Concordamos que é insano cortar gasto público em setores vitais como saúde, educação e ciência e tecnologia. Como também é insensato deixar a economia da Amazônia Ocidental entregue à própria sorte. Isso seria o retrocesso para mais Brasília e menos Brasil. Padece de sentido esvaziar este programa de redução das desigualdades regionais que utiliza menos de 8% dos gastos fiscais do país, com um portfólio de acertos geopolíticos e estratégicos, tributários e socioambientais que movimenta – e pode movimentar muito mais a economia brasileira – a partir da Zona Franca de Manaus.
Wilson Périco
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O ministro Paulo Guedes, da Economia, sem sombra de dúvidas, deveria receber o prêmio de malabarista, daqueles que percorrem sobre um cabo de ferro entre dois assustadores arranha-céus. Conseguiu permanecer no cargo durante dois anos de pandemia e três de pressões e solavancos institucionais. O cabo de ferro é a inflação e os arranha-céus são os atores do arranca-rabo eleitoral. Seu último obstáculo tem sido convencer deus e o mundo de que está no IPI, o Imposto sobre Produtos Industrializados a origem de todas as mazelas da socioeconomia nacional. Infelizmente o buraco é mais profundo, antigo e, ainda, muito escuro.
É claro que é mais fácil questionar a economia da Amazônia Ocidental, mais precisamente a Zona Franca de Manaus, porque muitos de seus colaboradores – sem maiores informações sobre nossa realidade – baseiam seus diagnósticos em cima do equivocado demonstrativo dos gastos tributários que orienta a gestão da política econômica do país. Por isso, muitos deles não vão sossegar enquanto não mandar pelos ares esta economia que responde por 85% dos negócios e oportunidades do Amazonas e um amontoado de vantagens para a Amazônia e o Brasil.
Nesta terça-feira, 22, Guedes se reuniu com os pesos mais ou menos pesados da economia, isto é, o sistema financeiro – o anfitrião – e os demais setores de menor importância, na sede do BTG-Pactual. A todos, recolocou suas teses, anunciando que pretende reduzir 25% da alíquota do IPI para promover a “reindustrialização do país”, mesmo que isso signifique deixar de arrecadar R$ 20 bilhões aos cofres federais. Guedes merece aplauso desde que, efetivamente, consiga direcionar a medida para flexibilizar e assegurar a recuperação do parque industrial do país, açoitado pelo custo Brasil e pela precariedade infra-estrutural. Todos sabemos que o nome deste filme é Operação Impossível.
As mudanças podem, perfeitamente, conviver com a segurança jurídica das empresas instaladas na Zona Franca de Manaus a convite do governo federal há 55 anos. E o IPI tem o papel histórico de maior instrumento de viabilidade dessa política. Sem instrumentos de compensação ou contrapartida tributária, o contrato deixa de existir. Por isso, precisa ser respeitado pois envolve os destinos, direitos e interesses de, pelo menos, 30 milhões de brasileiros.
As empresas da ZFM recolheram, em 2021, algo em torno de R$ 20 bilhões. Reinvestir parte significativa desse recurso na região permitiria construir, diversificar e fazer prosperar com inteligência e sustentabilidade um novo ciclo de prosperidade. Esvaziar este programa de desenvolvimento regional é privilegiar concorrentes estrangeiros em detrimento da indústria nacional e regional. E mais: a ZFM já tem seu IPI reduzido e com essa vantagem gera emprego, oportunidades e serviços ambientais para todo o país.
É preocupante também a venda dos ativos da Amazônia. Se abrimos o acesso ao nosso patrimônio a sociedade é quem vai pagar a conta. Foi assim que nossos antepassados fizeram com o setor financeiro. Qual foi o único setor da economia brasileira que chegou até aqui dando risadas de orelha a orelha depois de dois anos de pandemia? Quem tem dado as cartas neste manicômio fiscal concentrador de rendas chamado Brasil?
Privatização é saída apressada da má-gestão com sequelas irreversíveis da autonomia e soberania na comunidade internacional. O mesmo se aplica à abertura intempestiva ao mercado externo que esvazia a indústria e transfere para a economia asiática nossos empregos e esperança. Ou à reforma trabalhista/previdenciária ou fiscal que favorece um segmento mas reduz o poder de compra/sobrevivência/dignidade dos trabalhadores e suas famílias, afinal o capitalismo depende essencialmente da saúde deste capital humano para sobreviver. Em sentido amplo.
Concordamos que é insano cortar gasto público em setores vitais como saúde, educação e ciência e tecnologia. Como também é insensato deixar a economia da Amazônia Ocidental entregue à própria sorte. Isso seria o retrocesso para mais Brasília e menos Brasil. Padece de sentido esvaziar este programa de redução das desigualdades regionais que utiliza menos de 8% dos gastos fiscais do país, com um portfólio de acertos geopolíticos e estratégicos, tributários e socioambientais que movimenta – e pode movimentar muito mais a economia brasileira – a partir da Zona Franca de Manaus.
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