Pandemia intensificou desigualdades sociais, mas transformou professores, alunos e escola, acelerando adaptação tecnológica e criando cenário esperançoso para o novo ano
Na área da educação, 2021 termina com resultado nada animador. A dificuldade do País em lidar com problemas estruturais obrigou parte significativa dos alunos a ficar sem estudos durante a pandemia pela falta de acesso à internet, computadores, tablets ou celulares.
Situação que contribuiu para piorar ainda mais os índices educacionais brasileiros. De acordo com o Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), entre os 79 países avaliados em 2021, no que se refere à leitura, a média de jovens que se mostraram capazes de diferenciar fatos de opiniões ficou em 9%. No Brasil, o número foi de apenas 2%.
Para educadores da USP, a pandemia intensificou e escancarou a desigualdade social. Contudo, houve avanços, principalmente quanto ao letramento digital de professores e alunos, o que abre perspectivas de recuperação para 2022. Esse é o resumo do quarto episódio do Balanço de 2021, uma série especial de final de ano produzida pelo Jornal da USP no Ar – Edição Regional que segue até 23 de dezembro abordando ainda a política.
Febre de educação pode impulsionar melhora
O educador Mozart Neves Ramos, titular da Cátedra Sérgio Henrique Ferreira, do Polo Ribeirão Preto do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP, conta que o desempenho ruim do País não se restringe à leitura, mas também à matemática e às ciências, “que são as áreas que o Pisa avalia e o Brasil sempre esteve na rabeira do ranking”.
E, para combater o problema, Ramos defende como primeiro passo a valorização da carreira do magistério. Como exemplo, cita a Coreia do Sul que, para mudar o país, tornou a educação o novo nome do desenvolvimento e criou uma expressão para mobilizar as pessoas em torno da causa da educação: “Febre de educação”, lembra o educador.
Da mesma forma, Ramos acredita na valorização do magistério para mudar o rumo da educação no País. Para dar prioridade à educação, é preciso antes de mais nada “valorizar o magistério”, criar mecanismos para tornar a carreira atrativa para os jovens brasileiros que, hoje, “não desejam ser professores em nosso país. Precisamos mudar isso”, acrescenta.
Já a professora Elaine Assolini, do Departamento de Educação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP, avalia que a pandemia intensificou, principalmente, “a desigualdade social que marca este país” e que, para mudar o rumo da educação, “é fundamental que as políticas públicas cuidem sobretudo da alfabetização e do letramento de crianças, jovens e adultos neste país. Caso contrário, nós vamos continuar com índices baixíssimos quando somos avaliados por diferentes órgãos”.
Letramento digital é a bússola para retomada
A necessidade forçada de adaptação a meios tecnológicos e diferentes recursos digitais ampliou o nível de letramento digital dos alunos e dos professores, avalia Elaine. Segundo a professora, essa interação garantiu um aprendizado importante que deve ser aproveitado agora na retomada das aulas presenciais.
A ideia também é defendida pelo professor Ramos, que destaca “o enorme esforço que as escolas, os professores e os gestores escolares realizaram tanto na escola pública quanto na escola particular para que os alunos mantivessem suas atividades escolares” no período de pandemia. Esforços esses que se traduziram no desenvolvimento de instrumentos “que servirão de bússola para a retomada da educação em 2022”.
Transformado pela pandemia, ensino presencial exige mudanças
Depois de dois anos longe das salas de aula e com ensino mediado por tecnologias, alunos e professores passaram por diversas mudanças em 2020 e 2021, avalia Elaine. “Nenhum de nós é o mesmo depois de ter vivenciado a dolorosa experiência da pandemia. É preciso que as escolas cuidem deste aluno que ficou aí dois anos quase fora da escola, com acolhimento.”
Tanto alunos quanto professores, segundo a professora Elaine, aprenderam muito no sentido da pandemia em si, do distanciamento social e do letramento digital, pois exigiram outros saberes além daqueles que se aprendem em sala de aula. Essa transformação, acredita a professora, deve mudar a educação.
Para falar sobre as perspectivas para 2022, Ramos cita o escritor Ariano Suassuna, definindo-se um “realista esperançoso” em relação à educação. Com o avanço da vacinação, os cuidados em relação ao vírus e o auxílio de ferramentas remotas, Ramos acredita que as aulas presenciais “poderão ajudar muito para vencer os déficits de aprendizagens que os alunos trouxeram ao longo desses dois anos”.
Fonte: Jornal da USP
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