Criado pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 22 de março de 1992, o Dia Mundial da Água surgiu como esforço da comunidade internacional para colocar em pauta questões essenciais que envolvem os recursos hídricos. Embora esteja presente em 70% da superfície da Terra, reunindo mais de 97% de toda a água do planeta, o oceano permanece desconhecido e aparentemente distante do cotidiano da maioria das pessoas, mesmo quando falamos sobre a importância da água em nossas vidas. Pesquisadores estimam que cerca de 90% desse universo ainda não foram desvendados e apenas um terço da biodiversidade marinha já foi catalogada.
O oceano provê bens e serviços estratégicos para o planeta, que beneficiam direta e indiretamente toda a sociedade. “Pode-se destacar a segurança alimentar e ambiental, previsão e estabilidade climática, bio e geoprospecção para a identificação e obtenção de organismos e minerais de interesse, respectivamente, energias alternativas, biodiversidade, lazer, dentre outros serviços. A imensa biodiversidade do oceano, além de prover alimento de alta qualidade nutricional, também tem enorme potencial biotecnológico para a produção de novos fármacos e outros bioprodutos marinhos”, destaca Eduardo R Secchi, membro de Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN), pró-reitor de Pesquisa e Pós-Graduação da Universidade Federal do Rio Grande-FURG (RS) e membro do Grupo de Especialistas em Cetáceos da International Union for Conservation of Nature (IUCN).
Para Alexander Turra, professor titular do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (USP) e também membro da RECN, a sociedade conhece pouco todo esse potencial. “Precisamos investigar mais, tanto do ponto de vista das riquezas que o oceano guarda e que pode nos oferecer, quanto dos detalhes de seu funcionamento e de sua complexidade. Conhecendo mais, poderemos cuidar melhor”, afirma Turra, doutor em Ecologia e responsável pela Cátedra UNESCO para a Sustentabilidade do Oceano.
Entre os maiores desafios para ampliar esse conhecimento estão o apoio às pesquisas e o engajamento da sociedade. “Além de conhecimento, novos estudos abrem espaço para o desenvolvimento de soluções para os desafios atuais e de negócios de impacto positivo. Também é preciso aliar a pesquisa a processos de inovação, comunicação e tecnologia para que mais pessoas e atores se envolvam com a causa oceânica”, afirma o gerente de Engajamento, Comunicação e Relações Institucionais da Fundação Grupo Boticário, Omar Rodrigues. “Mais que promover o conhecimento, é preciso também transmiti-lo de forma eficiente à sociedade, para que tenhamos o engajamento de todos pela proteção, inclusive com legislações e políticas públicas que fortaleçam e conservem esse ecossistema”, ressalta.
A entidade, com uma trajetória de 30 anos, é uma das representantes da sociedade civil na Década do Oceano no Brasil. A Década (2021 a 2030), decretada pela Organização das Nações Unidas (ONU), estabelece ações e metas globais a favor da sustentabilidade do oceano.
Serviços ecossistêmicos
De acordo com Turra, a busca pela sustentabilidade no oceano passa por três elementos-chave: produção sustentável, prosperidade equitativa (distribuição compartilhada dos recursos) e proteção efetiva. O pesquisador destaca que, até 2030, as atividades sustentáveis podem gerar 12 milhões de novos empregos no mundo. “O Painel de Alto Nível para a Economia Sustentável do Oceano prevê que, nos próximos 30 anos, até 2050, o oceano tem o potencial de gerar 40 vezes mais energia do que produz atualmente. E é capaz de gerar seis vezes mais alimento de origem marinha, tudo de forma sustentável”, salienta. “Existe a oportunidade de criar US$ 15,5 trilhões em benefícios para a humanidade até 2050 a partir de investimentos feitos no oceano”, completa.
Boa parte da economia global passa pelo oceano, já que grande parcela do comércio internacional é transportado pelo mar, sem contar sua influência para o clima e a produção de alimentos. “Toda a produção agrícola, e por consequência boa parte da nossa alimentação e das nossas receitas de exportação, depende do clima e da água. O oceano está conectado com a água dos rios, o ciclo da chuva e a regulagem do clima do planeta”, frisa Ronaldo Christofoletti, professor do Instituto do Mar da Universidade Federal de São Paulo e também membro da RECN.
O potencial biotecnológico existente nos mares ainda é apenas parcialmente conhecido. Pesquisas indicam que estão no oceano respostas e curas para a maior parte das doenças que existem e que venham a existir, como fármacos e vacinas
A geração de energia, aproveitando a dinâmica de ondas, correntes de maré e ventos, e toda a cadeia da indústria do turismo são outras possibilidades de geração de riquezas e utilização sustentável capazes de criar milhões de empregos e recursos para a sociedade.
Está no oceano também a capacidade de reduzir significativamente os gases de efeito estufa da atmosfera, mantendo sob controle a temperatura do planeta. Isso porque as algas marinhas absorvem bilhões de toneladas de dióxido de carbono (CO2) por ano.“Estudos mostram que 30% de áreas protegidas no oceano poderiam ser capazes de restaurar e conservar os habitats e a biodiversidade para, assim, sustentar todos esses serviços e benefícios essenciais que recebemos”, ressalta Turra.
Papel do cidadão
Um dado pouco conhecido é que o oceano fornece 54% do oxigênio que respiramos. “Uma hipótese para o baixo conhecimento em relação ao oceano é o fato de que não o habitamos. A tendência é cuidarmos apenas do que está logo à nossa frente”, reflete Christofoletti. “É preciso entender que tudo no planeta está interligado. Não existe mais a nossa saúde, a saúde dos animais, a saúde da natureza. A saúde é única e a pandemia está mostrando isso”, analisa, lembrando que o desmatamento e a urbanização desordenada são as prováveis causas da disseminação do novo coronavírus pelo mundo.
Os pesquisadores ressaltam que o cuidado com o oceano começa em casa. “O cidadão deve refletir sobre suas escolhas de consumo, identificando e substituindo produtos que são danosos ao meio ambiente, selecionando com consciência os pescados consumidos e praticando um turismo responsável, que incentiva a preservação e a sustentabilidade”, frisa Turra. Estima-se que 8 milhões de toneladas de resíduos acabam no mar todos os anos, sendo 80% proveniente do continente. Isso pode resultar em um cenário em que o oceano tenha mais lixo do que peixes até 2050.
Fonte: CicloVivo
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