Novo relatório da entidade aponta que 6 dos 10 maiores fatores de preocupação nesta década são de natureza ambiental; Brasil é citado como mau exemplo
Matéria publicada originalmente em 11.01.2022
O risco de fracasso em atingir as metas do Acordo de Paris de estabilizar o clima da Terra é a maior ameaça à humanidade na próxima década. A conclusão é do WEF (Fórum Econômico Mundial), que lançou nesta terça-feira (11) seu Relatório de Riscos Globais de 2022.
Para produzir a publicação, o fórum de Davos, que adiou para o meio do ano seu encontro anual de janeiro por causa da ômicron, ouviu 12.000 lideranças de 124 países. O questionário tenta produzir todo ano um retrato “a quente” do que essas lideranças – do mercado, da academia, do setor político e da sociedade civil – enxergam como os maiores buracos no caminho da prosperidade e da estabilidade globais.
É uma espécie de “pesquisa Focus” global, como as enquetes mensais do Banco Central com o mercado para tentar tomar a temperatura dos rumos da economia brasileira. Em geral o mercado acerta. No caso dos relatórios do WEF, o acerto nas previsões é um problema para a humanidade, porque pelo menos desde 2015 o clima domina a lista de preocupações todos os anos.
Em 2022, seis dos dez principais riscos globais apontados pelo relatório têm relação com fatores ambientais: fracasso da ação climática (1o lugar), extremos meteorológicos (2o), perda de biodiversidade (3o), doenças infecciosas (6o), danos ambientais causados por humanos (7o) e crise de recursos naturais (8o). Também aparecem na lista a erosão da coesão social (4o), a crise do bem-estar social (5o), crises da dívida (9o) e confrontos geoeconômicos (10o).
Apesar de ter elogiado os resultados da COP26, a conferência do clima de Glasgow, no ano passado, o relatório diz que mesmo as promessas feitas no encontro da Escócia são insuficientes para assegurar o cumprimento da meta de Paris de limitar o aquecimento da Terra a 1,5oC no fim deste século. “A trajetória atual [de emissões de carbono] deve guiar o mundo no rumo de 2,4oC de aquecimento, ficando em 1,8oC apenas nos cenários mais otimistas”, diz o relatório.
E o contexto global não está ajudando, prossegue o documento: a crise econômica decorrente da Covid-19 agravou ainda mais as desigualdades no mundo. Apenas 6% da população dos 52 países mais pobres do mundo está vacinada; o PIB do mundo em desenvolvimento terá caído 5,5% até 2024, enquanto o dos países desenvolvidos deverá subir 0,9%, e 51 milhões de pessoas a mais deverão viver em pobreza extrema até 2030, em comparação com as tendências pré-pandemia.
Nesse cenário de desigualdade elevada e de rebordosa econômica, os incentivos aos países para pensar e agir no longo prazo ficam menores, e os interesses nacionais e de curto prazo passam a dominar a agenda. Nada disso harmoniza com o combate à mudanças climáticas, que por definição é um problema global e de longo prazo.
“A crise criada pela pandemia de Covid-19 traz o risco de adiar a ação climática ao estimular os países a priorizar medidas de curto prazo, não obstante seu impacto, do que transições verdes”, diz o texto. E cita como um exemplo a não ser seguido o Brasil. O país “se juntou a 140 outros países responsáveis por 91% das florestas do mundo ao endossar a Declaração de Glasgow sobre Florestas, enquanto o desmatamento na Amazônia acelerou para a maior cifra em 15 anos na esteira da recessão induzida pela pandemia em 2020”, afirma o WEF.
“Tensões geopolíticas e posturas nacionalistas também complicarão a ação climática. A COP26 revelou tensões elevadas em torno da compensação por [perdas e] danos climáticos, com os países afetados sendo rechaçados por grandes emissores, incluindo os Estados Unidos.”
Mesmo a transição climática, se ocorrer, corre o risco de ser desordenada e agravar desigualdades. “Dadas as complexidades tecnológicas, econômicas e sociais nessa escala, e a natureza insuficiente dos compromissos atuais, é provável que qualquer transição que atinja emissão líquida zero até 2050 seja desordenada”, prevê o WEF. Isso teria “implicações geopolíticas profundas”, com países que defendem uma descarbonização mais rápida entrando em choque com os retardatários.
Numa transição desordenada, alerta o fórum, parafraseando Dilma Rousseff, todos vão perder. Desde famílias, que poderão ter o custo de vida aumentado devido à necessidade acelerada de descarbonização, até trabalhadores das indústrias que estão morrendo, como as fósseis, e mulheres, que em muitos países pobres são responsáveis por prover alimento e energia para os lares.
“Juntas, essas consequências poderiam causar desilusão com a ação climática e levar à radicalização de grupos socioeconômicos marginalizados em todo o espectro político”, diz o documento do WEF.
Tão importante quanto cortar emissões é como fazê-lo.
Fonte: Observatório do Clima
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