País está na contramão do mundo, que registrou queda de 7% nas emissões. Desmatamento na Amazônia é principal responsável pela elevação
As emissões brasileiras de gases de efeito estufa cresceram 9,5% em 2020, principalmente devido ao desmatamento na Amazônia. No período, o país lançou na atmosfera 2,16 bilhões de toneladas de CO2 (dióxido de carbono), colocando o Brasil na contramão da tendência global de queda, provocada pela Covid-19. No ano em que a pandemia parou a economia mundial, as emissões globais despencaram 7%.
Os números, divulgados nesta quinta-feira (28), são do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG), do Observatório do Clima, coalização de instituições que todo ano calcula quanto o Brasil gerou de poluição climática. O número calculado para 2020 é o maior em 15 anos.
A nova taxa de emissões, divulgada a apenas dois dias do início da Conferência do Clima da ONU (COP26), coloca o Brasil numa situação diplomática complicada, pois vai contra o previsto no Acordo de Paris: 2020 era o ano em que as metas de redução estabelecidas no acordo deveriam começar a ser cumpridas. “O Brasil é possivelmente o único grande emissor do planeta a verificar alta”, diz o documento.
Desmatamento e queimadas
Quem puxou a curva do Brasil para cima foi o setor de mudança de uso da terra, responsável por lançar na atmosfera 998 milhões de CO2 em 2020, um aumento de 24% em relação a 2019 (807 milhões). O desmatamento na Amazônia e Cerrado perfazem quase 90% das emissões do setor, mostra o documento.
Apenas na Amazônia, a emissão por alterações no uso do solo alcançou, em 2020, 782 milhões de toneladas de CO2 equivalente. Se a floresta brasileira fosse um país, seria o nono maior emissor do mundo, à frente da Alemanha.
“Dois mil e vinte foi o ano que tivemos as maiores emissões do setor em 11 anos, um reflexo claro do desmonte em curso da política ambiental, que tem favorecido a retomada das altas taxas de desmatamento”, afirma Ane Alencar, diretora de Ciência do Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), organização responsável pelo cálculo das emissões do setor no SEEG.
Segundo dados do Sistema Prodes, do INPE, o desmatamento na Amazônia em 2020 foi de 10.851 km², alta de 7,13% em relação ao ano anterior, quando foram derrubados 10.129 km² de floresta, segundo dados consolidados. Desde 2008 a taxa de desmatamento não chegava a dois dígitos.
Os pesquisadores responsáveis pelo SEEG ainda chamam a atenção para o fato de que as altas taxas de desmatamento não vieram acompanhadas de crescimento do PIB. Isto é, não resultaram em “progresso” para o país. “O descontrole sobre o desmatamento faz com que a curva de emissões do Brasil ainda seja dominada por uma atividade que é majoritariamente ilegal e que não contribui com o PIB nem com na geração de empregos. Com o aumento da emissão e a queda de 4,1% no PIB, o Brasil ficou mais pobre e poluiu mais.”, dizem os pesquisadores.
Além do uso do solo, dos outros quatro setores da economia que respondem pelas emissões do Brasil, mais dois tiveram alta, um teve queda e um permaneceu estável.
Emissões em alta
De acordo com os dados do SEEG, os setores da pecuária e de resíduos também viram suas taxas subirem.
Somente a agropecuária foi responsável por emitir 577 milhões de toneladas de CO2 equivalente (27% do total nacional) em 2020, alta de 2,5%. Segundo o SEEG, essa é a maior elevação desde 2010.
Os pesquisadores também salientaram que as emissões provenientes do uso do solo colocam um peso extra neste setor. Somando as emissões diretas da agropecuária com as emissões por desmatamento, transporte e tratamento de resíduos associados ao setor rural, o agronegócio responde por quase três quartos (73%) das emissões de gases de efeito estufa do Brasil.
Já o setor de resíduos foi responsável por jogar na atmosfera 92 milhões de toneladas de CO2 equivalente, o que corresponde a uma alta de 1,8% em relação a 2019, quando foram lançados 90,4 milhões de toneladas de CO2e. O setor responde por 4% das emissões nacionais.
Estabilidade e queda
Os processos industriais, representados sobretudo pela fabricação de aço e cimento, atividades altamente emissoras, permaneceram estáveis em suas emissões durante a pandemia. O setor oscilou de 99,5 milhões para 99,7 milhões de toneladas de 2019 para 2020, representando 5% das emissões totais do Brasil.
Já o setor de energia, que respondeu por 18% das emissões do país no ano passado, teve queda de 4,6%. Com 394 milhões de toneladas de CO2e em 2020, o setor energético retornou aos patamares de emissão de 2011.
“Esse resultado é um claro reflexo da diminuição de atividades emissoras devido à pandemia de Covid-19, quando foi necessário que as pessoas evitassem se deslocar. Destaca-se a diminuição de emissões nos transportes de passageiros. O consumo de combustível na aviação caiu pela metade. A demanda por gasolina e etanol também diminuiu de maneira relevante”, comenta Felipe Barcellos, pesquisador do Iema (Instituto de Energia e Meio Ambiente), que estima as emissões para os setores de energia e processos industriais.
Emissão bruta X emissão líquida
Os dados apresentados pelo SEEG referem-se às emissões brutas do país, isto é, sem descontar o CO2 removido da atmosfera pelo crescimento de floretas secundárias no lugar de pastagens e pela manutenção de florestas em unidades de conservação e terras indígenas. O governo federal prefere reportar às Nações Unidas as emissões líquidas – quando as remoções de CO2 entram na conta.
O Observatório do Clima, no entanto, defende que reportar as emissões brutas é mais adequado, pois o cálculo de remoções do inventário oficial não representa a realidade brasileira, que vê suas áreas protegidas cada vez mais invadidas e desmatadas.
De qualquer modo, ainda que sejam consideradas as emissões líquidas, o SEEG estima que o total emitido em 2020 foi de 1,52 bilhões de toneladas de CO2 equivalente, um aumento de 14% em relação a 2019.
Desde 2010, quando a Política Nacional de Mudanças do Clima foi regulamentada, o Brasil aumentou suas emissões líquidas em 28%.
Fonte: O Eco
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