“O problema afeta a todos nós. E aquele velho discurso de muitos brasileiros de que: os europeus e os americanos desmataram tudo que puderam e nós não tivemos a mesma oportunidade; colocar limites ao meio ambiente é limitar o crescimento econômico.”
Farid Mendonça Júnior
__________________________
O mundo se reúne mais uma vez, como todos os anos, para um encontro ambiental, a COP ou Conferência das Partes. Os líderes mundiais, representando suas nações, reúnem-se para discutir as diversas facetas das mudanças climáticas, com tonalidade política, para buscar acordos que possam pelos menos mitigar o problema.
Entretanto, mitigar ou atenuar não resolve o problema. A longo prazo todos nós estaremos mortos. Quando estamos próximos das eleições, costumamos escutar que “se as eleições fossem hoje, candidato A ganharia e B perderia”, pois bem, se o futuro fosse hoje estaríamos mortos, o que significa dizer que pelo nosso histórico de destruição, nosso padrão de uso dos recursos naturais, o atual nível de materialismo induzido pelo capitalismo, o ritmo de emissões de gás carbônico, entre outras coisas, menos as medidas que estamos tomando para evitar isso, não resolveria o problema e nos levaria à extinção.
A chapa vai esquentar, ou melhor, a temperatura da terra. Isso todos nós já sabemos. Resta saber quanto e até quando. Os países, representados pelos seus líderes, possuem quase um consenso em limitar este aumento a 1,5 graus celsius até o final do século, o que efetivamente será muito tarde e trará consequências implacáveis para a humanidade, afetando a agricultura, levando-nos a cenários caóticos de muita fome, e os eventos climáticos tais como furacões, maremotos, entre outros.
Em 2015, eu tive o privilégio de estar na COP 21, a COP de Paris. Naquela oportunidade, estava trabalhando pelo governo do Estado do Amazonas, no cargo de Secretário Executivo Adjunto de Relações Internacionais.
A COP ocorreu na cidade de Paris, França. Diversos eventos paralelos ocorreram todos os dias, espalhados por diversos lugares da cidade. Uma infinidade de temas sendo discutidos. Mas no meio de tudo isso a letargia em se tomar medidas mais rápidas e enérgicas por parte dos líderes mundiais imperava, como se o problema efetivo ainda demoraria muitos anos para se manifestar.
O acordo de criação de um fundo anual de US$ 100 bilhões, financiado pelos países ricos para os países mais pobres, a partir de 2020, para limitar o aquecimento global a 1,5°C, não se materializou. Até hoje ninguém viu a cor do dinheiro.
No meio daqueles salões com aquela arquitetura clássica estilo parisiense, conversas e mais conversas ocorriam, na maior parte das vezes regadas a espumantes.
Lembro que eu pensava: “ahhhh, como é bom discutir o meio ambiente em Paris, com esta ‘temperatura Paris’, comendo queijos e bebendo vinho e espumantes”.
E ao mesmo tempo pensava: “grande parte deste público não tem noção de como é viver no meu Estado, o Amazonas, de ter que conviver todos os dias com uma temperatura escaldante, com um território de dimensões continentais que tornam a logística algo quase que impossível, onde a conta de energia é praticamente um assalto, sem falar da conta de internet principalmente no interior do Estado, e com péssima qualidade. E, além de tudo isso, grande parte da população carente, abaixo da linha da pobreza, vivendo em condições subumanas, e todo um cenário propício a devastação da floresta amazônica, com ausência de fiscalização”.
Logo eu pensei: por quê estamos em Paris? Por quê a discussão do meio ambiente é em Paris? Por quê não fazemos em Manaus, coração da Amazônia? Por quê não trazemos todos estes líderes mundiais para Manaus? Para se reunirem aqui. Verem a Amazônia literalmente, com seus próprios olhos e poderem pensar sob um sol escaldante.
Um estudo publicado em 01 de outubro de 2021 por pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (IEA-USP) chegou à conclusão de que 12 milhões de pessoas irão sofrer com calor extremo até 2100 apenas na bacia amazônica, ou seja, será praticamente impossível viver por aqui, incluindo a cidade de Manaus.
Evidente que isso é somente uma das consequências do aquecimento global em uma determinada região. O problema afeta a todos nós. E aquele velho discurso de muitos brasileiros de que: os europeus e os americanos desmataram tudo que puderam e nós não tivemos a mesma oportunidade; colocar limites ao meio ambiente é limitar o crescimento econômico; nós brasileiros sempre fizemos a nossa parte; entre outros, não faz sentido algum, simplesmente pelo fato de que o planeta é um só, e que todos nós vamos sofrer com isso e vamos morrer. Provavelmente seremos extintos pela nossa irresponsabilidade e incredulidade.
Comentários