Palavra do presidente
O governo federal instituiu, por Medida Provisória, no apagar das luzes de 2016, mais duas cobranças tributárias em favor da Superintendência da Zona Franca de Manaus: Taxas de Controle de Incentivos Fiscais (TCIF) e Taxas de Serviço (TS). Serão recolhidas pela própria instituição para custeio de suas atividades. A autarquia, hoje desprovida de autonomia administrativa e financeira, é vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e gerencia a Zona Franca de Manaus-ZFM no segmento industrial, comercial e agropecuário. Elas substituem a TSA, taxa que tinha a mesma função e foi considerada inconstitucional pela Suprema Corte, mesmo sendo cobrada pelo poder de polícia da instituição sobre importação de produtos e insumos para o setor produtivo. As empresas já ensaiam reprisar o questionamento se as novas taxas forem confiscadas pela União, como a anterior, para outros fins. Criada em 2000, a TSA, a taxa de serviço administrativo gerava mais de R$ 200 milhões por ano, dos quais 80% eram “contingenciados”, esvaziando a Suframa e a competitividade da economia local. O governo alega que os dois novos tributos criados oferecem mais clareza, segurança jurídica e formato de cobrança mais simplificado, mas esqueceu de assinar embaixo no compromisso de deixar na região a riqueza aqui gerada para “reduzir as desigualdades regionais”, o mandamento constitucional que criou a ZFM. Mesmo sendo a sétima economia do país e a única modelagem que presta contas dos incentivos fiscais, segundo o TCU, a economia do Amazonas ainda convive com o cenário inaceitável de 11 municípios entre os 50 piores IDHs (Índices de Desenvolvimento Humano) do país.
Temos demonstrado que a União fez do Amazonas um baú de sua felicidade fiscal, apesar dos incentivos fiscais. Segundo dados obtidos pelo pesquisador Jorge de Souza Bispo, autor da tese de doutoramento na FEA USP, a Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo, Criação e Distribuição de riqueza pela Zona Franca de Manaus, “…de toda a riqueza produzida por indústrias da ZFM, 54,42% vão para o governo, 27,28% são distribuídas entre os empregados e apenas 1,82% ficam com os proprietários das empresas. Em compensação, no restante do País o governo recebe 41,54% de toda a riqueza produzida, os empregados ficam com 36,31% e os empresários com 6,44%.”
Passados 50 anos, chegou a hora dessa galinha dos ovos de ouro, envelhecida pela mesmice da dependência fiscal, fazer um omelete de protagonismo gerencial. É insano incentivar e, no mesmo momento, tolher a expansão e a sustentabilidade desta economia. As entidades do setor produtivo e, necessariamente, a classe política regional, precisam exigir a retenção destes recursos na região para criar novas modulações econômicas, adensando, regionalizando e diversificando com inovação tecnológica o setor produtivo. Para tanto, pelo menos 3% dessa riqueza deverá ser investida em infraestrutura de transportes, comunicação e energia. Chega de confisco e de ilegalidades! E ao reter aqui os recursos, defendemos a formação de um Conselho Interinstitucional e representativo da Amazônia Ocidental, mais Macapá-Santana, sob a égide da Suframa, com o propósito de definir critérios e prioridades da aplicação e gestão dos recursos das novas Taxas da Suframa, bem como aqueles oriundos de P&D, a vista da representação, demandas e necessidades dos respectivos membros. Este Conselho terá sua estruturação e credenciamento subordinados ao Conselho de Administração da Suframa. Caso esses recursos sigam sendo objeto de contingenciamento, o Conselho a ser formado tomará as providências cabíveis.
O protagonismo se estenderá, também, na direção da proteção da floresta, um compromisso exaustivamente assumido pelas empresas aqui presentes, que não consta do Decreto 288/67 que criou a Zona Franca de Manaus há 50 anos. Entretanto, este é um ativo econômico e ambiental que precisa ser precificado. Afinal, com 150 milhões de hectares de floresta conservada, caso o Itamaraty venha a liberar a valoração desta floresta como “sumidouros” de carbono, esta moeda vai agregar ao PIB do Amazonas o valor de bilhões de toneladas de carbono que este Estado sequestra de emissões na atmosfera. Temos, pois, as mãos, o ativo econômico da biodiversidade, base de uma economia de baixo carbono que, esta sim, o Brasil pode usurpar para cumprir sua parte no Acordo do Clima. Afinal, a meta de recompor 15 milhões de hectares removidos pelo agronegócio, se cumprirá no protagonismo efetivo de proteção de 150 milhões de hectares de floresta no Amazonas.
Queremos e podemos, com os recursos recolhidos para a ZFM, nos próximos 50 anos, a assumir a efetiva gestão da proteção florestal, destinando atenção, programas e recursos de P&D das empresas para conferir uma finalidade econômica ao patrimônio natural. Dos 600 mil hectares destinados ao Distrito Agropecuário, nas cercanias de Manaus, 80% não foram utilizados pela ausência de um projeto de P&D que orientasse/definisse as fragilidades e potencialidades desta porção florestal. Aqui, no paraíso do fisco, cabem programas interdisciplinares e interinstitucionais de bioeconomia, demonstrativos de tudo aquilo que é inadiável fazer com a riqueza aqui produzida, em favor da região e do Brasil.
Por Wilson Périco – economista, presidente do Cieam e vice-presidente da Technicolor para a América Latina. Texto publicado no portal Infomoney/Bloomberg
Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. [email protected] |
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