Por Wilson Périco*
Que nos resta, em meio a mais uma artilharia pesada contra o Amazonas, senão invocar o arsenal de ironia de Gabriel Garcia Marques – e parodiar as rifas de Macondo com a criação do troféu Pinóquio – para premiar tantas anomalias e atentados contra a Zona Franca de Manaus? Serão necessários 100 anos fundados na desinformação crônica – ou premeditada? – em nome de interesses que alguma hora deverão ser explicitados? Carece de brasilidade e altruísmo afirmar, por exemplo, que o modelo ZFM consome R$ 24 bilhões de benefícios fiscais, segundo nebulosos levantamentos em nome da FGV, a respeitável Fundação Getúlio Vargas. Ora, o portal da Receita Federal, em 2012, aponta outro dado, R$ 26,02 bi, distribuídos para todos os sete Estados da Região Norte, ou seja, apenas 17% da renúncia fiscal do país, contra R$ 70,65 bilhões para o Sudeste, que usufrui de 48,4% da renúncia fiscal. E mais de 60% da verba do BNDES, destinada ao desenvolvimento, parte dela recolhida, o discurso do narcisismo fiscal ignora, das verbas contingenciadas da Suframa. E se o modelo faturou R$ 80 bilhões em 2013, mais da metade desta riqueza – num levantamento acadêmico, transformado em doutoramento científico – foi repassada para os cofres do governo, segundo estudos da Universidade de São Paulo. Seria, aqui, enfadonho e interminável, recorrer ao confronto de indicadores para demonstrar, mais uma vez, o tamanho dessa maledicência sem fim.
Postulamos, a rigor, um Amazonas integrado ao país muito além de 10 ou 100 anos de incentivos, daqui ou dacolá. A indústria automobilística utiliza este artifício bem antes da primeira Copa da Fifa em 1958. E está aí, forte e bem nutrida pelo silêncio obsequioso dos detratores da ZFM. A reserva de mercado para a indústria de Informática é reivindicação concomitante à criação da Zona Franca de Manaus, e hoje se configura na Lei de Informática que essa mesma mídia se cala com relação aos seus propósitos de prorrogação pelo mesmo período. Os incentivos da ZFM buscam reduzir as desigualdades regionais e as críticas desprovidas de fundamentos carregam em seu bojo a ampliação das disparidades vigentes. Mais do que prorrogação, que nos permita, sim, seguir zelando por um patrimônio da biodiversidade, postulamos novas matrizes econômicas. O modelo aqui consolidado, sem chaminés, conserva em 98% de integralidade florestal original. E sobre isso, em alguma hora, o Brasil vai por reparo, para atentar que aqui se façam, a partir desse acervo biótico, as soluções de fitoterapia, cosmética, nutracêutica e segurança alimentar de que o país e a humanidade precisam para se manter hígidos, joviais e bem nutridos, com investimentos na formação de cientistas, e em infraestrutura de inovação tecnológica, nanotecnológica e biodigital. E isso não é responsabilidade direta das empresas. Recolhemos, no âmbito das indústrias de Informática e afins, mais de R$ 1,3 bilhão para Pesquisa e Desenvolvimento, valor semelhante para financiar a Universidade do Estado do Amazonas, as cadeias produtivas do interior, os programas de turismo , além das TAS, taxas administrativas da Suframa, que financiaram a construção do Centro de Biotecnologia da Amazônia, há 12 anos guardando a definição de seu modelo de gestão. Instituições de pesquisa, entidades do setor privado, órgãos públicos de fomento e extensão reforçam o movimento de toda a sociedade de entregar a gestão do Centro à Embrapa, uma empresa pública que envaidece o país pelos acertos e ganhos de suas pesquisas e negócios.
Mais do que 10 ou 100 anos de incentivos, queremos liberação do Processo Produtivo Básico para todos os itens que a Constituição e o bom senso autorizam. É insensato e prepotente ter aguardado por mais de quatro anos o PPB de uma indústria de fármacos, para uma região que tem 20% dos princípios ativos da Terra. Como cobrar competitividade de um modelo que tem 20% de seus custos numa logística cara e inadequada e que tem o projeto de um porto esquecido nos escaninhos da justiça e outro na burocracia? Apesar disso, e a despeito de insinuações perversas de que as empresas vivem num paraíso fiscal, Manaus recolhe 60% dos tributos federais, o que lhe confere o papel de um dos principais pontos da geração de receitas públicas no país. De quebra, nas transferências compulsórias, recebeu em 2012, somen te R$ 2,3 bilhões e recolheu à União, sob esta letra, algo em torno de R$ 6,4 bilhões anuais. Enquanto a indústria automobilística, a indústria aeronáutica e a indústria de informática, setores historicamente favorecidos com incentivos fiscais, quase nada pagam de impostos, a ZFM utiliza de um conjunto de benefícios fiscais sem financiamento público. O mecanismo de benefício fiscal é vinculado exclusivamente à produção, não ao capital. Mas esses detalhes não importam no jogo obscuro que fará meio século, deixando o interesse do país que a ZFM também representa, na mais centenária solidão. José Arcadio Buendía, ora pro nobis!
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*Presidente do Centro da Indústria do Estado do Amazonas
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