“O desafio é a conjugação simultânea dos dois verbos: construir e preservar. Fora disso não haverá evolução ou redução das desigualdades. Seguiremos sem desenvolvimento humano e sendo espoliados, ora por cima, ora por baixo da mesa.”
Augusto Cesar Barreto Rocha
_________________________________
Este assunto desperta sentimentos extremistas de amor ou ódio, tanto quanto diversos outros temas contemporâneos. Este texto não entregará nenhum dos dois lados. Assim, caso queiras confirmar suas crenças, saia desta leitura. A rodovia BR-319 existiu e deixou de receber manutenção, apesar do negacionismo de alguns. Por outro lado, Manaus e seu Polo Industrial encontraram outras formas de viver sem ela, como seria natural para qualquer cidade de grande porte. Faz décadas que promessas de a reconstruir são descumpridas, assim como está para fazer um século que a integração de Manaus com o centro-oeste e o oeste do país, por um modal terrestre, foi prometido e não realizado, salvo durante os poucos anos operacionais desta rodovia.
O Polo Industrial de Manaus (PIM) vem reduzindo ao longo dos últimos anos, apesar de outros negacionistas não aceitarem. Não se constroem rodovias ou qualquer infraestrutura de transporte, para o presente, como tipicamente afirma o senso comum. Não há produção para depois haver a construção do meio de transporte. O caminho é o oposto: constrói-se a infraestrutura e depois existe a atividade econômica. Assim, a BR-319, por algum tempo, estimulou a atividade industrial de Manaus. Após a sua ausência, o modal aquaviário e o rô-rô-caboclo – modo onde caminhões são transportados em balsas até Belém ou Porto Velho – foi desenvolvido e estimulou a atividade industrial (e não ao contrário, como alguns pensam).
A cabotagem surgiu neste contexto, a partir de operações portuárias privadas, oportunizada por um arranjo de condições específicas, mantendo a competitividade da indústria e a viabilidade da cidade, mesmo sem o cumprimento das incontáveis promessas de investimentos em infraestrutura para Manaus e ao arrepio de alguns aspectos regulatórios. Esta secular incapacidade de cumprir promessas e romper as deficiências de infraestrutura do Amazonas é um dos motivadores do encolhimento da indústria instalada em Manaus. A BR-319 ou qualquer nova solução para os transportes não são para as necessidades do presente. As promessas não cumpridas servem para não confiar no futuro e isso, como os buracos do Distrito Industrial, são desincentivos para investimentos.
Entre 2006 e 2011 o PIM cresceu 81%, em meio a uma onda de otimismo e promessas de construções de portos, dutovias, rodovia e expansão do aeroporto. Nos cinco anos seguintes, até 2016, o efeito foi o oposto: ao não se realizar a expectativa, encolheu 89%, voltando ao patamar de 2006. Em 2020 ele foi menos de 1% superior à 2006. Infraestrutura não atende a demandas do presente. Elas induzem demandas futuras. A economia cresce por expectativas – muitas delas autorrealizadas. Construir a rodovia é fundamental. Preservar o meio-ambiente é indispensável. Encontrar um caminho de realização das duas coisas é o que nos resta, se realmente houver interesse na região. O resto é papo de negacionista autoritário, não importando o lado da moeda. O desafio é a conjugação simultânea dos dois verbos: construir e preservar. Fora disso não haverá evolução ou redução das desigualdades. Seguiremos sem desenvolvimento humano e sendo espoliados, ora por cima, ora por baixo da mesa.
Comentários