De saída do Ministério da Ciência e Tecnologia para se candidatar a deputado federal, Pontes diz que nunca faltou verba para monitorar bioma. Confira entrevista
Com a oficialização de seu nome como um dos candidatos de Jair Bolsonaro à deputado federal por São Paulo, Marcos Pontes está com os dias contados à frente do Ministério de Ciência e Tecnologia (MCTI). O prazo para deixar o governo é o dia 2 de abril, seis meses antes do primeiro turno eleitoral. Pontes, um dos 12 nomes que Bolsonaro contabiliza que terão que deixar o governo para concorrer a diferentes cargos nas próximas eleições, planeja se filiar ao Partido Liberal (PL) nas próximas semanas.
Em pouco mais de três anos no comando da pasta da Ciência, Pontes enfrentou várias crises e polêmicas. A primeira grande crise foi a saída de Ricardo Galvão da direção do Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE), depois de Bolsonaro ter questionado a credibilidade dos dados de desmatamento gerados pelo Instituto.
Desde então, Pontes teve de encarar questionamentos sobre os investimentos exíguos em Ciência – segundo levantamento do Ipea, em 2020 foram investidos os menores valores em 12 anos para a área –, o iminente fim do programa de monitoramento do Cerrado, o apagão no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), dentre outros.
Em visita ao Vale do Paraíba, onde fica a sede do INPE, nesta terça-feira (15), Pontes concedeu entrevista exclusiva a ((o))eco, onde comentou estes e outros assuntos. Confira os principais trechos:
((o))eco: Durante sua gestão à frente do Ministério, o senhor enfrentou várias crises: crise no orçamento da Ciência, crise no INPE, crise de credibilidade dos dados gerados nos institutos vinculados ao MCTIC. Como o senhor avalia sua gestão frente a essas crises?
Marcos Pontes – Nossa gestão passou por muitos desafios e conseguimos vencer todos eles. Posso deixar o Ministério com tranquilidade, porque é um Ministério organizado, inclusive a parte orçamentária, que está equacionada. Nós temos três fontes: temos o próprio orçamento, que não está bom, mas vai melhorar. Nós temos a nossa Secretaria de Estruturas Financeiras, que hoje permite trazer orçamentos de fora. O pessoal não percebe, mas isso é uma inovação gigantesca no financiamento de ciência e tecnologia no país. Nós temos o FNDCT [Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico], que nos dá mais R$ 5 bilhões de investimento por ano. Isso muda a situação de ciência e tecnologia e eu fico muito tranquilo, porque deixei todas as estruturas prontas, as estratégias, as políticas, planos, programas prontos. Agora vêm os frutos. Na área de saúde, quando você ia imaginar que o Brasil ia passar a ser um produtor de vacinas? Eu achava que o Brasil era um produtor, mas ele nunca produziu nenhuma vacina e agora a gente produz vacina para a dengue, para a zika, Chikungunya, leishmaniose e agora teremos a primeira vacina brasileira contra a Covid-19. Vamos estar muito mais preparados para outras pandemias,
Qual seria o seu legado à frente do Ministério?
Acho que a organização, principalmente isso. A gestão para organizar o sistema como um todo e preparar essa máquina para produzir. Se você olhar todos os países desenvolvidos, eles têm em comum educação, ciência, tecnologia e inovações fortes. A partir daí você consegue melhorar todos os setores. A gente conseguiu organizar isso. O que eu sei fazer, que aprendi com os 20 anos de NASA, foi organizar times, gerenciar projetos e trazer resultados com isso. É bem pragmático mesmo, ou seja, transformar uma ideia em realidade.
A reformulação na estrutura organizacional realizada no INPE, muito à revelia dos servidores, foi fruto desse seu processo de organização?
O INPE foi reformulado pelo Darcton [Darcton Damião, diretor interino do INPE entre agosto de 2019, após a saída de Ricardo Galvão, e outubro de 2020, quando Clézio de Nardin assumiu]. Ele tomou a iniciativa e foi muito bom para reorganizar o INPE. Agora com mais orçamento as coisas tendem a melhorar muito, tem programas novos interessantes não só para o INPE, mas para todo Brasil.
O senhor citou a produção de vacinas. Mas ao mesmo tempo que temos essa produção, temos uma postura do Governo Federal que é contrário à vacina…
O Governo Federal não tem uma postura contrária, o Ministério da Saúde comprou mais de 400 milhões de vacinas que estão sendo distribuídas por todos os estados e municípios. O Brasil é um dos países mais vacinados do planeta terra.
Mas o presidente Bolsonaro deu várias declarações antivacina.
Mas daí você tem que separar o seguinte: ele como presidente, ele cumpriu sua função, que é colocar dinheiro para comprar vacina, colocar dinheiro para a gente pesquisar e desenvolver vacinas nacionais. Agora, ele como pessoa, vamos dizer assim, eu não comento essa parte. Comento como presidente e como presidente ele forneceu recursos, nós tivemos os recursos.
Nós falamos da postura do governo federal perante a vacina, mas tivemos a questão do desmatamento, de uma negação de que exista desmatamento na Amazônia. Como lidar com essa questão?
A gente não tem negação do desmatamento! Eu estava falando com o Joaquim [Joaquim Leite, ministro de Meio Ambiente] e ele tem pego os dados todos. Ele tem trabalhado com vários dados interessantes em relação a isso que vêm do INMET [Instituto Nacional de Meteorologia], do Censipam [Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia], do Ministério da Agricultura, para ter uma precisão disso aí [desmatamento]. Eu como Ministério de Ciência e Tecnologia, eu não faço combate ao desmatamento, mas tem a Polícia Federal, o Ibama, o ICMBio que estão dentro da floresta. O que eu estou fazendo são algumas novidades. Temos o satélite Amazônia 1 e agora estamos desenvolvendo o Amazônia 2, com radar de abertura sintética, que a gente precisa ter essa tecnologia no país. Além disso, colocamos 50 laboratórios na Amazônia, os cientistas vão ficar espalhados onde eles acham que devem ficar, e aí vamos ter pelo menos 750 cientistas no meio da Amazônia, observando, trabalhando com as comunidades. Ou seja, para quem quiser desmatar ilegal, tem mais problema aí. Além disso, temos o Projeto Providence, que são centenas de câmeras com inteligência artificial identificando biodiversidade. A resex de Mamirauá é a primeira reserva do planeta monitorada 24 horas, 7 dias por semana, com inteligência artificial, em tempo real. Vamos estar com a Amazônia vigiada. O que eu posso fazer, estou fazendo.
Em relação ao monitoramento do desmatamento no Cerrado, os recursos para sua manutenção ao longo dos próximos anos já estão garantidos?
Isso sempre teve recurso! Eu não sei porque apareceu esse negócio [de acabar o monitoramento do Cerrado], acho que o INPE deu uma moscada.
É porque acabou o recurso do FIP Cerrado, programa do Banco Mundial que mantinha o programa, não é ministro?
O recurso sempre esteve lá na FINEP [Financiadora de Estudos e Projetos], era só uma questão de preencher formulário. Quando eu vi essa notícia, eu falei [para o diretor do INPE, Clézio de Nardin]: ‘ô Clézio, esqueceu como preenche formulário, pô? Pega esse negócio e preenche essa coisa aí!’. Nunca teve problema de orçamento para isso, não.
Fonte: O Eco
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