Com pompa e circunstância, o governo federal anunciou em maio passado o decreto que regulamentou o mercado voluntário de carbono no Brasil. Era o “grande salto” para o país realmente aproveitar o potencial do comércio internacional de créditos de carbono, finalmente definido depois da aprovação da implementação do Artigo 6 do Acordo de Paris, na COP26 no ano passado. Mas…
Cinco meses depois, a coisa está parada. Como bem assinalou Lia Hama, no Um Só Planeta, o texto publicado pelo governo é vago e, fiel à ambiguidade da atual administração federal na questão ambiental, não cria nenhuma obrigatoriedade para que os diferentes setores econômicos apresentem seus planos de redução de emissão nem oferece segurança jurídica aos participantes. Para piorar, o período eleitoral e a incerteza em torno do próximo governo também travaram a discussão sobre o tema no Congresso Nacional, onde um projeto de regulamentação mais abrangente se arrasta há mais de um ano.
“Vamos supor que mude o governo. Ele pode acabar com o decreto numa canetada só. Então, como é que esse mercado vai atrair players com a intenção de investir milhões de dólares num ambiente que pode mudar de uma hora para a outra? É preciso uma lei para dar mais segurança jurídica aos investidores”, argumentou o advogado Tiago Ricci.
Mercado de carbono segue parado
No Congresso, a discussão está travada desde o semestre passado, quando a deputada Carla Zambelli (SP), presidente da Comissão de Meio Ambiente da Câmara, alterou o texto de consenso, de autoria do parlamentar Marcelo Ramos (AM), substituindo-o por uma proposta vazia que não prevê qualquer penalidade para as empresas que não cumprirem suas metas de redução de emissões.
As incertezas quanto à regulação dão margem para que os chamados “cowboysdo carbono” sigam dando as cartas no comércio voluntário de créditos de emissão, perpetuando problemas antigos e criando novas dificuldades. Nesse ambiente, empresas pouco idôneas se aproveitam da falta de regras para pressionar comunidades locais a vender créditos de carbono com compensação financeira mínima, comprando a um valor baixíssimo e lucrando muito em cima – e sem muita atenção com a integridade dos créditos comprados e revendidos.
“O Brasil tem casos que dividiram comunidades indígenas porque uma aldeia estava envolvida em um projeto, e a outra, ao lado, não – e o cacique da primeira ganhou uma caminhonete. Para evitar tais problemas, há quem defenda programas de carbono ligados a nações ou a governos subnacionais, com escalas e políticas públicas”, escreveu Daniela Chiaretti no Valor. Mas, para isso funcionar, falta o principal: regra.
Texto publicado originalmente em CLIMA INFO
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