujo de sangue, suor e lágrimas. Enquanto isso, o programa Zona Franca de Manaus, que se submete às Leis do país, presta contas rigorosamente das compensações utilizadas pela isenção de 7,6% dos tributos federais, faz Nota Fiscal. Sim, o Polo Industrial de Manaus gera nota fiscal, controle transparente e eloquente do setor produtivo local, que recolhe aos cofres públicos perto de R$30 bilhões a cada ano, o equivalente a 75% de toda riqueza aqui gerada. A diferença entre ganhar dinheiro e nota fiscal é extremamente ilustrativa para descrever os paradoxos e as contradições do Amazonas e da Amazônia. Até quando?
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