Um grupo de estudantes desenvolveram o ‘Linklado’, um teclado digital para línguas indígenas e são agora finalistas no Prêmio Jabuti. O projeto visa preservar a rica diversidade linguística da Amazônia na era digital
Na categoria de Fomento à Leitura, o “Linklado: teclado digital para línguas indígenas” figura entre os dez finalistas da 65ª edição do Prêmio Jabuti. O anúncio dos cinco finalistas ocorrerá no dia 21 deste mês, às 12h (horário de Brasília). Informações atualizadas são disponibilizadas no site oficial da premiação (https://www.premiojabuti.com.br/). A cerimônia de premiação, revelando os ganhadores das 21 categorias divididas em Literatura, Não Ficção, Produção Editorial e Inovação, juntamente com o Livro do Ano, acontecerá no Theatro Municipal de São Paulo, em 5 de dezembro.
Muitas línguas indígenas amazônicas não foram incorporadas na era digital devido à presença de caracteres únicos como ʉ, ɨ, ñ, ç̀, g̃ e a combinação de diversos diacríticos (`,´, ~, ^, ¨), ausentes na maioria dos teclados. Essa limitação obriga os indígenas a se comunicarem através de áudios ou substituir esses caracteres, pondo em risco a sobrevivência dessas línguas.
Criação do teclado digital
Um grupo de pesquisadores jovens do Amazonas introduziu o ‘Linklado’, um teclado digital que inclui caracteres especiais e diacríticos de mais de 40 línguas indígenas da Amazônia, visando superar esse obstáculo. Os criadores do projeto são Samuel Minev Benzecry, estudante da Universidade de Stanford, e Juliano Portela, ex-aluno do Ensino Médio em Manaus e atual estudante da Universidade Yale. Eles projetaram e desenvolveram o protótipo do teclado para Windows e sistemas Android.
Samuel Benzecry é reconhecido pela rede Ashoka, uma organização global de empreendedorismo social, que promove habilidades para transformações sociais benéficas.
Importância do Prêmio Jabuti
Desde 1958, o Prêmio Jabuti se estabeleceu como a principal premiação do livro no Brasil, sendo um marco no mercado editorial do país. Este prêmio cultural reconhece e divulga a excelência da produção literária nacional, valorizando todos os aspectos da cadeia produtiva do livro e interagindo com variados públicos leitores, acompanhando as evoluções sociais.
Segundo Samuel, o ‘Linklado’ é um produto pioneiro. Ele aponta que, embora dispositivos Android possam ser configurados em línguas como Kaingang ou Nheengatu, eles não atendem línguas que utilizam diacríticos como ü̃, comum na língua Tikuna, a mais falada entre os indígenas no Brasil. Samuel menciona que já existiam teclados para línguas indígenas mexicanas, mas eles não abrangiam os caracteres específicos das línguas amazônicas. O ‘Linklado’ suporta mais de 40 línguas indígenas, incluindo aquelas com caracteres e acentos gráficos atípicos, abrangendo também línguas de países vizinhos.
Juliano e Samuel, os estudantes por trás do projeto, participaram das ‘Olimpíadas Internacional de Linguística’. Uma das tarefas da competição era redigir um artigo em uma língua indígena. “Foi quando eu percebi a dificuldade de transcrever alguns caracteres do papel para o word. Só depois que criamos o Linklado que consegui escrever o artigo direito”, comentou o estudante. Juliano mencionou que desenvolveu o protótipo para Android em apenas um dia. “O Samuel já tinha enviado como ficaria o layout, eu fiz uns pequenos ajustes e já enviei para ele o artigo com os caracteres. Ele ficou super animado e disse que ia apresentar para a professora”, relembrou Juliano.
A professora mencionada é Noemia Kazue Ishikawa, bióloga e doutora em Recursos Naturais, coordenadora do projeto ‘Redes de mulheres indígenas tradutoras e cientistas: conexões para uma educação transformadora em ciências no Amazonas’. Este projeto é realizado pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Amazonas (Fapeam).
Significado e propósito
O nome ‘Linklado’ é uma fusão de ‘lin’ (de línguas indígenas) e ‘klado’, um jogo de palavras com ‘teclado’, formando também ‘link’, que significa conexão. Este teclado digital visa conectar os falantes de línguas indígenas a um teclado que respeite seu vocabulário, contribuindo para a transmissão e preservação dessas línguas na era digital. “No Amazonas temos mais de 52 línguas vivas. A perda de muitas dessas línguas devido a fatores como glotocídio e outros é uma realidade preocupante. O ‘Linklado’ poderia ajudar a manter essas línguas vivas”, alerta Samuel.
Impacto do ‘Linklado’ na Ciência e Educação
Noemia avalia que o ‘Linklado’ será uma ferramenta vital para facilitar a publicação de materiais bilíngues por cientistas indígenas e não indígenas, impulsionando a leitura e a popularização da ciência. “Aos falantes da língua, o Linklado facilitará a escrita casual e rotineira nas línguas indígenas, promovendo a manutenção da língua”, afirma Noemia.
No sistema Android, o ‘Linklado’ substitui o teclado padrão, adicionando caracteres especiais e uma tecla para diacríticos. No Windows, o software apresenta uma janela com caracteres especiais e diacríticos, permitindo o uso simultâneo com o teclado convencional. O aplicativo está disponível gratuitamente na Play Store e na Windows Store.
Equipe do Projeto ‘Linklado’
Além de Samuel Minev Benzecry e Juliano Dantas Portela, a equipe do ‘Linklado’ inclui pesquisadores do Inpa: Ana Carla Bruno, Ruby Vargas Isla Gordiano, e Noemia Kazue Ishikawa. O projeto também conta com a participação de Marinete Almeida Costa (Tukano/Ye’pâ-masa), Josmar Pinheiro Lima (Tuyuka/Ʉtãpinopona), Kaina Bruno Brazão, Rafael Estrela Freitas, Laura Corrêa Cavalcante, Odalis Ramos, Rosilene Fonseca Pereira (Piratapuia/Waíkhana), Rosilda Maria Cordeiro da Silva (Tukano/Ye’pâ-masa), Dagoberto Azevedo (Tukano/Ye’pâ-masa), Cristina Quirino Mariano (Tikuna/Magüta) e Dulce Maria Barreto Tenório (Tuyuka/Ʉtãpinopona).
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