A consolidação das instituições na configuração da república é um referencial importante para balizar a democracia brasileira e seu aprimoramento, bem como para avaliar o caráter público – ou seja, focado na cidadania – da articulação equilibrada entre os três poderes, premissas vitais para resguardar o rumo seguro do desenvolvimento do país. Assegurar que as instituições republicanas se tornem cada vez mais robustas são um meio para garantir que as decisões tomadas para promover o desenvolvimento contem com o envolvimento da comunidade política e, dessa forma, estejam cada vez mais próximas do interesse público. Este é o sentido da medida assumida pela Suprema Corte do país ao suspender o mandato do presidente da Câmara Federal, alvo de denúncias graves por parte do Ministério Público Federal. Trata-se de uma interferência absolutamente legal, constitucional, certamente pressionada pelo apelo popular e pelos indicadores sombrios do desenvolvimento socioeconômico do Brasil. Atravessamos uma das mais assustadoras crises na história do desenvolvimento do Brasil, com estatísticas inquietantes e dramáticas na queda da produção industrial e na desarticulação social causada pelo desemprego.
Interdependência operativa
O tema do desenvolvimento – base material da sociedade que pretendemos construir – inspira a imagem da nação no futuro, a qual, nas condições contemporâneas, é projetada não apenas em termos do crescimento econômico e da ampliação da qualidade de vida e do bem-estar social, mas também da sustentabilidade ambiental, do alargamento da participação democrática e da construção de um sentido comum de cidadania. E é com esta lente cívica que devemos e precisamos olhar as mudanças que estão em curso no país. Temos a chance de inaugurar um tempo de mais transparência e responsabilidade política. E se temos a percepção das distorções eventuais no jogo democrático, onde as regras são ditadas pelo arcabouço constitucional, que nos livrem os oráculos da liberdade de eventuais tentações totalitárias. Se fraqueja a Democracia o único antídoto capaz de recuperar-lhe o vigor, é mais Democracia. Sempre dentro dos ditames legais. Fora deles, não há saída nem salvação, diria Rui Barbosa. No debate sobre o desenvolvimento concebido em termos tão abrangentes, a principal agência de condução dos assuntos públicos, o Estado, ganha centralidade em virtude de sua capacidade sui generis de mediar os diferentes interesses presentes na comunidade política para a construção de um referencial universalizante que se projeta no futuro. Daí a aliança saudável, transparente e proativa das entidades do setor privado com os agentes públicos, com interdependência operativa e autonomia corporativa e inspirada no bem comum.
Que país é este?
É preciso ter claro que o desenvolvimento proposto pelas entidades do setor produtivo resulta necessariamente de esforços empreendidos por membros e a obrigatória articulação entre os diferentes atores econômicos, políticos e sociais. Entretanto, este paradigma de promoção do crescimento, em todos os níveis, do tecido social, requer coordenação, indução e potencialização por meio da ação estratégica do Estado. A história das nações desenvolvidas – e também das subdesenvolvidas – mostra que as capacidades e os instrumentos de que dispõe o Estado para regular o mercado, mediar a participação da sociedade na condução dos assuntos públicos e induzir e apoiar o desenvolvimento têm tido importância decisiva em suas trajetórias de desenvolvimento. Por isso, a movimentação de todo o tecido social para diferenciar confronto e conflito. Precisamos resolver os conflitos, mas saber evitar os confrontos, frutos de paixões, facções e partidarismo exacerbado. E ainda neste patamar, as leis devem ser priorizadas e transformadas em mecanismos de avaliação, gestão e equacionamento cívico. É fato que, ainda hoje, o desenvolvimento muitas vezes é reduzido a uma tarefa de ordem eminentemente técnica, cuja garantia de sucesso pode justificar a negligência em relação ao funcionamento das instituições democráticas e republicanas. Contudo, muitas evidências há de que o avanço alcançado por esses meios não se expande por toda a sociedade e não se enraíza em bases sólidas, não sendo sequer aplicável como desenvolvimento. Foi exatamente este o teor do Relatório do TCU, publicado nas suas linhas gerais e de recomendação nesta Coluna, apontando as disfunções da ação pública, desatentas ao expediente legal e distante das articulações institucionais. Se na história de diferentes sociedades, como a brasileira, há tensões entre a democracia e o desenvolvimento, isso ganha dimensões ainda mais amplas quando se insere o referencial republicano na equação. Que país é este que promove ações de redução das desigualdades regionais, como recomenda a Constituição, e confisca os instrumentos materiais e financeiros para que se cumpra o que a Lei determina na execução pertinente? A ZFM, e seu florescimento legal, material e amplamente social, ilustra essas contradições e já deu provas de que é um caminho inteligente e eficiente de desenvolvimento, efetivamente includente e sustentável, na exata medida da combinação harmoniosa entre um arranjo institucional democrático arrojado e em aprimoramento contínuo de sua estruturação, diversificação e regionalização de seus benefícios. Um modelo que remete à necessidade de resguardar a articulação essencial entre democracia, república e desenvolvimento. Recomendamos, a propósito, a leitura de “Estado, instituições e democracia: república” IPEA, Brasília, 2010. https://sigaa.ufrn.br/sigaa/verProducaoidProducao=932124&key=ed02ec45f642d3675e1d7ebb666ac19d
Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. [email protected]
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