Há que se debater mais ainda os rumos da ZFM, este arranjo fiscal de tantos acertos, que está padecendo toda sorte de intervenção, retaliação e destrato. Acumulam-se as irregularidades, o compadrio e os descaminhos e – dada a banalização da barbárie – nada fazemos ou, o que é pior, desacreditamos que adianta se indignar e tentar esclarecer tanta contravenção.
Dados do Ministério de Ciência &Tecnologia revelam que os valores arrecadados pelo FNDCT, Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, junto às empresas do polo industrial de Manaus, R$ 2,4 bilhões, entre 2010 e 2015, foram aplicados prioritariamente em outras regiões do país ou finalidades estranhas às demandas regionais de pesquisa e desenvolvimento. E desde 2013 nenhum recurso foi destinado para a Amazônia pela Finep, agência financiadora de negócios na área de pesquisa científica.
Pela Lei de Informática, nº 8387/91, no mínimo 46% deve ser aplicado em Instituições locais de ensino e pesquisa, em Programas Prioritários, Convênios e FNDCT e 54% na empresa, na área de inovação.
Dinheiro e pesquisa
No Amazonas, depois de pressão dos atores locais, entrou no orçamento deste ano, menos de R$ 1 milhão. Em 2014, consta um repasse de R$ 900 milhões para o programa Ciência sem Fronteiras, para formar alunos brasileiros no Exterior. A Capes, que coordena o programa afirma que estes recursos jamais foram aportados na instituição. O deputado Dermilson Chagas tem uma Ação Civil Pública correndo no MPF AM, que investiga esse descaminho de verbas públicas do Amazonas.
Bioeconomia
Quando em 2015 foi homologada a flexibilização do acesso à biodiversidade, com a Lei nº 13.123, de maio de 2015, cientistas e empreendedores da Amazônia festejaram as novas oportunidades de bioeconomia da região que essa mudança poderia representar. A emenda saiu pior que o soneto. Para os técnicos do ministério da Indústria e Comércio, a Lei é tão ruim quanto a Medida Provisória que a antecedeu, por defender uma carga burocrática e tributária que a sociedade brasileira não está disposta a pagar. Com a Lei perderam as comunidades, perdeu a academia, perdeu a indústria, o único ganhador foi o governo federal (com os recursos que deverão migrar do setor produtivo para os cofres públicos.
Desindustrialização
Os recursos que deveriam reduzir as desigualdades regionais foram “contingenciados”, uma forma elegante de descrever um confisco ilegal. Mais de 50e% da receita das empresas, segundo dados da FEA, vai para a União. Falta recurso para laboratórios, infraestrutura de comunicação, energia e transporte, embora o Amazonas seja, proporcionalmente, o estado que mais contribui com a compulsão fiscal da União. Um exemplo disso é não recuperou a BR 319, uma novela absurda, ícone do descaso logístico do governo federal.
O Amazonas, a despeito da pobreza de seus índices de desenvolvimento humano, recolhe três vezes mais do que recebe nas contrapartidas federais. Mesmo assim, juntamente com Roraima, está isolado do resto do país por via terrestre. A ZFM faz água, basta ver o faturamento das empresas, medidos em dólar, que caiu 43,31% nos últimos 5 anos. O uso da moeda americana fala por si, posto que as transações de compra e venda na cadeia produtiva se baliza por ela. Outro indicador eloquente são a perda de 35 mil postos de trabalho, desde o final de 2014.
Acima da Lei e do Rei
Empresas que querem produzir medicamentos, cosméticos ou nutracêuticos, para ter liberado seu PPB, processo produtivo para entrar em linha, chegam a esperar até 5 anos para liberação, mesmo que a lei estabeleça 120 dias de prazo. A decisão compete a um grupo de burocratas de Brasília. Eles embargam de acordo com as conveniências. Manaus tem apenas 0,6% dos estabelecimentos industriais do Brasil, São Paulo tem 30%. Mesmo assim, “eles temem que a indústria nacional seja prejudicada”. Empresas de bioeconomia deveriam ser prioritárias para uma região que tem 20% os princípios ativos do planeta. Talvez fique claro, assim, porque o Amazonas não se desenvolveu em 50 anos. Qualquer país sério teria feito uma revolução biotecnológica com R$ 2,4 bilhões recolhidos por lei para pesquisa e desenvolvimento. O Brasil não fez.
Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. [email protected] |
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