O clássico sobre a globalização na Amazônia terá sua primeira edição publicada em língua portuguesa
Pela 1ª vez em língua portuguesa, ‘Viagens pelos rios Amazonas e Madeira’, com tradução de Hélio Rocha, será lançado neste sábado (3) em Manaus
Um clássico sobre a globalização na Amazônia terá sua primeira edição publicada em língua portuguesa pela Editora Valer, neste sábado (3), intitulado “Viagens pelos rios Amazonas e Madeira: Brasil, Bolívia e Peru – 1872-1874”, do escritor e engenheiro inglês Edward Davis Mathews .
A tradução ficou por conta do professor Hélio Rocha da Fundação Universidade de Rondônia – UNIR. O lançamento contará ainda com um bate-papo mediado pela coordenadora editorial da Valer, a filósofa Neiza Teixeira, o professor Dante Ribeiro da Fonseca e o tradutor Hélio Rocha, a partir das 10h no facebook da editora.
O livro pertence ao gênero literário narrativa de viagem. A obra é produto de uma viagem a trabalho feita por Mathews ao canteiro de obra da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré (EFMM), quando da primeira tentativa de construção dessa ferrovia pela empresa britânica Public Works, entre os anos de 1872-1874.
“Quando da paralisação da obra, os empregados e funcionários da empresa retornam para casa e Mathews, em 24 abril de 1874, em vez de descer o rio Madeira e chegar às cidades de Manaus e Belém, para dali zarpar para a Inglaterra, decidiu subir as cachoeiras do rio Madeira, atravessar a Bolívia e o Peru. De Lima, Mathews zarpa de navio para o Panamá e de lá segue para a sua terra natal”, explicou o tradutor Hélio Rocha.
Ainda segundo o tradutor, a partir das anotações feitas em seus diários de viagem, suas memórias e experiências em terras sul-americanas, recheadas de uma “racionalidade prática” (SAHLINS, 2001), em contraposição à suposta ‘irracionalidade’ dos nativos, em especial os grupos étnicos amazônicos, Mathews escreve e publica o seu relato em 1879 na Europa.
“Viagens pelos rios Amazonas e Madeira” é um livro que se enquadra nos relatos de viajantes pioneiros, que viram nas regiões desconhecidas um parâmetro para comparar com os seus lugares de origens, neste caso, Brasil, Bolívia e Peru com a Inglaterra, e como um itinerário para os aventureiros que se arriscavam em viagens por ambientes ainda inóspitos e desconhecidos. “
Mais de um século e meio depois é que tive o prazer de elaborar esse processo tradutório que, apesar de todo esse tempo, acredito ser de grande relevância para os estudos amazônicos em geral. O processo exigiu criatividade, obviamente, assim como viagens por alguns lugares às margens do Madeira, do Beni, Mamoré etc. A ideia era sentir o ambiente, viver aventuras, observar a natureza, as comunidades, em suma, ver de perto o que fosse possível, mesmo mais de um século depois. Além disso, claro, muitas leituras e discussões acerca desse empreendimento literário, que é a tradução”
Hélio Rocha., tradutor
Para o tradutor Hélio Rocha, o lançamento que a Valer faz de obras sobre a Amazônia tem o valor e uma importância histórico-cultural. “Qualquer estudioso da Amazônia, aqui, na região Norte do Brasil, sabe da importância desse trabalho praticamente artesanal realizado por esse grupo de intelectuais. Portanto, ter uma obra publicada e a realização do lançamento da obra pela Valer é mais que uma honra, é uma possibilidade de ter o reconhecimento de meu trabalho de forma mais ampla nesse Brasil imenso, porque a Valer divulga esse material de várias formas”, disse.
O professor Dante Ribeiro da Fonseca ressaltou que o livro de Edward Davis Mathews tem uma importância muito grande para a Literatura de Viagens na Amazônia, com ênfase no Rio Madeira, apresentando também uma série de informações sobre a Bolívia nos anos de 1870. Ele testemunhou o fracasso da primeira tentativa de construção da ferrovia. “
Este livro estava disponível até recentemente em inglês, graças ao trabalho de tradução do professor Hélio Rocha, ele se encontra disponível a todos os estudantes e pesquisadores em língua portuguesa. É um trabalho importante que traz inúmeras informações, que servem a inúmeras áreas de pesquisa, por exemplo, Geografia, História, Antropologia e Sociologia”
Dante Ribeiro, professor
Dante Fonseca é professor titular do departamento de História da Fundação Universidade Federal de Rondônia, possui doutorado e pós-doutorado pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos da Universidade Federal do Pará. Autor de livros autorais e em parcerias com outros autores, artigos publicados no Brasil e exterior, lançou recentemente a obra do território federal do “Corpóreos Estado de Rondônia”, em parceria com o professor Joao Paulo Viana, e também, com a professora Geralda Angenor, a “Pequena história e lendas das Colônias dos índios Mores da Bolívia”.
Processo Tradutório
O processo tradutório foi bastante instrutivo, lúdico, e exigiu de mim muitas horas diárias de trabalho, fosse traduzindo, lendo ou visitando alguns lugares históricos por onde passou o engenheiro Edward Mathews. “
Como estou residindo em Porto Velho, pude fazer várias visitas aos trilhos da antiga EFMM, entrar em locomotivas abandonadas, visitar pontos importantes, como a Vila de Santo Antônio, a estação de Abunã, a do Lata, a de Murtinho; fui a Guajará-Mirim etc. Tudo isso com a intenção de encher o meu espírito do vigor dessas paragens repletas de subjetividades e na esperança de que esses ‘sujeitos’ interagissem comigo, quero dizer, que o meu ser entrasse em sintonia com todos esses mundos que compõem o meu mundo”
Hélio Rocha
Pode até parecer insanidade, se visto a partir de concepções europeias de mundo. Mas eu já aprendi a me posicionar na condição de sujeito-tradutório-amazônida – quando possível – sob o viés de um “realismo empírico” – tomando emprestado esse norte teórico-interpretativo de Sahlins em “Como pensam os nativos” (2001).
“Por que esse olhar amazônico é importante num processo tradutório? Porque se traduz com mais amor, com mais veracidade, justiça, humanidade, respeito pelo Outro, seja esse outro o viajante, seja o nativo etnografado, seja a geografia do mundo amazônico, os costumes e modos de viver e sonhar dessas inúmeras comunidades étnicas que estão espraiadas no relato de Mathews”. Ressaltou Hélio
“Existe um mundo de material sobre o empreendimento da EFMM para ser estudado: romances, relatórios, mapas, fotografias, relatos de viagem etc. Acredito que, mesmo diante de toda as dificuldades que as Ciências Humanas vêm enfrentando – da falta de incentivo aos cortes de financiamento para a realização de pesquisas, dentre vários outros gargalos – ter uma obra traduzida para o português do Brasil é um grande feito e demonstração de que a educação, o ensino, é a base de uma sociedade e de uma humanidade feliz, realizada”.
Não somente a historiografia da EFMM ganha com essa tradução. As sociedades rondoniense e brasileira podem ter acesso ao relato “Viagens pelos rios Amazonas e Madeira” e se conscientizarem da importância da nossa história para as futuras gerações. Acrescentou o tradutor.
Helio Rodrigues Rocha é amazonense, filho do rio Purus. É professor-pesquisador na Universidade Federal de Rondônia, na cidade de Porto Velho, onde reside desde o Natal de 1993.
Sobre o autor
Edward Davis Mathews é natural de Plymouth, Inglaterra. E o pouco que sabemos de sua vida é que era engenheiro e trabalhou na Venezuela e depois na Estrada de Ferro Madeira-Mamoré.
Sobre o livro
“Viagens pelos rios Amazonas e Madeira” é um livro que se enquadra nos relatos de viajantes pioneiros, que viram nas regiões desconhecidas um parâmetro para comparar com os seus lugares de origens, neste caso, Brasil, Bolívia e Peru com a Inglaterra, e como um itinerário para os aventureiros que se arriscavam em viagens por ambientes ainda inóspitos e desconhecidos.
Fonte: Em Tempo
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