Consumidor final ganha ferramentas para compensar diretamente emissões de gases do efeito-estufa
O mercado voluntário de créditos de carbono movimenta mais de US$ 1 bilhão e é dominado por empresas que buscam compensar as emissões de gases de efeito estufa resultantes das respectivas operações. Mas cresce a demanda de consumidores que desejam compensar as próprias emissões. Em todo o mundo, sobretudo na Europa e nos Estados Unidos, se multiplicam políticas e mecanismos financeiros “verdes” voltados à pessoa física. No Brasil, as primeiras experiências desse tipo começam a ganhar corpo e envolvem não só a comercialização de créditos. Há também o financiamento direto de projetos ambientais ou a comercialização de produtos que nascem sob a lógica da neutralidade em carbono.
Uma das iniciativas, desenvolvida pela empresa americana EcoCart, foca varejo eletrônico. O algoritmo da empresa calcula emissões de produção e transporte do produto e oferece a opção de compensá-las no pagamento. A EcoCart, que chegou ao mercado americano em 2019, e hoje está também na Europa e no Japão, negocia parcerias com lojas on-line e empresas intermediárias para oferecer a opção ao consumidor. No Brasil, a companhia entrou no mercado no segundo semestre de 2021.
No país, do arrecadado pela empresa, uma taxa fixa de R$ 0,15 por compra on-line fica para a EcoCart e o restante financia 25 projetos ambientais pelo mundo. Três deles ficam no Brasil e envolvem ações de preservação e manejo florestal na Amazônia e um projeto de compostagem de resíduos de fazendas de criação de suínos em Santa Catarina. De acordo com o presidente da EcoCart no Brasil, Pedro Vasconcellos, os preços de compensação variam de acordo com a natureza física do produto, peso, distância e modal do frete, mas, na média, ficam entre 1% e 2% do valor final da compra.
Vasconcellos diz que a taxa de aceitação do mecanismo entre os consumidores nos Estados Unidos hoje é de 28%, enquanto no Brasil ainda está entre 12% e 15%. “É uma questão de curva de aprendizado, tanto para empresas, quanto consumidores. No Brasil estamos no início dessa curva”, diz. Por ora, a EcoCart atua junto a 12 empresas de pequeno e médio portes no país, dos segmentos têxtil, de calçados, acessórios e cosméticos. A meta é colocar a ferramenta no carrinho eletrônico de pelo menos 50 empresas brasileiras até junho deste ano. Nos Estados Unidos são 1,5 mil empresas com o mecanismo agregado.
Ele diz que a alternativa mais comum ao método de compensação por compra tem sido o extrato de emissões da rotina de uma pessoa. Esse mecanismo permite, por meio de algoritmos, o balanço das emissões de uma pessoa em determinado período, a partir de informações sobre hábitos inseridas em plataforma digital.
Outra iniciativa lançada há um mês no Brasil é um aplicativo da Ambify que permite calcular e compensar emissões por meio da gestão fracionada de créditos de carbono. No mercado voluntário, um crédito equivale a uma tonelada de carbono equivalente (tonCO2 equivalente), métrica adequada a processos industriais, de grande escala. Por isso, a Ambify, braço da Environmental ESG, desenvolveu tecnologia que usa segurança blockchain para precificar e organizar um mercado de tokens financeiros, os “ambifys”, que equivalem a um quilo de carbono equivalente. A Environmental ESG é subsidiária da Ambipar, grupo especializado em gestão de resíduos e projetos ambientais.
De acordo com o diretor de ativos financeiros da Ambify, João Valente, por meio do aplicativo, é possível pagar centavos para compensar uma refeição, por exemplo. O preço do ambify varia de acordo com o mercado voluntário, mas hoje um desses créditos custa em média R$ 0,20. Em um mês de operação no Brasil, informa Valente, a plataforma teve mais de 7 mil downloads e negociou cerca de 4 milhões de quilos de carbono equivalente (4 mil toneladas).
Ainda é pouco se comparado ao total do mercado voluntário global, que transaciona quase 400 milhões toneladas de CO2 equivalente, de acordo com Plínio Ribeiro, presidente da Biofílica, outra subsidiária da Ambipar responsável pela gestão dos projetos ambientais que fazem, de fato, as compensações associadas aos créditos de carbono da plataforma. As operações de pessoas físicas têm hoje menos de 1% desse total, do mercado voluntário global no mundo, diz ele. Mas tendem a ganhar volume nos próximos anos, embora não devam se aproximar de volume comercializado por empresas. “O mercado global [voluntário de créditos de carbono total de pessoa física e empresas] deve crescer cerca de 30 vezes até 2030, puxado por metas de redução de emissões das corporações”, prevê Ribeiro.
Hoje a cada compra de um usuário, a Ambify acrescenta mais 10% do valor, que, a escolha do usuário, é doado a organizações da sociedade civil. A compensação por meio dos créditos em si remunera dez projetos geridos pela Biofílica na Amazônia, que envolvem preservação e restauração florestal, além de agroflorestas.
Ações de empresas que nascem sob o paradigma da neutralidade em carbono também apostam na adesão voluntária da pessoa física. É o caso da Pantys, fabricante de calcinhas absorventes biodegradáveis sediada em Sorocaba (SP). As fundadoras Emily Ewell e Maria Eduarda Camargo criaram a marca em 2017, ao notarem nicho de mercado: a preocupação das mulheres com descarte de absorventes comuns. As empresárias citam dado do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), segundo o qual cerca de 15,6 bilhões de absorventes foram descartados em 2019 no Brasil. “Um absorvente comum demora 500 anos para se decompor, e uma calcinha de algodão, 50 anos. Usamos material [nas calcinhas absorventes] que demora três anos para se de decompor”, diz Maria Eduarda.
A Pantys conta com venda pela internet e duas lojas físicas e hoje produz cerca de 1 milhão de peças por ano, mas prefere não revelar dados de faturamento. A empresa também compensa emissões na produção. Foram 353 toneladas de CO2 em 2021, contabilizados por consultoria ambiental Way Carbon e compensados no projeto Amigo do Clima, que realiza ações de preservação floresta, energia eólica e captura de metano em aterros.
Fonte: Um Só Planeta
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