O PMDB, a agremiação a quem devemos a liderança do movimento pelo retorno ao Estado de Direito, assume o comando da República pela terceira vez sem jamais ter alcançado a legitimidade de confirmação pelo voto. Nas demais oportunidades, foi coadjuvante em três de quatro eleições diretas. Trata-se, pois, de uma agremiação que jamais precisou elaborar proposta, registrada em cartório, com compromissos explícitos em torno da Amazônia em geral e da Zona Franca de Manaus em particular. Entretanto, é uma agremiação qualificada em defender e exercer o poder. Na entrevista dada logo após sua confirmação pelo Senado, deixou claro seu distanciamento em relação ao Acordo do Clima, celebrado em Paris, em dezembro último, e que o Brasil deveria ter ratificado no último dia 28. As trovoadas e terremotos constitucionais impediram o cumprimento desta agenda. Michel Temer pouco sabe da Amazônia, raramente esteve aqui, muito menos participou das oportunidades que a região ofereceu ao poder central desde que o modelo Zona Franca virou uma atraente fonte de recursos. Ele desconhece que esta fonte de receitas é sobretudo um ativo climático, e está relacionado diretamente à redução de desmatamento. Em Paris, a maior parte dos ativos incluídos pelo Brasil no Acordo do Clima envolveu a Amazônia, e no Amazonas, quando ele se permitir estudar o assunto, saberá que uma significativa parcela de espécies – que teriam sido extintas pelo paradigma predatório – foram conservadas, entre outros destacados itens para o Acordo vital. Como jurista, facilmente Temer saberá defender os direitos de quem presta tantos benefícios a Humanidade. E como parlamentar/empresário, ligado aos negócios portuários do Sudeste, se excitaria em vislumbrar oportunidades nos bionegócios, mesmo que poucos mais de 5% das espécies foram levadas ao laboratório por falta de percepção empreendedora deste acervo biótico. A Convenção das Nações Unidas de Diversidade Biológica estima que 40% do PIB mundial é ligado à biodiversidade. Esta biodiversidade na Amazônia gera benefícios de patentes e conhecimento não só na região, mas em todo Brasil e no mundo. As nações civilizadas sabem o que isso significa. Por isso, em vez de temer ou de esperar pelo PMDB é inadiável convidar o novo presidente a passear na floresta.
Aquífero Amazonas
Sensibilizado pela escassez de água da Síndrome Cantareira, que começa a alarmar o poder público no Sudeste, certamente o presidente Temer terá que expandir sua percepção de Brasil além da Geografia que acaba na Bahia, como é ensinada nos manuais do ensino fundamental no país . Entender que, além do aquífero Alter-do-Chão, um reservatório que alcança o Estado do Amazonas, Pará e Amapá, com 86 mil km³ contra 46 mil km³ pertencentes ao aquífero Guarani, no Sudeste do país, em fronteira com Argentina e Paraguai, temos na Amazônia, onde não há a plataforma de rochas que recobre o Guarani, complicando o acesso. Alter- -Chão, com efeito, é configuração arenosa e acessível como reserva estratégica, segundo pesquisas da Universidade Federal do Pará. Mais recentemente, segundo dados da Gerência de Apoio ao Sistema de Água Subterrânea do Ministério do Meio Ambiente, a descoberta vem ampliar ainda mais o potencial da Amazônia quando o assunto é disponibilidade de água. Trata-se do Aquífero Amazonas, um reservatório transfronteiriço de água subterrânea, que o Brasil divide com o Equador, Venezuela, Bolívia, Colômbia e Peru. Sua extensão é de quase quatro milhões de quilômetros quadrados (3.950.000) sendo constituído pelas formações dos aquíferos Solimões, Içá e Alter do Chão. Com uma extensão três vezes maior que o aquífero Guarani, o Amazonas é uma conexão hidrogeológica, com grande potencialidade hídrica, mas ainda pouco conhecida. Os estudos até agora realizados atestam que a boa qualidade química da água do Sistema Aquífero Amazonas.
Serviços e negócios ambientais
Além da alimentação, comida e água, os chineses precisam da Amazônia como moeda de troca de ratificação se sua assinatura no Acordo do Clima. A floresta, neste sistema, é uma bomba biótica que tem a capacidade de bombear água para a atmosfera assim que chove, mantendo o ciclo que faz com que a umidade do Atlântico atinja os Andes e daí migre para o Centro-Oeste, Sudeste e Sul do país. É estimado que uma árvore de grande porte consiga “bombear” até 500 litros de água por dia. Sem a floresta, esta água iria rapidamente se juntar aos rios e desaguar de volta no oceano Atlântico, interrompendo o ciclo que a leva a outras regiões do Brasil. Quanto valem os serviços ambientais deste bioma, incluindo os recursos hídricos e o equilíbrio climático? A floresta tropical amazônica é muito mais que aglomerações de árvores, almoxarifado de biodiversidade ou simples estoque de carbono. Sua cadeia trófica, base de sua dinâmica pulsante de vida, alimenta este organismo chamado planeta, hidrata sua respiração e lhe confere poder na distribuição dos elementos vitais, uma capacidade de empreender o equilíbrio climático, dando suporte também ao florescimento de sociedades humanas. Um ativo que Michel Temer precisa conhecer, não apenas para ratificar o Acordo do Clima, mas também para retificar, tornar reta, justa e fluida a via dupla entre o Sudeste e a brasilidade amazônica.
Esta coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do Cieam - Editor: Alfredo Lopes ([email protected]) |
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